Quais as normas quais os assuntos que compõem o conteúdo do direito coletivo do trabalho?

12/11/2014. Enviado por

Esta pesquisa busca analisar o surgimento do Direito Coletivo do Trabalho no âmbito internacional e nacional, este a luz da Constituição Federal e da legislação infraconstitucional, finalizaremos a pesquisa com seus princípios informadores.

Sumário: I-Introdução; II-Nomenclatura; III-Conceito; IV-Natureza Jurídica; V-Evolução histórica no âmbito internacional; VI-Evolução histórica no âmbito nacional; VII-Função do Direito Coletivo do Trabalho; VIII-Direito Coletivo do Trabalho na Constituição Federal e nas normas infraconstitucionais; IX-Princípios do Direito Coletivo do Trabalho; X- Conclusão.

Resumo: Esta pesquisa busca analisar o surgimento do Direito Coletivo do Trabalho no âmbito internacional e nacional, este a luz da Constituição Federal e da legislação infraconstitucional, finalizaremos a pesquisa com seus princípios informadores.

Palavras-chaves: Direito do Trabalho. Direito Coletivo do Trabalho. Relações Laborais Coletivas. Princípios do Direito Coletivo do Trabalho.

 I.    Introdução

            O Direito do Trabalho é um ramo jurídico especializado que tem como objetivo regular as relações jurídicas entre empregados e empregadores, tanto nos contratos individuas de trabalho quanto nos vínculos grupais formados entre trabalhadores e suas organizações representativas (Sindicatos).

            Então, dentro deste ramo do direito teremos dois segmentos, o individual e o coletivo, estruturados a partir de relações sócio-jurídicas distintas: a relação de emprego (Empregador X Empregado) e as relações laborais coletivas (Empregador – sozinho ou pelo seu órgão representativo X Empregado – através de seu órgão representativo).

            O hoje conhecido Direito Coletivo do Trabalho recebe esta nomenclatura no decorrer do século XIX a partir do momento em que os trabalhadores percebem que um dos sujeitos da relação de emprego, diga-se empregador, sempre foi um ser coletivo[2], cuja vontade podia deflagrar ações e repercussões de impacto social, tanto na comunidade quanto na sociedade como um todo, pois a vontade do empregador ao se concretizar em ação irá atingir uma ampla gama de pessoas, o mesmo não acontece quando o trabalhador se manifesta individualmente, pelo contrário, essa manifestação meramente individual só produzirá efeitos na relação bilateral existente (empregador X empregado).

            Em que pese a existência destas subdivisões, o Direito Coletivo do Trabalho poderá atuar fortemente sobre o Direito Individual podendo produzir alterações significativas neste.

            É a partir desta afirmação que iremos estudar o Direito Coletivo do Trabalho, apresentando sua nomenclatura, seu conceito, sua posição e natureza jurídica, sua evolução histórica no âmbito nacional e internacional, sua disposição na Constituição Federal e nas Normas Infraconstitucionais e, por fim, conheceremos os princípios que regem este tema tão importante no ramo Direito do Trabalho.

  1. II.    Nomenclatura

            A denominação Direito Coletivo do Trabalho, ramificação do Direito do Trabalho[3], antes de chegar a denominação hoje conhecida recebeu uma série de outras nomenclaturas antes de se consolidar com o nome que ora estudamos, diga-se: Direito Industrial, Direito Operário, Direito Corporativo, Direito Sindical e Direito Social.

            Para Maurício Godinho Delgado: “Trata-se de denominação de caráter objetivista, realçando o conteúdo do segmento jurídico identificando: relações sociojurídicas grupais, coletivas, de labor.”[4]

            No mesmo sentido, Fábio Goulart Villela, para ele a denominação Direito Coletivo, predominante no ordenamento jurídico pátrio, é uma nomenclatura “de caráter objetivo, tendo por foco o conteúdo deste ramo jurídico especializado, qual seja, as relações coletivas de trabalho.”[5]

  1. III.    Conceito

                        Conceituar algo não é tarefa simples pois requer amplo conhecimento da área geral e específica do tema que se está a tratar, assim, não poderia ser diferente no que tange a conceituar o direito coletivo do trabalho, cujo entendimento requer também um conhecimento profundo dos direitos trabalhistas individuas.

