A menina queria ficar em dois lugares ao mesmo tempo

Índice

  • 1 Os benefícios do poema infantil
  • 2 Conheça 10 poemas para crianças
    • 2.1 1. Ou isto ou aquilo – Cecília Meireles
    • 2.2 2. A bailarina – Cecília Meireles
    • 2.3 3. Cantiga da babá – Cecília Meireles
    • 2.4 4. A égua e a água – Cecília Meireles
    • 2.5 5. O menino azul – Cecília Meireles
    • 2.6 Poemas extraídos de Ou isto ou aquilo
    • 2.7 6. Quero-quero – Lalau
    • 2.8 7. Gaivota – Lalau
    • 2.9 8. ABC da passarada – Lalau
    • 2.10 Poemas extraídos de Fora da gaiola
    • 2.11 9. Esperança – Roseana Murray
    • 2.12 10. Fonte – Roseana Murray
    • 2.13 11. Gavetas – Roseana Murray
    • 2.14 Poemas extraídos de Manual da delicadeza de A a Z
    • 2.15 12. Lista pessoal – Ana Maria Machado
    • 2.16 13. Lista de brincos – Ana Maria Machado
    • 2.17 14. Lista de chamada – Ana Maria MAchado
    • 2.18 Poemas extraídos de Brinco de listas
    • 2.19 15. Metamorfose – José Paulo Paes
    • 2.20 16. Fique sabendo que – José Paulo Paes
    • 2.21 17. Bons e maus negócios – José Paulo Paes
    • 2.22 18. Dicas de viagem – José Paulo Paes
    • 2.23 Poemas extraídos de Um passarinho me contou
    • 2.24 19 Sinal do tempo – Leo Cunha
    • 2.25 20. Minha Rapunzel
    • 2.26 21. Velha burocracia
    • 2.27 Poemas extraídos de Cantigamente
    • 2.28 22. Os sapos – Manuel Bandeira
    • 2.29 23. Trem de ferro – Manuel Bandeira
    • 2.30 24. Balõezinhos – Manuel Bandeira
    • 2.31 25. Na rua do sabão – Manuel Bandeira
    • 2.32 26. Os sinos – Manuel Bandeira
    • 2.33 27. A menina avoada – Manoel de Barros
    • 2.34 28. Bernardo é quase uma árvore – Manoel de Barros
    • 2.35 29. Mundo pequeno I – Manoel de Barros
    • 2.36 30. Exercícios de ser criança – Manoel de barros
    • 2.37 31. Ofazedor de amanhecer

O poema infantil é um valioso aliado a mães e pais que desejam oferecer visões de mundo amplas aos seus pequenos. Afinal, a poesia contribui não só no desenvolvimento intelectual mas também no desenvolvimento humano. E, por proporcionar grande experimentação com as palavras, crianças costumam adorá-la, ainda mais quando exploradas em atividades de alfabetização!

A menina queria ficar em dois lugares ao mesmo tempo

Os benefícios do poema infantil

Segundo a professora Ana Maria Lisboa de Mello, especialista na obra poética de Cecília Meireles:

“A criança sente prazer em vivenciar a semelhança e os contrastes sonoros entre palavras, independente de sua significação. Por isso, o uso de recursos como trocadilhos, onomatopeias, aliterações, assonâncias, rimas, anáforas, aliterações e outros fatores de ritmo suscitam a fruição textual.”

Mas, se o poema infantil é tradição no processo de alfabetização, hoje ele se torna mais que necessário. Em era de fake news, a poesia desenvolve a linguagem e o pensamento crítico, competências fundamentais para se ter autonomia num mundo de visões recortadas e polarizadas.

À primeira vista algumas pessoas podem achar um poema fácil e pequeno e acreditarem que as crianças mais velhas vão ler ele em poucos minutos. Mas não se engane. Mesmo sendo um poema curto ou menor do que um livro narrativo, eles podem demandar muita fluência leitora, repertório cultural e interpretação de texto. O que pode tornar a leitura dele mais difícil do que a de um livro extenso.

E, para contagiar ainda mais os pequenos que gostam de uma boa leitura infantil, o Clube Quindim trouxe um delicioso “petisco poético”. Confira abaixo algumas poesias infantis que separamos. São poemas sobre a infância, sobre o brincar, poemas sobre família, poemas para refletir e, se você quiser, também podem ser ótimas opções de poemas para educação infantil.

