É legítima a penhora de bem de família de fiador em contrato de locação comercial?

A Ministra Carmem Lúcia, relatora do RExt 1.296.835/SP, decidiu que o bem de família do fiador não pode ser penhorado em contratos que versarem sobre locação comercial.

O Tribunal de Justiça de São Paulo havia autorizado a penhora do único imóvel dos Recorrentes. Em sua fundamentação, o TJSP entendeu pela “constitucionalidade da penhora sobre o bem de família do fiador, mesmo após a EC 26/2000. Isso porque o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 407.688, afirmou ser legítima a penhora de bem de família pertencente a fiador de contrato de locação”.

Segundo a Ministra Carmen Lúcia, o caso concreto não envolvia simples contrato de locação, mas contrato de locação comercial. Desse modo, a Ministra Carmem Lúcia trouxe aos autos o Agravo Regimental no Recurso Extraordinário nº 605.709, que também indeferiu o pedido de alienação de bem de família garantidor de contrato de locação comercial. O Agravo Regimental se pautou principalmente no princípio da Isonomia, haja vista que o bem de família do Locador estaria protegido de eventual penhora para garantir algum crédito do Locatário, desse modo, não seria isonômico que o bem de família do fiador não gozasse da mesma proteção.

No Tema 295 do STF, ao tratar de contrato de locação residencial, entendeu-se que a impenhorabilidade do bem de família do fiador romperia o equilíbrio do mercado. Nesse sentido, seriam exigidas garantias mais custosas nos contratos de locação residencial, dificultando a sua concretização e acarretando em lesão maior ao direito constitucional à moradia.

Sendo assim, segundo a jurisprudência do STF, não é possível a penhora do bem de família de fiador em contratos de locação comercial, distinguindo-os das demais locações – nas quais o bem de família do fiador pode ser penhorado.

Conforme comentado em boletim publicado no dia 09/03/2021 (acesse aqui), o plenário do Supremo Tribunal Federal (STF), ao apreciar o Recurso Extraordinário nº 1.307.334/SP, de relatoria do Ministro Alexandre de Moraes, reconheceu a existência de repercussão geral na questão relativa à penhorabilidade de bem de família do fiador em contratos de locação comercial (Tema 1.127/Repercussão Geral).

No último dia 08 de março, a maioria do STF, por 7 votos a 4, pôs fim à controvérsia e decidiu que é constitucional a previsão contida no artigo 3º, inciso VII, da Lei 8.009/90[1], que autoriza a penhora do bem de família do fiador em caso de inadimplência do locatário, razão pela qual foi negado provimento ao referido recurso extraordinário e fixada a seguinte tese ao Tema 1.127:

“É constitucional a penhora de bem de família pertencente a fiador de contrato de locação, seja residencial, seja comercial”.

No julgamento, prevaleceu o entendimento do relator, Ministro Alexandre de Moraes, no sentido de que a impenhorabilidade do bem de família do fiador de locação comercial seria um óbice à livre iniciativa e ao empreendedorismo, pois, segundo o ministro, garantias mais dispendiosas passariam a ser exigidas pelos locadores:

“Reconhecer a impenhorabilidade do bem de família do fiador de locação comercial teria o condão de causar grave impacto na liberdade de empreender do locatário. Isso porque, dentre as modalidades de garantia que o locador poderá exigir do locatário (caução; fiança; seguro de fiança locatícia; e cessão fiduciária de quotas de fundo de investimento, conforme o já citado artigo 37 da Lei 8.245/1991), a fiança é a mais usual, menos onerosa e mais aceita pelos locadores”.

Além disso, para o ministro, a penhora do único imóvel do fiador não afronta o direito à moradia previsto no artigo 6º da Constituição Federal[2], uma vez que o próprio detentor desse direito (o fiador), por livre e espontânea vontade, assumiu obrigação capaz de limitar seu direito à moradia para garantir dívida de terceiro.

Vale consignar que a Suprema Corte consolidou entendimento (Tema nº 295)[3] no sentido de ser constitucional a penhora do bem de família pertencente a fiador de contratos de locação, mesmo após a inserção do direito à moradia no rol de direitos sociais pela EC nº 26/2000.

Com isso, ratificou-se o entendimento firmado pelo STF no julgamento do Recurso Extraordinário nº 407.688[4], realizado em 08.02.2006, no qual a Corte reconheceu como legítima a penhora do único imóvel do fiador de contrato de locação residencial, sob o fundamento de que o direito à moradia deve ser garantido a todos, inclusive àqueles que não têm condições de adquirir um imóvel próprio e necessitam da prestação de garantia para concretização desse direito social.