            No direito do trabalho verificamos dois tipos fundamentais de relações jurídicas ou relações sociais disciplinadas pelo direito, cuja diferença entre elas é verificada a partir dos sujeitos, dos interesses e da causa final de ambas:

1)  Relações individuais de trabalho: Uma das principais finalidades do Direito Individual do Trabalho é atribuir um conteúdo mínimo ao respectivo contrato, irrenunciável pelo trabalhador no momento da admissão ou na sua vigência, pois que qualquer renúncia será considerada nula em face da condição hipossuficiente do empregado em relação ao seu empregador.[6]

2)  Relações coletivas de trabalho: os sujeitos são os grupos de trabalhadores e de empregadores, normalmente representados pelos sindicatos trabalhistas e patronais, apresentando-se como relações intersindicais. Podem caracterizar-se como coletivas relações entre os próprios trabalhadores e uma ou mais empresas com as quais se relacionam diretamente, sem a via sindical-patronal, quando têm por finalidade a tutela de interesses de um grupo de trabalhadores de uma empresa.[7]

            Assim, trouxemos os conceitos adotados por alguns doutrinadores:

            Amauri Mascaro Nascimento:

“Direito Coletivo do Trabalho é o conjunto de regras, princípio e institutos regulatórios das relações entre seres coletivos trabalhistas: de um lado, os obreiros, representados pelas entidades, sindicais, e, de outro, os seres coletivos empresarias, atuando quer isoladamente, quer através de seus sindicatos.”[8]

            Maurício Godinho Delgado:

“O complexo de institutos, princípios e regras jurídicas que regulam as relações laborais de empregados e empregadores e outros grupos jurídicos normativamente especificados, considerada sua atuação coletiva, realizada autonomamente ou através das respectivas entidades sindicais.”[9]

            Henrique Macedo Heinz:

“É o ramo do Direito do Trabalho que, por meio de regras e princípios, regula os aspectos estático e dinâmico das relações coletivas de trabalho. No primeiro deles (estático), estuda-se o sujeito das relações coletivas de trabalho, as entidades sindicais, desde sua formação passando pela sua administração e mesmo extinção.”[10]

            Com base nos conceitos e definições acima, estes amparados em princípios constitucionais e infraconstitucionais, e já adentrando propriamente na questão sindical, concluirá Henrique Macedo Hinz que a finalidade do Direito Coletivo do Trabalho é estabelecer o marco regulatório à negociação coletiva, quer em relação aos sujeitos que podem dela participar, quer em relação aos resultados que podem dela resultar, bem como os instrumentos de pressão a serem eventualmente utilizados pelos sujeitos envolvidos, tudo com vistas à atribuição de conteúdo ao contrato individual de trabalho superior ao patamar mínimo em lei estabelecido, e não vedado por esta.

  1. IV.    Natureza Jurídica

            Segundo Amauri Mascaro Nascimento: “O fundamento jurídico das relações coletivas é de natureza constitucional”.[11]

            O nobre doutrinador faz esta afirmação baseado no fato de a liberdade de associação ter sido acolhida pelo constituinte brasileiro, não só na atual Constituição Federal, como também nas Constituições de 1891 e seguintes, assim, “É garantida a liberdade de associação para fins lícitos e nenhuma associação poderá ser dissolvida senão em virtude de decisão judicial”.

            Ressalte-se que no plano constitucional também está declarada a liberdade sindical, cujo exercício dependerá do reconhecimento da autonomia coletiva dos particulares. Esta é a sua fonte e fundamento jurídico trabalhista.

            Assim, a liberdade sindical só se valoriza numa ordem jurídica pluralista que garanta a livre atuação dos grupos intermediários para que se organizem, constituam a sua estrutura, os seus estatutos, relacionem-se com os outros grupos sociais, tendo em vista a disciplina dos seus interesses.[12]

  1. V.    Evolução histórica no âmbito internacional

            Na Idade Média existiam as chamadas corporações de ofício - associações de pessoas do mesmo ofício – estas corporações estavam divididas hierarquicamente em mestres, companheiros e aprendizes, sendo que eram os mestres quem detinham o monopólio da fabricação e da venda e determinavam a regulamentação dos produtos.

            Em certos momentos deste período viam-se alguns movimentos esporádicos, pequenos protestos ou certa revolta dos companheiros e aprendizes descontentes com o que era imposto pelos mestres, nada que pudesse evoluir para um movimento de massa de protesto entre capital e trabalho.[13]

            O início do sindicalismo deu-se na Inglaterra em 1720, quando se formaram as primeiras associações de trabalhadores para reivindicar melhores salários, melhores condições de trabalho e limitação da jornada de trabalho.[14]

            Na Revolução Industrial (Séc. XIX) vimos surgir o agrupamento de homens em massa em torno das máquinas, despertando a consciência dos operários a despeito de seus interesses, surgindo assim o movimento operário, hoje conhecido como sindicalismo.