Conheça 10 poemas para crianças

1. Ou isto ou aquilo – Cecília Meireles

Ou se tem chuva e não se tem sol,
ou se tem sol e não se tem chuva!
Ou se calça a luva e não se põe o anel,
ou se põe o anel e não se calça a luva!
Quem sobe nos ares não fica no chão,
quem fica no chão não sobe nos ares.
É uma grande pena que não se possa
estar ao mesmo tempo nos dois lugares!
Ou guardo o dinheiro e não compro o doce,
ou compro o doce e gasto o dinheiro.
Ou isto ou aquilo: ou isto ou aquilo…
e vivo escolhendo o dia inteiro!
Não sei se brinco, não sei se estudo,
se saio correndo ou fico tranquilo.
Mas não consegui entender ainda
qual é melhor: se é isto ou aquilo.

Veja também: 8 livros de poesia infantil que as crianças vão amar

2. A bailarina – Cecília Meireles

A menina queria ficar em dois lugares ao mesmo tempo

Esta menina
tão pequenina
quer ser bailarina.
Não conhece nem dó nem ré
mas sabe ficar na ponta do pé.
Não conhece nem mi nem fá
mas inclina o corpo pra cá e pra lá.
Não conhece nem lá nem si,
mas fecha os olhos e sorri.
Roda, roda, roda com os bracinhos no ar
e não fica tonta nem sai do lugar.
Põe no cabelo uma estrela e um véu
e diz que caiu do céu.
Esta menina
tão pequenina
quer ser bailarina.
Mas depois esquece todas as danças,
e também quer dormir como as outras crianças.

Se você gostou dessas poesias de criança, veja também: 7 livros sobre o meio ambiente para a educação infantil

3. Cantiga da babá – Cecília Meireles

Eu queria pentear o menino
como os anjinhos de caracóis.
Mas ele quer cortar o cabelo,
porque é pescador e precisa de anzóis.
Eu queria calçar o menino
com umas botinhas de cetim.
Mas ele diz que agora é sapinho
e mora nas águas do jardim.
Eu queria dar ao menino
uma casinhas de arame e algodão.
Mas ele diz que não pode ser anjo,
pois todos já sabem que ele é índio e leão.
(Este menino está sempre brincando,
dizendo-me coisas assim.
Mas eu bem sei que ele é um anjo escondido,
um anjo que troça de mim.)

A menina queria ficar em dois lugares ao mesmo tempo

4. A égua e a água – Cecília Meireles

A égua olhava a lagoa
com vontade de beber água.
A lagoa era tão larga
que a égua olhava e passava.
Bastava-lhe uma poça d’água,
Ah! mas só daqui a algumas léguas.
E a égua a sede aguentava.
A égua andava agora às cegas
de olhos vagos nas terras vagas,
buscando água.
Grande mágoa!
Pois o orvalho é uma gota exígua
e as lagoas são muito largas.

5. O menino azul – Cecília Meireles

O menino quer um burrinho
pra passear.
Um burrinho manso, que não corra nem pule,
mas que saiba conversar.

O menino quer um burrinho
que saiba dizer
o nome dos rios
das montanhas, das flores,
– de tudo o que aparecer.

O menino quer um burrinho
que saiba inventar
histórias bonitas
com pessoas e bichos
e com barquinhos no mar.

E os dois sairão pelo mundo
que é como um jardim
apenas mais largo
e talvez mais comprido
e que não tenha fim.

(Quem souber de um burrinho desses,
pode escrever
para a Rua das Casas,
Número das Portas,
ao Menino Azul que não sabe ler.)

A menina queria ficar em dois lugares ao mesmo tempo

Escritora: Cecília Meireles

Ilustrador: Odilon Moraes

Editora: Global

Entregue em janeiro de 2017 pelo Clube Quindim

6. Quero-quero – Lalau

Quero,
Quero voar.
Quero,
Quero cantar.
Sou porteiro
De fazendas.
Sou guardião
Das terras.
Tudo o que
Espero
É ser sempre
Quero-quero

7. Gaivota – Lalau

A menina queria ficar em dois lugares ao mesmo tempo

Gaivota
Vive lá no céu.
Gaivota vai,
Gaivota volta,
Gaivota vai,
Gaivota volta,
E os ovos?
Quando é que
A gaivota
Bota?