Em seu voto, Moraes afirma ainda que o artigo 3º, inciso VII, da Lei 8.009/90, não faz nenhuma distinção entre locação residencial e comercial para fins de possibilidade de penhora do bem de família do fiador. Desse modo, a criação de uma distinção entre os fiadores dessas duas modalidades de locação, na qual se permitiria a penhora do imóvel do fiador de locação residencial, enquanto o bem do fiador de locação comercial seria mantido ileso, violaria o princípio da isonomia, que tem como fundamento assegurar tratamento igualitário a todos os cidadãos perante a lei (artigo 5º da Constituição Federal[5]).

Já os ministros Edson Fachin, Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowski e Rosa Weber, vencidos, divergiram de Alexandre de Moraes. Fachin, que levantou a divergência, sustenta que o bem de família do fiador de locação comercial é impenhorável e que nas locações comerciais, diferente das locações residenciais, não é possível contrapor o direito à moradia de fiadores ao direito à moradia dos locatários. Para o ministro, nas locações comerciais o direito à moradia prevalece “frente aos princípios da autonomia contratual e da livre iniciativa, que podem ser resguardados por outros mecanismos razoáveis e menos gravosos”.

Na mesma linha, para a Ministra Cármen Lucia, a proteção ao direito à moradia deve ser preservada em detrimento da satisfação do crédito do locador de imóvel comercial e do estímulo a livre iniciativa:

“Inadmissível seria o sacrifício de um direito de tamanha magnitude constitucional (direito à moradia) para se privilegiar outro de menor relevância (direito ao crédito), pois o princípio da livre iniciativa deve harmonizar-se com os princípios da dignidade humana, da solidariedade e da justiça social.”

O julgamento do recurso e a fixação da tese de que é possível a penhora do bem de família do fiador em contratos de locação, seja residencial ou comercial, é bastante significativo para as empresas que atuam no mercado imobiliário, haja vista que a fiança é a modalidade da garantia mais comum e menos custosa, sobretudo nos contratos de locação comercial, nos quais os próprios sócios das empresas costumam figurar como garantidores.

Vislumbra-se, finalmente, uma uniformização do entendimento jurisprudencial do STF sobre o tema, que deverá servir de base para as instâncias inferiores do judiciário em casos semelhantes.

O acórdão ainda não foi publicado, mas os votos acima mencionados podem ser acessados na íntegra clicando nos links abaixo.

Clique aqui para consultar o voto do Ministro Alexandre de Moraes

Clique aqui para consultar o voto do Ministro Edson Fachin

Clique aqui para consultar o voto da Ministra Cármen Lucia

[1] Art. 3º A impenhorabilidade é oponível em qualquer processo de execução civil, fiscal, previdenciária, trabalhista ou de outra natureza, salvo se movido: VII – por obrigação decorrente de fiança concedida em contrato de locação.

[2] Constituição Federal. “Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.”

[3] STF. Recurso Extraordinário nº 612.360-RG/SP. Relatora Ministra Ellen Gracie. Data do julgamento: 14/08/2010. Data da publicação: 03/09/2010. Tese fixada no Tema 295 do STF: “É constitucional a penhora de bem de família pertencente a fiador de contrato de locação, em virtude da compatibilidade da exceção prevista no art. 3°, VII, da Lei 8.009/1990 com o direito à moradia consagrado no art. 6° da Constituição Federal, com redação da EC 26/2000.”.

[4] STF. Recurso Extraordinário 407.688/SP. Relator Ministro Cezar Peluso. Data do julgamento: 08/02/2006. Data da publicação: 06/10/2006.

[5] Constituição Federal. “Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: […]”

É penhorável o bem de família do fiador no caso de contratos de locação comercial?

Após vários julgamentos, em maio de 2022, o STF decidiu pela constitucionalidade da penhora do bem de família do fiador de contrato de locação – seja residencial, seja comercial (Tema 1.127).

É legítima a penhora de Apontado bem de família pertencente a fiador de contrato de locação ante o que dispõe o art 3º inciso VII da Lei n 8.009 1990?

“É constitucional a penhora de bem de família pertencente a fiador de contrato de locação, em virtude da compatibilidade da exceção prevista no art. 3°, VII, da lei 8.009/90 com o direito à moradia consagrado no art. 6° da CF, com redação da EC 26/20“.

Como o STF está decidindo a respeito do bem de família do fiador nas locações comerciais pela impenhorabilidade ou Penhorabilidade?

STF PERMITE PENHORA DE BEM DE FAMÍLIA DO FIADOR EM CONTRATO DE ALUGUEL. Em 9/3/2021, o plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) finalizou o julgamento sobre a penhorabilidade de bem de família de fiador em contrato de locação, tanto comercial, quanto residencial.

Pode penhorar bens do fiador?

O Supremo Tribunal Federal decidiu nesta quarta-feira (9), que locadores de imóveis comerciais podem penhorar bens de família do fiador para garantir o recebimento de valores, nos casos em que o locatário não cumprir suas obrigações contratuais.