            A partir de 1824 viveu-se a fase de tolerância com os sindicatos, sendo que a partir de 21/06/1824, por ato do parlamento inglês, as coligações deixaram de ser proibidas em relação aos trabalhadores, entretanto permanecia proibida a greve e o trade unions[15], somente em 1875 aprovou-se uma lei que permitiu a livre criação de sindicatos, entretanto, esta lei só foi consolidada em 1906.[16]

            Em 17/07/1791, vimos surgir na França a Lei Le Chapellier, que proibia os cidadãos de uma mesma profissão tomar decisões ou deliberarem a respeito de seus interesses, no mesmo sentido foi o Código de Napoleão, de 1.810, punindo a associação de trabalhadores.[17]

            Em 1830, Inglaterra, são criadas as associações de trabalhadores para mútua ajuda e defesa.

            Em 1884, França, a lei Waldeck-Rousseau, permitiu às pessoas da mesma profissão ou de profissões conexas constituir associações para defesa de seus interesses, sem a autorização do governo.

            Em 1919, Alemanha, a Constituição de Weimar, primeira a tratar de matéria trabalhista e direito coletivo do trabalho, permite o direito de associação.

            Em 1927, Itália, a Carta Del Lavoro estabelece a livre organização profissional ou sindical.[18]

            Em 1948, a Declaração Universal dos Direitos do Homem em seu artigo XX, 1, estabelece que “Todo ser humano tem direito à liberdade de reunião e associação pacífica. Este mesmo diploma em seu artigo XXIII, 4, determina que “todo ser humano tem direito a organizar sindicatos e neles ingressar para proteção de seus interesses”.[19]

            Em 1958, a Organização Internacional do Trabalho – OIT, editou a Convenção 87[20], estabelecendo em seu artigo 2º as bases fundamentais do direito de livre sindicalização, sem qualquer ingerência do Estado

Art. 2 — Os trabalhadores e os empregadores, sem distinção de qualquer espécie, terão direito de constituir, sem autorização prévia, organizações de sua escolha, bem como o direito de se filiar a essas organizações, sob a única condição de se conformar com os estatutos das mesmas

            Destaque-se que até a presente data esta convenção não foi ratificada pelo Brasil, isto porque nossa Constituição estabelece a existência do sindicato único e contribuição sindical determinada em lei, determinações incompatíveis com esta regra internacional.

            Por fim, em 1966, o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos Sociais e Culturais, estabelece:

Artigo 8º

1. Os Estados Partes do presente Pacto comprometem-se a garantir:

(...)

c) O direito dos sindicatos de exercer livremente suas atividades, sem quaisquer limitações além daquelas previstas em lei e que sejam necessárias, em uma sociedade democrática, no interesse da segurança nacional ou da ordem pública, ou para proteger os direitos e as liberdades das demais pessoas.

            Assim, os direitos de livre associação e sindicalização tornam-se sedimentados na cultura jurídica ocidental, firmando-se o sindicato como um órgão de luta de classes.

  1. VI.    Evolução histórica no âmbito nacional

            Até o início do século XIX ainda não existia no Brasil nenhum sindicato ou organização de trabalhadores, ainda assim o Brasil não se manteve isolado dos acontecimentos mundiais em torno da evolução do Direito Coletivo do Trabalho, o Estado trouxe para sai a responsabilidade de atuação nesta seara do direito e em 1824 a Constituição Federal (Império) determinava em seu artigo 179, § 25, que “ficam abolidas as corporações de ofícios, seus juízes, escrivães e mestres”.

            Em 1891 (República), a Constituição não dispôs expressamente sobre as entidades sindicais, em seu artigo 72, § 8º, trouxe apenas que “a todos é lícito associarem-se e reunirem-se livremente e sem armas; não podendo intervir a polícia, senão para manter a ordem pública”.

            Somente no fim do século XIX e início do século XX, sob a influência de trabalhadores estrangeiros que prestavam serviços no Brasil, é que começam a surgir os primeiros sindicatos, estes ligados a agricultura e a pecuária, reconhecidos somente em 1903 pelo Decreto n.º 979 de 06/01/1903.

            Em 1906 o movimento sindical brasileiro alcança dimensão nacional com a realização do 1º Congresso Operário Brasileiro, dando origem a Confederação Sindical Brasileira.

            Em 1907 surge no Brasil o primeiro sindicato urbano – Decreto n.º 1.637/1907, facultava a qualquer trabalhador, inclusive profissionais liberais, associar-se aos sindicatos, com o objetivo de estudo e defesa dos interesses da profissão e de seus membros – influência da lei francesa de 1884. Foram expedidas as primeiras “Cartas Sindicais”.

            Em 1916, o artigo 20 do Código Civil determinava que “não se poderão constituir sem prévia autorização, os sindicatos profissionais e agrícolas legalmente autorizados”.

           Em 1931, surge o Decreto n.º 19.770, de 19/03/1931, baixado durante a Revolução de 1930, distinguindo o sindicato de empregados e empregadores, exigindo reconhecimento de ambos pelo Ministério do Trabalho (criado em 1930), institui-se então o sindicato único para cada profissão em uma mesma região, este proibido de exercer qualquer atividade política.