Veja também: Seu filho diz que ler é chato? A resposta pode estar nos desafios da leitura autônoma

8. ABC da passarada – Lalau

Andorinha
Bem-te-vi
Coleirinha
Dorminhoco
Ema
Falcão
Graúna
Harpia
Inhambu
Jacutinga
Lindo-azul
Mainá
Noivinha
Oitibó
Pintassilgo
Quiriri
Rolinha
Sabiá
Tico-tico
Uirapuru
Viuvinha
Xexéu
Zabelê

A menina queria ficar em dois lugares ao mesmo tempo

Escritor: Lalau

Ilustradora: Laurabeatriz

Editora: Companhia das letrinhas

Entregue em novembro de 2017 pelo Clube Quindim.

9. Esperança – Roseana Murray

Muitos são os que carregam
água na peneira,
como disse o poeta
Manoel de Barros,
e esperança como estrela
na lapela.
Muitos são os que acreditam
em coisas simples e limpas,
em coisas essenciais,
amor, amizade, delicadeza,
paz,
e tantas outras palavras,
antigas e urgentes.

10. Fonte – Roseana Murray

A menina queria ficar em dois lugares ao mesmo tempo

Como trapezista
alcançar o outro
num salto:
mergulhar em seus olhos,
navegar até o fundo.
Alcançar o outro
no que ele tem
de mais belo,
de luz e mel,
delicadeza e mistério.
E, então, beber a água
limpa
dessa fonte.

11. Gavetas – Roseana Murray

Com delicadeza
abrir as gavetas
que guardam
as palavras de seda.
Deixá-las sempre
ao alcance
de um sopro,
prontas para o voo,
para o ouvido,
para a boca.
Palavras de seda
são como borboletas
douradas
quando pousam
no coração do outro.

A menina queria ficar em dois lugares ao mesmo tempo

Escritora: Roseana Murray

Ilustradora: Elvira Vigna

Editora: FTD

Entregue em outubro de 2017 pelo Clube Quindim.

12. Lista pessoal – Ana Maria Machado

Comprar pão
Preencher ficha de matrícula
Ir a São Paulo
Marcar consulta do dentista
Trocar a pilha do controle remoto
Responder ao e-mail que ficou faltando
Apanhar a roupa na lavanderia
Pagar a conta de luz e gás
Levar o cachorro pra passear
Estudar para a prova
Conseguir o telefone da Dora
Buscar a prancha na oficina

Não necessariamente nessa ordem

Ufa!
Quanta coisa cansativa
Isso é uma roda-viva

Acho que vou adiar
E ficar de pernas pro ar

13. Lista de brincos – Ana Maria Machado

A menina queria ficar em dois lugares ao mesmo tempo

Brinco de listas
Brinco de argola
Brinco de bolinha
Brinco de bola
Brinco de ouro
Brinco de flor
Brinco de tudo que é cor

Brinco de lata
Brinco de prata
Brinco de pirata
Brinco de cigana
Brinco de baiana

Brinco fantasia
Faísca de dia
Brinco a brilhar
Faísca ao luar

Brinco pequenino
Brinco grandalhão
Brinco pendurado
Brinco cai no chão

Brinco de listas
Listas de brinco

Mas não uso brinco
E tenho quatro ou cinco

14. Lista de chamada – Ana Maria MAchado

Cada nome em seu lugar
A começar pelo A
Antônio, Ana e Abel
Mas não encontro a Bebel
que está no l de Isabel
E nem adianta chamar

E não sei por que o Zé
Nunca está na letra Z
Vai no Jota se esconder
Disfarçado de José

Mas o nome que eu mais quero
Nunca está no quadrado e onde
Mora lá no meu segredo
Só eu sei onde se esconde

A menina queria ficar em dois lugares ao mesmo tempo

15. Metamorfose – José Paulo Paes

Me responda você
Que parece um sabichão

Se lagarta vira borboleta
Por que trem não vira avião?

