Quais as características das diferentes participações de mulheres no processo da independência brasileira?

No século XVIII, apesar de não possuírem direito a voto, mulheres chefiavam fazendas, propriedades, negócios e eram responsáveis pela circulação de mercadorias, alimentos e por boa parte da base da economia do Brasil da época. É o que explica Cecília Helena de Salles Oliveira, docente da USP e do Museu do Ipiranga, em São Paulo.

“Foram descobertos, tanto no Rio de Janeiro quanto na Bahia, inúmeros manifestos, escritos e assinados por mulheres, que defendiam a separação de Portugal, que defendiam a cidadania, a liberdade e que se insurgiram contra as medidas das cortes, medidas tomadas por Dom Pedro I, ou atitudes adotadas pelas lideranças locais”, diz a docente.

Entre as personalidades históricas do período, a mais lembrada é Maria Leopoldina, primeira esposa de D. Pedro I e Imperatriz do Brasil até a sua morte, em 1826. “Ela tem uma posição especial não apenas por ser imperatriz, mas por ser uma mulher inteligente, muito bem formada e que assumiu atitudes importantes ao longo do processo de independência”, diz a professora Cecília Helena.

“Ela era uma esposa ativa – quando Dom Pedro I se ausentava do Rio de Janeiro, era ela quem assumia a regência”, conta a historiadora e antropóloga Lilia Schwarcz. “Ela foi sempre uma voz ativa no sentido de pressionar Dom Pedro I para que patrocinasse um rompimento com a metrópole portuguesa.”

“Ela era uma naturalista, uma sábia, falava várias línguas, antes de vir ao Brasil estudou o que era o Brasil, veio com uma missão científica”, narra a historiadora.

Lilia Schwarcz também aponta a participação de mulheres como Maria Quitéria, que se disfarçou de homem para que pudesse se juntar às tropas nas guerras de independência; Maria Felipa, escravizada que tentou reter tropas portuguesas na Bahia; e Joana Angélica, religiosa que não permitiu que portugueses entrassem no convento em que vivia.

“Esses são apenas exemplos de mulheres que fizeram a independência. E são exemplos do nosso silenciamento. São exemplos de como as gerações futuras e as gerações presentes precisam estudar muito mais o lugar das mulheres nos processos políticos brasileiros”, ressalta a historiadora.

A importância de mulheres comuns no processo de independência também é relembrada por Álvaro Pereira do Nascimento, historiador e professor da UFRRJ/CNPq. “Foram muitas Conceições, muitas Joanas, muitas Marias, que cotidianamente trabalhavam muito para transformar essa história”, comenta.

O professor ainda relembra que é necessário ponderar que muitas mulheres negras e indígenas, muito presentes e ativas no cotidiano e nas reivindicações populares, foram apagadas do processo histórico.

“seja por causa da masculinidade hegemônica ou do preconceito em relação a pessoas negras, escravizadas e indígenas”, completa.

O projeto 3×22 da Biblioteca Guita e José Mindlin – BBM, da Universidade de São Paulo (USP) tem por objetivo refletir e redimensionar a história da formação da nação brasileira a partir de três datas e eventos principais: 1822, 1922 e 2022. O intuito é produzir conteúdo e iniciativas que estimulem a análise crítica em torno dos contextos das celebrações do bicentenário da Independência do Brasil, do centenário da Semana de Arte Moderna e da história do nosso tempo presente. 

Os kits didáticos que fazem parte deste projeto são compostos por diversos tipos de documentos históricos, como cartas, pinturas, jornais, imagens, mapas, entre outros, com orientações ao professor/a, e sugestões de questões para serem trabalhadas com os/as estudantes.

O kit didático intitulado “As mulheres e a Independência do Brasil” produzido em conjunto com o Laboratório de Ensino e Material Didático – LEMAD, do Departamento de História da USP, apresenta sete documentos com roteiros de estudos de forma que os estudantes possam conhecer e problematizar a participação de diferentes mulheres na conjuntura da Independência do Brasil. 

O objetivo é mostrar que essas mulheres não seguiram o espaço que a sociedade patriarcal lhe impôs, do âmbito doméstico, já que elas atuaram e refletiram sobre a vida pública. A documentação busca se ligar a percepções, vivências e ambições sobre diferentes classes sociais, ainda que os escritos sejam de classes altas, devido ao acesso à educação que poucas mulheres tinham. Neste tocante, o primeiro documento é o manifesto de D. Pedro I a seu pai, o rei de Portugal D. João VI, no que ficou conhecido como “dia do fico”. A escolha do primeiro documento ser do imperador é feita para que os estudantes tenham contato com o processo da declaração da Independência oficial, para depois contrapor com outros olhares femininos, como é o caso de dois trechos do diário de viagem de Maria Graham, mulher de classe social alta inglesa que passava pelo Brasil. No primeiro documento Graham apresenta sua percepção ao sobredito contexto do documento oficial, e no outro ela trata de Maria Quitéria, que lutou disfarçada de homem no exército brasileiro contra os portugueses. O Kit também traz duas cartas de D. Maria Leopoldina, articuladora da independência, além de uma carta assinada por 186 mulheres da elite baiana para à princesa e um artigo de Isabel Barion sobre a educação das mulheres no século XIX. É preciso romper tanto com o apagamento historiográfico, quanto no cotidiano escolar da história das mulheres, conhecendo e difundindo as diferentes formas de atuação feminina em um espaço social que as repudiavam, e assim mesmo, elas se fizeram presentes.

Conheça o material

Kit Didático. “As Mulheres e a Independência do Brasil”. Acesse aqui

Para saber mais 

Projeto 3×22. Acesse aqui.

Quais as características das diferentes participações de mulheres no processo da independência brasileira?

#pracegover: A imagem de capa em destaque traz um recorte com outras pinturas, em óleo sobre tela, do lado esquerdo na parte superior, temos a pintura da Princesa Leopoldina, trajada em um vestido nobre da época de cor salmão, com os cabelos presos, em suas mãos se encontra a carta da independência. Ainda no lado esquerdo na parte debaixo da capa se encontra a imagem de um papel com uma caligrafia. No centro da imagem de capa temos um retângulo azul marinho com duas faixas brancas, entre as duas faixas temos o título na cor branca. Abaixo do retângulo temos o retrato de Maria Quitéria, representada em trajes militares. Abaixo desta imagem, tem uma outra que cobre toda a base da capa, com a representação de militares, em cima de seus cavalos, em suas mãos, que estão erguidas para cima se destacam as espadas. Do lado direito da capa temos a imagem de uma mulher branca, de olhos e cabelos escuros, usando chapéu e vestido na cor branco perolado.

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