            Em 1934, quatro dias antes da vigência da Constituição de 1934, entra em vigor o Decreto n.º 24.694 de 12/07/34, prevendo a forma de regular a pluralidade sindical, contrariamente aos entendimentos da nova Carta Magna, entretanto prevalecia o entendimento da Lei Ordinária. Também reconheceu as convenções coletivas e equiparou trabalhadores com profissionais liberais.

            Com a pluralidade sindical haverá uma proliferação dos sindicatos com finalidades puramente políticas e isto gerou o enfraquecimento das instituições.

            Até este momento, fazendo um comparativo com o sindicalismo internacional e o nacional, iremos perceber que no âmbito internacional os sindicatos derivam da reivindicação dos trabalhadores, enquanto que no Brasil decorreram de imposição do Estado.

            A Constituição de 1937 teve a parte laboral inspirada na Carta Del Lavoro da Itália, conferia liberdade sindical, mas com autorização do Estado (paradoxo). As funções do sindicato eram reconhecidas como funções delegadas do poder público. Instituiu a contribuição sindical obrigatória. Assim, a CF/37 com feição eminentemente corporativista não reconhecia o direito de greve, tido como recurso anti-social e nocivo ao trabalho, e o lock out.

            Em 1939 o Decreto Lei 1.402/39 (regulamenta a CF/37) regulariza a instituição do sindicato único, estabelecendo um sindicato por categoria econômica ou profissional na mesma base territorial e permitindo a intervenção e interferência do Estado no sindicato, que não podia desrespeitar a política econômica determinada pelo governo, sob pena da perda da carta sindical.

            A Constituição de 1946 (queda do “Estado Novo”), aprovada em Assembléia Nacional Constituinte, portanto mais democrática, estabelecia em seu artigo 159 que “é livre a associação profissional ou sindical, sendo regulada por lei a forma de sua constituição, a sua representação legal nas convenções coletivas de trabalho e o exercício de funções delegadas pelo poder público” . A partir de então, o sindicato continuava a exercer função delegada de poder público e o direito de greve passou a ser reconhecido e não ser mais tratado como recurso anti-social e nocivo ao trabalho.           

            A Constituição de 1967 não trouxe mudanças significativas, entretanto, o Decreto n.º 229 de 28/02/67, trouxe uma série de alterações na CLT, dentre as quais, a possibilidade dos sindicatos celebrarem acordos e convenções coletivas e o voto sindical obrigatório.

            A Carta Magna atual, estabelece em seu artigo 8º a livre associação profissional ou sindical, mantendo-se pois o que já constava na Constituição de 1937 (art. 138), 1946 (art. 159), 1967 (art. 159) e EC n.º 01/69 (art. 166) – no item VIII do presente estudo trataremos especificamente da CF/88 e da legislação infraconstitucional atinente ao Direito Coletivo do Trabalho.

            Ao logo deste processo de evolução histórica do Direito Coletivo do Trabalho no Brasil foram ratificadas 6 convenções da Organização Internacional do Trabalho e uma ainda padece de ratificação – todas tratando de temas relacionados ao objeto do nosso estudo.

  Publicado no site: OIT - Organização Internacional do Trabalho - Escritório no Brasil (http://www.oitbrasil.org.br)

  Publicado no site: OIT - Organização Internacional do Trabalho - Escritório no Brasil (http://www.oitbrasil.org.br)

  1. VII.    Funções do Direito Coletivo do Trabalho

            O Direito Coletivo do Trabalho cumpre as mesmas funções gerais típicas a todo ramo justrabalhista e podem ser divididas em divididas em dois grupos: gerais (envolvem os objetivos inerentes a todo o direito do Trabalho – individual e coletivo) e específicas (tratam especificamente do segmento juscoletivo), sendo que neste trabalho, por razões obvias, estudaremos as funções específicas.

            As funções específicas do Direito Coletivo do Trabalho são: geração de normas jurídicas, pacificação de conflitos de natureza sociocoletiva, função sociopolítica e função econômica.

Geração de normas ou regras jurídicas

            Trata-se do poder de normatizar os contratos de trabalho das respectivas bases representadas na negociação coletiva, gerando, inclusive, mas não somente, dispositivos obrigacionais que irão dirigir-se essencialmente aos sujeitos da própria negociação efetivada e não ao universo de trabalhadores geridos pelos instrumentos coletivos, é um marco de afirmação do segmento juscoletivo, que confere a ele papel econômico, social e político.