16. Fique sabendo que – José Paulo Paes

O chuchu é um legume que não faz a barba
Bruxelas é a capital das bruxas
A borboleta é uma flor que voa
A andorinha é uma ave turista
O caracol inventou o trailer
O pinguim é o garçom da Antártida
E o sabiá é um passarinho que, do alfabeto, só sabe o “A”

17. Bons e maus negócios – José Paulo Paes

Fabricantes de calçados
Ganhariam dinheiro e ficariam gratos
Às centopeias se elas usassem sapatos

Dentistas e protéticos
Viveriam na maior fartura
Se os jacarés usassem dentadura

Lojas de artigos de inverno
Teriam muito mais lugar ao sol
Se as girafas usassem cachecol

Mas o que seria de nós, eu me pergunto,
Se os elefantes resolvessem
Meter o nariz em nossos assuntos?

18. Dicas de viagem – José Paulo Paes

Se você for para a Índia
Não se esqueça de comprar
Uma passagem de Índia e volta.

Se for para o Canadá
Nem pense em beber garapa:
no Canadá nem cana dá.

Se for para o Equador
Nunca peça café-expresso:
Lá só tem café de coador.

E se for para o Peru
Não espere que lhe respondam
Quando gritar “glu glu glu!”

A menina queria ficar em dois lugares ao mesmo tempo

19 Sinal do tempo – Leo Cunha

Em dia de chuva forte,
as bruxas voam de rodo.

20. Minha Rapunzel

A minha Rapunzel mora na cobertura
e seu cabelo não toca o primeiro andar.
Alguém conhece alguma fada ou feiticeira
que ensine a escalar as tranças do olhar?

21. Velha burocracia

E agora como disse o
esqueleto burocrata:
são ócios do ofício,
isso não é da minha ossada

A menina queria ficar em dois lugares ao mesmo tempo

Escritor: Leo Cunha

Ilustradores: Marilda Castanha e Nelson Cruz

Editora: Nova Fronteira

Saiba mais sobre esse livro de Leo Cunha

22. Os sapos – Manuel Bandeira

Enfunando os papos,
Saem da penumbra,
Aos pulos, os sapos.
A luz os deslumbra.

Em ronco que aterra,
Berra o sapo-boi:
– “Meu pai foi à guerra!”
– “Não foi!” – “Foi!” – “Não foi!”.

O sapo-tanoeiro,
Parnasiano aguado,
Diz: – “Meu cancioneiro
É bem martelado.”

Vede como primo
Em comer os hiatos!
Que arte! E nunca rimo
Os termos cognatos.

O meu verso é bom
Frumento sem joio.
Faço rimas com
Consoantes de apoio.

Vai por cinquenta anos
Que lhes dei a norma:
Reduzi sem danos
A fôrmas a forma.

Clame a saparia
Em críticas céticas:
Não há mais poesia,
Mas há artes poéticas…”

Em ronco que aterra,
Urra o sapo-boi:
– “Meu pai foi rei!” – “Foi!”
– “Não foi!” – “Foi!” – “Não foi!”.


Brada em um assomo
O sapo-tanoeiro:
– A grande arte é como
Lavor de joalheiro.


Ou bem de estatuário.
Tudo quanto é belo,
Tudo quanto é vário,
Canta no martelo”.

Outros, sapos-pipas
(Um mal em si cabe),
Falam pelas tripas,
–”Sei!” – “Não sabe!” – “Sabe!”.


Longe dessa grita,
Lá onde mais densa
A noite infinita
Veste a sombra imensa;

Lá, fugido ao mundo,
Sem glória, sem fé,
No perau profundo
E solitário, é

Que soluças tu,
Transido de frio,
Sapo-cururu
Da beira do rio…

23. Trem de ferro – Manuel Bandeira

Café com pão
Café com pão
Café com pão
Virge Maria que foi isto maquinista?

Agora sim
Café com pão
Agora sim
Voa, fumaça
Corre, cerca
Ai seu foguista
Bota fogo
Na fornalha
Que eu preciso
Muita força
Muita força
Muita força

Oô…
Foge, bicho
Foge, povo
Passa ponte
Passa poste
Passa pasto
Passa boi
Passa boiada
Passa galho
De ingazeira
Debruçada
No riacho
Que vontade
De cantar!

