Qual a consequência do uso indiscriminado de fertilizantes no solo?

Em meio a tantas polêmicas, em especial após o número recorde de novos agrotóxicos permitidos pelo governo brasileiro em 2019, é importante entender melhor os males que eles proporcionam e porque, diante de tantos riscos, os produtos seguem em uso.

Inicialmente, é fundamental mencionar aqui que uma das fontes consultadas foi o livro Primavera Silenciosa, de Rachel Carson, cientista norte-americana que denunciou os males causados pelo uso intenso (e sem respaldo científico) de químicos nas lavouras dos Estados Unidos nos anos 50.

Carson realizou pesquisa intensa e detalhada de inúmeras consequências do uso de agrotóxicos, desde seu surgimento até possíveis danos no futuro. O clamor que se seguiu à publicação de seu livro em 1962 forçou a proibição do DDT e instigou mudanças revolucionárias nas leis que dizem respeito ao ar, terra e água nos EUA.

Outra fonte consultada fundamental para entender o panorama do agronegócio no Brasil é o Atlas do Agronegócio, lançado no país em 2018 pela Fundação Heinrich Böll e a Fundação Rosa Luxemburgo.

Fertilizantes sintéticos

Quando se fala em produção agrícola, a fertilidade do solo é uma questão fundamental para os agricultores porque é necessário repor os nutrientes retirados da terra pelas plantações.

Os três principais nutrientes de que as plantas necessitam são nitrogênio, fósforo e potássio, e são encontrados em estrume, esterco de frango, resíduos da colheita e outros materiais de origem animal ou vegetal.

Os fertilizantes minerais também os contêm, mas suas fontes são diferentes: fósforo e potássio são extraídos de rochas. Já o nitrogênio sintético é produzido por meio de um processo químico.

Segundo o Atlas do Agronegócio, a produção de fertilizantes artificiais demanda uso intenso de energia, o que significa que seus preços estão vinculados aos preços do gás e do petróleo. Na sequência, é apresentado o consumo desses químicos no Brasil, que aumentou mais de 170 vezes entre 1950 e 2016.

Fonte: Atlas do Agronegócio (2018).

O crescimento acentuado do uso de fertilizantes sintéticos, atrelado ao fato de que nenhuma das grandes empresas que atuam no setor é de origem brasileira, aponta um cenário em que nossa agricultura é dependente de empresas estrangeiras que dominam o setor.

Esta situação contribui para um panorama de insegurança alimentar. Mesmo o Brasil, com sua fartura de produção de alimentos, está refém de grandes empresas que produzem sementes transgênicas e vendem fertilizantes e agrotóxicos que contaminam o meio ambiente e a saúde da população.

No Brasil, o uso de fertilizantes aumentou 3,5 vezes desde 1995, resultado da intensificação agrícola industrial no país. Cada hectare de terra arável é tratado com 163,7 kg de fertilizantes — cerca de 25% a mais que a média mundial (137,6kg), o que torna o Brasil o quarto maior consumidor de fertilizantes do mundo.

O uso excessivo de fertilizantes pode causar diversos impactos ambientais, como a acidificação dos solos e a poluição de lençóis freáticos, lagos e rios. Além disso, a aplicação desses químicos pode deixar concentrações elevadas de nitrato e metais pesados no solo, em rios e nas águas subterrâneas.

Agrotóxicos e o meio ambiente

Agrotóxicos são substâncias utilizadas no controle de pragas e doenças agrícolas. Podem ser divididos em: herbicidas, que controlam plantas invasoras; inseticidas, que controlam insetos; fungicidas, que controlam fungos; e bactericidas, que controlam bactérias. Todos os tipos têm o objetivo de aumentar a produtividade agrícola.

Assim como no caso dos fertilizantes, os agrotóxicos também são produzidos e comercializados por poucas grandes empresas multinacionais.

Em 2016, a Bayer, empresa originalmente do setor farmacêutico, comprou a Monsanto e se tornou a maior corporação agrícola do mundo, possuindo um terço do mercado global de sementes comerciais e um quarto do mercado de agrotóxicos.

A grande questão é: quem assegurar o domínio sobre os agrotóxicos e o material genético por meio de patentes, controlará o setor de sementes e influenciará a agricultura, a produção de alimentos e, acima de tudo, a segurança e soberania alimentar mundial.

O Brasil é o maior consumidor de agrotóxicos do mundo (em números absolutos). As commodities soja, milho, cana e algodão concentram 85% do total de agrotóxicos utilizados. E entre 2000 e 2012 no Brasil, período de maior expansão das áreas de soja e milho transgênicos, esse número cresceu 160%, sendo que na soja aumentou três vezes. Só a soja, predominante entre as culturas geneticamente modificadas, utiliza 71% desse volume.