            A mais emblemática expressão desta força normativa está no inciso VI do artigo 7º da Carta Magna, que assegura a irredutibilidade do salário do empregado, salvo o disposto em convenção ou acordo coletivo. Importante ressaltar que nem a lei nem o poder normativo da Justiça do Trabalho podem reduzir salários, esta faculdade está reservada única e exclusivamente à negociação coletiva, que, quanto aos empregados, conta sempre com obrigatória participação do seu sindicato – inteligência do artigo 8º, inciso VI, CF/88.

Pacificação de conflitos de natureza sociocoletiva

            O Direito Coletivo do Trabalho possui diversos instrumentos de auto composição, sendo a negociação coletiva a mais relevante e conhecida desses instrumentos pacificatórios, mas como dito não é a única, temos também a arbitragem e mediação trabalhistas, do dissídio coletivo e sua sentença normativa, das comissões ou delegados intraempresarias de solução de conflitos (raro mas existe).

Função sociopolítica

            Para Maurício Godinho Delgado:

O Direito Coletivo do Trabalho cumpre função social e política de grande importância. Ele é um dos mais relevantes instrumentos de democratização de poder, no âmbito social, existente nas modernas sociedades democráticas – desde que estruturado de modo também democrático, é claro.[21]

            Ainda segundo o nobre doutrinador, “(...) o Direito Coletivo do Trabalho é um dos mais significativos instrumentos de democratização social gerados na história desse mesmo sistema socioeconômico”.[22]

Função econômica

            Trata-se da capacidade do Direito Coletivo do Trabalho produzir a adequação às particularidades regionais ou históricas de regras de indisponibilidade atinentes às suas próprias características, significa dizer que com a negociação coletiva é possível ajustar vários aspectos próprios à generalidade das leis trabalhistas a setores ou momentos específicos vividos no mercado de trabalho, conferindo dinamismo econômico ao próprio direito do Trabalho.[23]

  1. VIII.    Direito Coletivo do Trabalho na Constituição Federal e nas Normas Infraconstitucionais

            A Constituição Federal de 1988 trata deste tema em diversos artigos, nos quais podemos verificar mudanças significativas para o Direito Coletivo do Trabalho, quando comparamos com os períodos anteriores de nossa história recente e afastamos os traços marcantes de autoritarismo daquele antigo modelo, apresentado anteriormente, vejamos:

a)  Art. 7º, XXVI: Reconhece as convenções e os acordos coletivos prestigiando a autonomia da vontade das partes envolvidas nas negociações.

b)  Art. 8º, I: Vedação de autorização do Estado para a criação de sindicatos e o Poder Público não poderá intervir ou interferir[24] na organização sindical.

A CF/88 põe fim de uma vez por todas na intervenção do Estado nas organizações sindicais e estabelece um mínimo de independência à estas, garantindo liberdade dos indivíduos na criação de sindicatos e retirando qualquer influência estatal no momento prévio ao surgimento do ente coletivo.

c)  Art. 8º, III: Reforçou o papel dos sindicatos na defesa dos direitos e interesses coletivos ou individuais da categoria, inclusive em questões judiciais e administrativas.

d)  Art. 8º, V: Estabelece em âmbito constitucional a liberdade sindical individual.

e)  Art. 8º, VI: É obrigatório a participação dos sindicatos nas negociações coletivas de trabalho.

Acertadamente a CF/88 buscou ampliar a participação direta dos sujeitos na produção das normas que regerão suas relações, consequentemente passou-se a ter uma maior produção de normas autônomas e a diminuição da interferência estatal com suas normas heterônomas. Os sindicatos deixam de ser meros coadjuvantes para se tornarem protagonistas.

f)   Art. 8º, VIII: Garantia provisória do dirigente sindical.

Trata-se de uma garantia da independência da atuação dos entes sindicais, visto que o dispositivo veda a dispensa do empregado sindicalizado a partir do registro de sua candidatura a cargo de direção ou representação sindical e, se eleito, ainda que suplente, até um ano após o final do mandato, salvo se cometer falta grave nos termos da lei.

É uma garantia estritamente ligada ao desempenho da função sindical e de modo algum deve ser interpretada como uma vantagem pessoal do dirigente sindical. [25]

g)  Art. 9º: Estabelece o direito de greve, sem qualquer limitação.

Caberá a classe de trabalhadores decidir sobre a oportunidade de exercer este direito e sobre os interesses que devam ser defendidos – salvo nos casos de serviços ou atividades essenciais.