Oô…
Quando me prendero
No canaviá
Cada pé de cana
Era um oficiá

Oô…
Menina bonita
Do vestido verde
Me dá tua boca
Pra matá minha sede

Oô…
Vou mimbora vou mimbora
Não gosto daqui
Nasci no Sertão
Sou de Ouricuri

Oô…


Vou depressa
Vou correndo
Vou na toda
Que só levo
Pouca gente
Pouca gente
Pouca gente…

24. Balõezinhos – Manuel Bandeira

Na feira do arrabaldezinho
Um homem loquaz apregoa balõezinhos de cor:
– “O melhor divertimento para as crianças!”
Em redor dele há um ajuntamento de menininhos pobres,
Fitando com olhos muito redondos os grandes balõezinhos muito redondos.

No entanto a feira burburinha.
Vão chegando as burguesinhas pobres,
E as criadas das burguesinhas ricas,
E mulheres do povo, e as lavadeiras da redondeza.

Nas bancas de peixe,
Nas barraquinhas de cereais,
Junto às cestas de hortaliças
O tostão é regateado com acrimônia.

Os meninos pobres não veem as ervilhas tenras,
Os tomatinhos vermelhos,
Nem as frutas,
Nem nada.

Sente-se bem que para eles ali na feira os balõezinhos de cor são a única                                            [mercadoria útil e verdadeiramente indispensável.
O vendedor infatigável apregoa:
– “O melhor divertimento para as crianças!”
E em torno do homem loquaz os menininhos pobres fazem um círculo inamovível
[de desejo e espanto.

25. Na rua do sabão – Manuel Bandeira

Cai cai balão
Cai cai balão
Na Rua do Sabão!

O que me custou arranjar aquele balãozinho de papel!
Quem fez foi o filho da lavadeira.
Um que trabalha na composição do jornal e tosse muito.
Comprou o papel de seda, cortou-o com amor, compôs os gomos oblongos…
Depois ajustou o morrão de pez ao bocal de arame.

Ei-lo agora que sobe – pequena coisa tocante na escuridão do céu.
Levou tempo para criar fôlego.
Bambeava, tremia todo e mudava de cor.
A molecada da Rua do Sabão
Gritava com maldade:
Cai cai balão!


Subitamente, porém, entesou, enfunou-se e arrancou das mãos que o tenteavam.
E foi subindo…
para longe…
serenamente…
Como se enchesse o soprinho tísico do José.
Cai cai balão!

A molecada salteou-o com atiradeiras
assobios
apupos
pedradas.
Cai cai balão!

Um senhor advertiu que os balões são proibidos pelas posturas municipais
Ele foi subindo…
muito serenamente…
para muito longe…
Não caiu na Rua do Sabão.
Caiu muito longe… Caiu no mar – nas águas puras do mar alto.

26. Os sinos – Manuel Bandeira

Sino de Belém,
Sino da paixão…
Sino de Belém,
Sino da paixão…
Sino do Bonfim!…
Sino do Bonfim!…

Sino de Belém, pelos que ainda vêm!
Sino de Belém, bate bem-bem-bem.
Sino da paixão, pelos que ainda vão!
Sino da paixão, bate bão-bão-bão.

Sino do Bonfim, por que chora assim?…
Sino de Belém, que graça ele tem!
Sino de Belém bate bem-bem-bem.
Sino da paixão – pela minha irmã!
Sino da paixão – pela minha mãe!

Sino do Bonfim, que vai ser de mim?…
Sino de Belém, como soa bem!
Sino de Belém bate bem-bem-bem.
Sino da paixão… Por meu pai?…-Não!
Não!
Sino da paixão bate bão-bão-bão.
Sino do Bonfim, baterás por mim?…


Sino de Belém,
Sino da paixão…
Sino da paixão, pelo meu irmão…
Sino da paixão,
Sino do Bonfim…
Sino do Bonfim, ai de mim, por mim!

Sino de Belém, que graça ele tem!

27. A menina avoada – Manoel de Barros

Foi na fazenda de meu pai antigamente

Eu teria dois anos; meu irmão, nove.

Meu irmão pregava no caixote

duas rodas de lata de goiabada.

A gente ia viajar.

As rodas ficavam cambaias debaixo do caixote:

Uma olhava para a outra.

Na hora de caminhar

as rodas se abriam para o lado de fora.

De forma que o carro se arrastava no chão.