Entre os prejuízos causados pelos agrotóxicos ao meio ambiente, pode-se destacar a poluição do solo e dos recursos hídricos. Este ano, centenas de cidades brasileiras apresentaram alguma concentração desses químicos na água de abastecimento .

Além disso, os estudos de Rachel Carson já apontavam que muitos químicos podem persistir por anos no solo, sendo que alguns estudos apontavam até 11 anos de persistência. Além disso, Carson já alertava para o poder de acumulação, o que significa que um solo contaminado que receber mais agrotóxico, terá sua concentração aumentada. O plantio em solo contaminado pode resultar na absorção dos químicos ali presentes pelas plantas, mesmo que não sejam feitas novas pulverizações.

Além disso, essas substâncias se ligam ao tecido de gordura dos animais. Isso significa que, ao longo da cadeia alimentar, os agrotóxicos podem se acumular. Do solo pra planta, da planta pros animais que se alimentam de plantas, destes para seus predadores e assim por diante.

Outro risco que merece destaque é a interferência no ciclo de vida de polinizadores. As abelhas, polinizadores fundamentais para garantir a reprodução da flora (principalmente de grãos), têm sofrido com o uso de agrotóxicos em todo o mundo. No início deste ano, meio bilhão de abelhas foram encontradas mortas no Brasil devido ao uso de agrotóxicos. Este problema também afetou outros países, que hoje já trabalham com iniciativas para criar novas formas de atrair de volta esses polinizadores, como a cidade de Utrecht, na Holanda.

Agrotóxicos e Saúde Humana

O glifosato é um composto químico desenvolvido pela Monsanto nos anos setenta e o princípio ativo de dois produtos: RoundUp e Ranger Pro. Trata-se do agrotóxico mais popular do mundo, é muito usado nas lavouras transgênicas e responde por mais da metade de todo o veneno usado na agricultura brasileira, como mostra a figura a seguir.

Fonte: Atlas do Agronegócio (2018).

As intoxicações agudas por agrotóxicos afetam principalmente as pessoas expostas em seu ambiente de trabalho e são caracterizadas por efeitos como irritação da pele e dos olhos, coceira, vômitos, diarreias, dificuldades respiratórias, convulsões e até morte.

Já as intoxicações crônicas podem aparecer muito tempo após a exposição e afetar toda a população, pois são decorrentes da presença de resíduos de agrotóxicos em alimentos e no ambiente, geralmente em doses baixas.

Os efeitos associados à exposição crônica incluem: infertilidade, impotência, abortos, malformações, neurotoxicidade, desregulação hormonal, efeitos sobre o sistema imunológico e câncer.

Carson já apontava, em seu livro, que a intoxicação por agrotóxicos estava tão fora de controle, que foram encontrados resquícios de algumas substâncias até no leite materno.

Em especial, o glifosato foi classificado pela Agência Internacional de Pesquisa sobre o Câncer, da Organização Mundial da Saúde (IARC/OMS), como provável cancerígeno para os seres humanos. A Monsanto tem mais de 13 mil processos na justiça, acusada de saber que o glifosato tem potencial cancerígeno e não expor essa informação no rótulo de seus produtos.

Vale ressaltar que o glifosato é o ingrediente ativo do Roundup, mas outros componentes e subprodutos da fórmula podem ser ainda mais tóxicos para as células humanas do que o próprio ingrediente ativo.

Outros agrotóxicos utilizados no Brasil foram incluídos na lista da IARC, entre eles o 2,4-D, que é o terceiro agrotóxico mais usado no Brasil — aplicado nas culturas de arroz, aveia, café, cana-de-açúcar, centeio, cevada, milho, pastagem, soja, sorgo e trigo. É classificado pela Anvisa como extremamente tóxico, mas, apesar disso, pode ser aplicado sobre 3 variedades de soja e 5 de milho transgênico.

As sementes transgênicas (modificadas em laboratório) são outro ponto importante, pois justamente por serem, teoricamente, mais resistentes, permitem receber uma carga ainda maior de agrotóxicos.

A abertura de mercado para as multinacionais proprietárias dessas sementes impulsionou a mudança de normas nacionais que definem os limites máximos de resíduos de agrotóxicos (LMR) permitidos nas culturas agrícolas, explicitando que as plantações transgênicas demandam mais pulverizações que as convencionais, conforme figura a seguir.

Fonte: Atlas do Agronegócio (2018).