No que tange a administração pública, os servidores públicos civis têm direito à livre associação sindical, nos termos do art. 37, VI da CF/88, entretanto, o direito de greve ainda depende de regulamentação, inciso VII do referido artigo, cabendo ao STF o julgamento de casos concretos:

“A questão relativa a greve de servidor público, com fundamento no art. 37, VII, da CF, é da competência deste STF, pois o acórdão recorrido decidiu a questão com fundamento em dispositivos constitucionais.” (RE 480.989‑AgR, Rel. Min. Ellen Gracie, julgamento em 28‑9‑2010, Segunda Turma, DJE de 25‑10‑2010.)[26]

“A simples circunstância de o servidor público estar em estágio probatório não é justifica­tiva para demissão com fundamento na sua participação em movimento grevista por período superior a trinta dias. A ausência de regulamentação do direito de greve não transforma os dias de paralisação em movimento grevista em faltas injustificadas.” (RE 226.966, Rel. p/ o ac. Min. Cármen Lúcia, julgamento em 11‑11‑2008, Primeira Turma, DJE de 21‑8‑2009.) Vide: ADI 3.235, Rel. p/ o ac. Min. Gilmar Mendes, julgamento em 4‑2‑2010, Plenário, DJE de 12‑3‑2010.[27]

“Ação direta de inconstitucionalidade. Lei 9.293/1990 do Estado do Paraná. Invalidade, com efeito retroativo, de ‘atos, processos e iniciativas’ que tenham gerado punição dos inte­grantes do magistério e demais servidores públicos decorrentes de greves. Readmissão garan­tida. Cautelar justificada.” (ADI 341‑MC, Rel. Min. Célio Borja, julgamento em 8‑8‑1990, Plenário, DJ de 14‑9‑1990.)[28]

h)  Art. 11º: Assegura a eleição de um representante dos empregados, nas empresas com mais de 200 funcionários, com a finalidade exclusiva de promover-lhe o entendimento direto com os empregadores.

            Mas a CF/88 não foi só acertos e conquistas, em que pese seus ideais de democracia e o merecido nome de Constituição Cidadã, esta manteve alguns dispositivos que geram contradições antidemocráticas e por vezes acabam impedindo o desenvolvimento do sistema sindical nacional, vejamos:

a)  Art. 8º, II: veda a criação de mais de uma organização sindical, em qualquer grau, não podendo ser inferior à área de um Município.

A unicidade sindical representa uma exclusividade imposta pela norma, ou seja, apenas um e somente uma organização sindical poderá, em determinada base territorial, representar categoria profissional ou econômica.

Esta disposição não se coaduna com a Convenção 87 da OIT, de 1948, que estabelece o sistema de liberdade sindical plena, ainda não subscrita pelo Brasil, pois veda a existência de entidades sindicais concorrentes ou de outros tipos sindicais, em síntese, criou-se um sistema de sindicato único, com monopólio de representação sindical dos sujeitos trabalhistas. 

Assim, a unicidade sindical consiste em uma faceta antidemocrática da CF/88, na medida em que impõe uma espécie de “reserva de mercado” a um determinado sindicato.

b)  Art. 8º, IV: imposto sindical;

Se por um lado a CF/88 teve o cuidado de garantir uma atuação sindical independente e livre de interferências estatais, por outro passou a fomentar um ambiente vulnerável de disputas descompromissadas com o interesse das bases representadas, pois ao garantir uma receita independentemente da eficiência, compromisso e legitimidade do ente sindical, este “novo modelo de sistema sindical” acabou propiciando o surgimento descontrolado de novos sindicatos (fragmentado, fracos e interessados apenas em conseguir uma fatia dos recursos advindos do imposto sindical).

Neste ponto falhou e muito o Poder Constituinte pois se não houvesse este imposto sindical (compulsório e sem nenhuma garantia de qualidade da representação), certamente estes “órgãos de representação” seriam mais eficientes em seus fins, haja visto que teriam que lutar para garantir a permanência de seus sindicalizados bem como para o ingresso de novos.

c)  Art. 114, § 2º: poder normativo da Justiça do Trabalho.

Trata-se de uma singularidade do Direito do Trabalho e em que pese a alteração trazida pela Emenda Constitucional n.º 45, de 8 de dezembro de 2004, que modificou este dispositivo, dispondo que para o ajuizamento do dissídio coletivo primeiramente deve-se buscar a solução do conflito por meio da negociação coletiva ou arbitragem, hipóteses de auto composição, somente quando restarem frustradas as tentativas mencionadas, é que as partes, de comum acordo, poderão ajuizar dissídio coletivo de natureza econômica.

Sem dúvida que a EC n.º 45 tentou realinhar a CF/88 ao seu espírito democrático, entretanto, se por um lado tentou-se restringir a manifestação do Poder Normativo da Justiça do Trabalho, dando espaço à produção autônoma de normas, por outro lado a sentença normativa continua prevista e, consequentemente o Poder Normativo da Justiça Laboral com todas as implicações dele advindas.

            No âmbito da Legislação Infraconstitucional, a Consolidação das Leis do Trabalho - CLT, aprovada pelo Decreto Lei n.º 5.452 de 1º de maio de 1.943, recepcionada pela CF/88, também regula as relações coletivas de trabalho, tratando o tema a partir do artigo 511 até o artigo 625-H.