Eu ia pousada dentro do caixote

com as perninhas encolhidas.

Imitava estar viajando.

Meu irmão puxava o caixote

por uma corda de embira.

Mas o carro era diz-que puxado por dois bois.

Eu comandava os bois:

– Puxa, Maravilha!

– Avança, Redomão!

Meu irmão falava

que eu tomasse cuidado

porque Redomão era coiceiro.

As cigarras derretiam a tarde com seus cantos.

Meu irmão desejava alcançar logo a cidade –

Porque ele tinha uma namorada lá.

A namorada do meu irmão dava febre no corpo dele.

Isso ele contava.

No caminho, antes, a gente precisava

de atravessar um rio inventado.

Na travessia o carro afundou

e os bois morreram afogados.

Eu não morri porque o rio era inventado.

Sempre a gente só chegava no fim do quintal

E meu irmão nunca via a namorada dele –

Que diz-que dava febre em seu corpo.

28. Bernardo é quase uma árvore – Manoel de Barros

Bernardo é quase uma árvore

Silêncio dele é tão alto que os passarinhos ouvem

de longe

E vêm pousar em seu ombro.

Seu olho renova as tardes.

Guarda num velho baú seus instrumentos de trabalho;

1 abridor de amanhecer

1 prego que farfalha

1 encolhedor de rios – e

1 esticador de horizontes.

(Bernardo consegue esticar o horizonte usando três

Fios de teias de aranha. A coisa fica bem esticada.)

Bernardo desregula a natureza:

Seu olho aumenta o poente.

(Pode um homem enriquecer a natureza com a sua

Incompletude?)

29. Mundo pequeno I – Manoel de Barros

O mundo meu é pequeno, Senhor.

Tem um rio e um pouco de árvores.

Nossa casa foi feita de costas para o rio.

Formigas recortam roseiras da avó.

Nos fundos do quintal há um menino e suas latas maravilhosas.

Todas as coisas deste lugar já estão comprometidas com aves.

Aqui, se o horizonte enrubesce um pouco,

os besouros pensam que estão no incêndio.

Quando o rio está começando um peixe,

Ele me coisa.

Ele me rã.

Ele me árvore.

De tarde um velho tocará sua flauta para inverter

os ocasos.

30. Exercícios de ser criança – Manoel de barros

No aeroporto o menino perguntou:

-E se o avião tropicar num passarinho?

O pai ficou torto e não respondeu.

O menino perguntou de novo:

-E se o avião tropicar num passarinho triste?

A mãe teve ternuras e pensou:

Será que os absurdos não são as maiores virtudes da poesia?

Será que os despropósitos não são mais carregados de poesia do que o bom senso?

Ao sair do sufoco o pai refletiu:

Com certeza, a liberdade e a poesia a gente aprende com as crianças.

E ficou sendo.

31. Ofazedor de amanhecer

Sou leso em tratagens com máquina.

Tenho desapetite para inventar coisas prestáveis.

Em toda a minha vida só engenhei

3 máquinas

Como sejam:

Uma pequena manivela para pegar no sono.

Um fazedor de amanhecer

para usamentos de poetas

E um platinado de mandioca para o

fordeco de meu irmão.

Cheguei de ganhar um prêmio das indústrias

automobilísticas pelo Platinado de Mandioca.

Fui aclamado de idiota pela maioria

das autoridades na entrega do prêmio.

Pelo que fiquei um tanto soberbo.

E a glória entronizou-se para sempre

em minha existência.

Se você quiser proporcionar a descoberta da poesia infantil para o seu pequeno, um clube de assinatura como o Quindim pode te ajudar nesse processo. Cada poema infantil lido acima saiu de uma obra já enviada anteriormente para os nossos pequenos assinantes de todo o Brasil. Nossa equipe de curadoria conta ainda com nomes como Ziraldo, Ana Maria Machado e vários outros especialistas na área.

E se o seu pequeno adora um poema infantil, não deixe de comentar aqui embaixo qual o preferido dele!

*A imagem que ilustra este post é de autoria de Jessie Willcox Smith, reconhecida ilustradora estadunidense cujo trabalho em livros infantis compõe o grupo conhecido como o da Era de Ouro da Ilustração.

A menina queria ficar em dois lugares ao mesmo tempo

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