Aspectos políticos

De acordo com o IBGE, o setor agropecuário corresponde a, aproximadamente, 6% do PIB brasileiro no 2º trimestre de 2019. Ainda, segundo o relatório Terrenos da desigualdade: terra, agricultura e desigualdade no Brasil rural, publicado pela Oxfam, grandes proprietários de terra possuem uma dívida de mais de 900 bilhões de reais com a União.

Esses proprietários formam um grupo político forte e articulado, capaz de colocar seus interesses em pautas governamentais. No Brasil, a força do agronegócio atua em muitas frentes. No Congresso há a Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA, formalizada com este nome em 2008), a face mais organizada da bancada ruralista em Brasília.

A FPA, no entanto, não reúne a totalidade dos ruralistas no Congresso, uma vez que a bancada é maior que sua representação institucional. Expoentes da indústria e de outros setores, como o financeiro, possuem relações com os donos da terra no setor agropecuário.

A respeito das grandes multinacionais detentoras de sementes e agrotóxicos, quanto maior, mais poder ela tem para pressionar políticos e influenciar a legislação.

Tem saída?

A crítica ao modelo industrial de agricultura, manifestada por um conjunto cada vez mais diverso de atores, vem ganhando força junto à sociedade na defesa de um modelo agroalimentar baseado na agricultura familiar, na agroecologia, na democratização do aceso à terra e no direito humano à alimentação adequada.

É importante lembrar que as plantas não necessariamente precisariam de agrotóxicos se não usássemos um sistema produtivo de monocultura. Na natureza, diferentes espécies coexistem, há competição e há cooperação também — uma espécie pode afastar insetos que atingiriam outra espécie de planta e uma mesma praga não afeta todas as plantas e acarreta na perda de toda a colheita como em uma monocultura.

A agroecologia considera que essa biodiversidade é fundamental para o desenvolvimento agrícola, e que, com o uso dessa técnica, escolhendo as espécies corretas que devem ser plantadas próximas, é possível que a agricultura prospere sem utilizar químicos que colocam em risco a saúde humana e do meio ambiente.

O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), por exemplo, é um dos maiores produtores de orgânicos do Brasil e o maior produtor de arroz orgânico da América Latina.

Na microescala, o que pode ser feito hoje é tentar comprar alimentos diretamente de produtores locais que vendem produtos agroecológicos — normalmente esses produtores vendem seus produtos em feiras ou comércio local. Se ainda é caro, podemos tentar comprar uma parte e complementar o restante no supermercado. Nosso dinheiro não deixa de ser um voto no mundo que queremos construir.

De forma mais ampla, devemos pressionar nossos representantes políticos em todos os níveis para facilitar o acesso à comida sem veneno, seja proibindo a pulverização aérea de agrotóxicos (como no Estado do Ceará) ou alterando a tributação de produtos que contêm agrotóxicos (como fará o Estado de Santa Catarina a partir de 2020).

É necessário pensar em que economia queremos para o futuro do nosso país. Se adotarmos métodos destrutivos de produzir alimentos, haverá Brasil no futuro?

Para saber mais:

· O câncer que espreita a Monsanto — El País.

· Monsanto é condenada em 1ª instância nos EUA por relação entre câncer e herbicida — Folha de São Paulo.

· Monsanto é condenada a pagar US$ 2 bi a casal com câncer atribuído ao herbicida Roundup — O Globo.

· Proprietários de terra devem quase R$ 1 trilhão à União — De Olho nos Ruralistas.

· Orgânicos pra todos: é possível? — Comida Saudável pra Todos.

· terra Com t Minúsculo: Por Que o MST Incomoda Tanta Gente? — Modefica.

· MST — Greg News.

· Mapa de feiras orgânicas no Brasil.

Quais as consequências do uso indiscriminado de fertilizantes?

O problema dos fertilizantes podem estar nos seus impactos, tais como a degradação da qualidade do solo, a poluição das fontes de água e da atmosfera e o aumento da resistência de insetos considerados pragas para as plantações.

Como os fertilizantes afetam a solução do solo?

Contaminação da água A maior parte dos fertilizantes aplicados penetra diretamente no solo, mas uma parte é levada pelo processo de lixiviação. Como resultado, os compostos químicos presentes nos fertilizantes causam a contaminação de rios, lagos e lençóis freáticos.

Porque o uso de fertilizantes na lavoura causa contaminação do solo?

A contaminação acontece porque as substâncias são absorvidas pelas plantas quando sua forma química no solo se assemelha a um nutriente de que a planta necessita.

O que os fertilizantes contribuem para a destruição da natureza?

Os fertilizantes contêm em sua composição nitratos e fosfatos, e uma vez lançados nas lavouras são posteriormente arrastados com a água das chuvas para o leito dos rios ou se infiltram no solo, indo para os lençóis freáticos e mananciais.