            A Lei 5.584/70, artigo 18, da dispõe que a assistência judiciária será prestada ao trabalhador ainda que não seja associado do respectivo Sindicato.

            A Lei 7.783/89 Dispõe sobre o exercício do direito de greve, define as atividades essenciais, regula o atendimento das necessidades inadiáveis da comunidade.

            A lei nº 8.073/90 estabelece que as entidades sindicais poderão atuar como substitutos processuais dos integrantes da categoria.

            Nos termos da lei nº 8.984/95, a justiça competente para julgar as ações de cumprimento de acordos e convenções coletivas de trabalho é a Justiça do Trabalho.

            A Lei 11.648/2008 dispõe sobre o reconhecimento formal das centrais sindicais para os fins que especifica, altera a Consolidação das Leis do Trabalho.

            Temos também as Súmulas do Supremo Tribunal Federal – STF, do Tribunal Superior do Trabalho - TST e do Superior Tribunal de Justiça – STJ, que trazem entendimento sobre diversas matérias  envolvendo o Direito Coletivo do Trabalho.

Súmulas do Supremo Tribunal Federal - STF

Súmula 196

Ainda que exerça atividade rural, o empregado de empresa industrial ou comercial é classificado de acordo com a categoria do empregador.

Súmula 197

O empregado com representação sindical só pode ser despedido mediante inquérito em que se apure falta grave.

Súmula 666

A contribuição confederativa de que trata o art. 8º, iv, da constituição, só é exigível dos filiados ao sindicato respectivo.

Súmula 677

Até que lei venha a dispor a respeito, incumbe ao ministério do trabalho proceder ao registro das entidades sindicais e zelar pela observância do princípio da unicidade.

Súmulas do Tribunal Superior do Trabalho - TST

Súmula 277

As cláusulas normativas dos acordos coletivos ou convenções coletivas integram os contratos individuais de trabalho e somente poderão ser modificadas ou suprimidas mediante negociação coletiva de trabalho.

Súmula 330

A quitação passada pelo empregado, com assistência de entidade sindical de sua categoria, ao empregador, com observância dos requisitos exigidos nos parágrafos do art. 477 da CLT, tem eficácia liberatória em relação às parcelas expressamente consignadas no recibo, salvo se oposta ressalva expressa e especificada ao valor dado à parcela ou parcelas impugnadas.

I - A quitação não abrange parcelas não consignadas no recibo de quitação e, consequentemente, seus reflexos em outras parcelas, ainda que estas constem desse recibo.

II - Quanto a direitos que deveriam ter sido satisfeitos durante a vigência do contrato de trabalho, a quitação é válida em relação ao período expressamente consignado no recibo de quitação.

Súmula 369

Trata da estabilidade provisória do dirigente sindical.

Súmula 374

Empregado integrante de categoria profissional diferenciada não tem o direito de haver de seu empregador vantagens previstas em instrumento coletivo no qual a empresa não foi representada por órgão de classe de sua categoria.

Súmula 379

O dirigente sindical somente poderá ser dispensado por falta grave mediante a apuração em inquérito judicial, inteligência dos arts. 494 e 543, §3º, da CLT.

Súmula 384

I - O descumprimento de qualquer cláusula constante de instrumentos normativos diversos não submete o empregado a ajuizar várias ações, pleiteando em cada uma o pagamento da multa referente ao descumprimento de obrigações previstas nas cláusulas respectivas.

II - É aplicável multa prevista em instrumento normativo (sentença normativa, convenção ou acordo coletivo) em caso de descumprimento de obrigação prevista em lei, mesmo que a norma coletiva seja mera repetição de texto legal.

Súmula 396

I - Exaurido o período de estabilidade, são devidos ao empregado apenas os salários do período compreendido entre a data da despedida e o final do período de estabilidade, não lhe sendo assegurada a reintegração no emprego.

II - Não há nulidade por julgamento “extra petita” da decisão que deferir salário quando o pedido for de reintegração, dados os termos do art. 496 da CLT.

Súmulas do Superior Tribunal de Justiça – STJ

Súmula 4

Compete a justiça estadual julgar causa decorrente do processo eleitoral sindical.

Súmula 222

Compete à Justiça Comum processar e julgar as ações relativas à contribuição sindical prevista no art. 578 da CLT.

            Temos ainda as Orientações Jurisprudenciais do TST e as Súmulas do TFR que tratam de matérias atinentes ao Direito Coletivo do Trabalho.

            Como pudemos observar, a legislação infraconstitucional é esparsa, abrangendo diversos temas envolvendo o Direito Coletivo do Trabalho, merecendo cada uma delas um estudo a parte.

  1. IX.    Princípios do Direito Coletivo do trabalho

            Segundo a concepção jusnaturalista, os princípios são metajurídicos e estão acima do direito positivo, sobre o qual exercem uma função corretiva e prioritária, estão acima das leis e expressando valores que não podem ser contrariados por estas, uma vez que são regras de direito natural. [29]

            Já para o positivismo jurídico os princípios estão situados no ordenamento

jurídico, cumprem uma função integrativa das lacunas e são descobertos de modo indutivo, partindo das leis para atingir as regras mais gerais que delas derivam, restritos, portanto, aos parâmetros do conjunto de normas vigentes, modificáveis na medida em que os seus fundamentos de direito positivo são alterados.[30]

            Na seara do Direito Coletivo do Trabalho os princípios constroem-se em torno da noção de ser coletivo e das prerrogativas e papéis assumidos por tais sujeitos no contexto de suas relações recíprocas e em face dos interesses que representam.[31]

            Em suma, princípios são os alicerces, as bases ou as estruturas que dão sustentação a determinado instituto, no caso do nosso estudo, sustentam o Direito Coletivo do Trabalho.

            Para GODINHO, os princípios do Direito Coletivo do Trabalho podem ser classificados em três grandes grupos: 1) Grupo das diretrizes assecuratórias das condições de emergência e afirmação da figura do ser coletivo obreiro; 2) Grupo das diretrizes que regem as relações entre os seres coletivos obreiros e empresariais, no contexto da negociação coletiva; 3) Grupo das diretrizes que informam as relações e efeitos perante o universo e comunidade jurídicos das normas produzidas pelos contratantes coletivos.[32]

  1. 1.  Princípios assecuratórios das condições de emergência e afirmação da figura do ser coletivo obreiro

            Este grupo de princípios tem seu enfoque centrado no ser coletivo obreiro, ou seja, na criação e fortalecimento de organizações de trabalhadores que possam exprimir uma real vontade coletiva desse segmento social – são as organizações de representação da classe trabalhadora.

Princípio da Liberdade Associativa e Sindical

            O Princípio da Liberdade Associativa e Sindical dispõe sobre a livre associação (Art. 5º, XVI, XVII e XX, CF) e permite a criação de sindicatos, independente da autorização do Estado (Art. 8º, I, CF).

            Estabelece ainda que ninguém será obrigado a filiar-se ou mesmo manter-se filiado se esta não for a sua vontade (artigo 8º, V), neste sentido se manifestou o Supremo Tribunal Federal

"Art. 2º, IV, a, b e c, da Lei 10.779/2003. Filiação à colônia de pescadores para habilitação ao seguro-desemprego (...). Viola os princípios constitucionais da liberdade de associação (art. 5º, XX) e da liberdade sindical (art. 8º, V), ambos em sua dimensão negativa, a norma legal que condiciona, ainda que indiretamente, o recebimento do benefício do seguro-desemprego à filiação do interessado a colônia de pescadores de sua região.” (ADI 3.464, Rel. Min. Menezes Direito, julgamento em 29-10-2008, Plenário, DJE de 6-3-2009.)

            Enquanto princípio da liberdade de associação (Art. 5º, XX, CF) assegura consequência jurídico-institucional a qualquer iniciativa de agregação estável e pacífica entre pessoas, independentemente de seu segmento social ou dos temas causadores da aproximação. Não se restringe, portanto, à área e temáticas econômico-profissionais (onde se situa a ideia de liberdade sindical).

Qual o conteúdo do direito coletivo do trabalho?

O Direito Coletivo do Trabalho vem regular o direito de diversas pessoas com interesses em comum, que venham a pertencer a um mesmo conjunto de características, na maioria das vezes, essa representatividade se dá por um sindicato que pode ser tanto de trabalhadores, quanto de empregadores.

Quais são os princípios do direito coletivo do trabalho envolvidos?

Princípios do Direito Coletivo do Trabalho.
Princípio da Liberdade Associativa e Sindical. ... .
Princípio da Autonomia Sindical. ... .
Princípio da Interveniência Sindical na Normatização Coletiva. ... .
Princípio da Equivalência dos Contratantes Coletivos. ... .
Princípio da Lealdade e Transparência na Negociação Coletiva..

Quais são os direitos coletivos?

Os direitos coletivos são conquistas sociais reconhecidas em lei, como o direito à saúde, o direito a um governo honesto e eficiente, o direito ao meio ambiente equilibrado e os direitos trabalhistas.

Quais os sujeitos do direito coletivo do trabalho?

No direito coletivo, os sujeitos são os grupos de trabalhadores e de empregadores, representados, em regra, pelos sindicatos de empregados (categoria profissional) e sindicato das empresas (categoria econômica), apresentando-se como relações intersindicais.