Qual a contribuição dos imigrantes para a organização da classe trabalhadora urbana no Brasil?

A CONSTRU��O DE VILAS OPER�RIAS NO SUL DO BRASIL: O CASO DE GAL�POLIS

Vania Beatriz Merlotti Her�dia
Universidade de Caxias do Sul, Brasil.


A constru��o se vilas oper�rias no sul do Brasil: o caso de Gal�polis (Resumo)

A constru��o de vilas oper�rias[1] tem como finalidade a imobiliza��o da for�a de trabalho para o processo fabril, garantindo, atrav�s da sua disponibilidade, a reprodu��o da mesma. No final do s�culo XIX e na primeira d�cada do s�culo XX, n�o era tarefa f�cil contratar for�a de trabalho especializada para o trabalho industrial. Dessa forma, a exist�ncia de vila oper�ria resolvia em grande parte a sistematiza��o da for�a de trabalho, uma vez que a classe patronal, mantendo a vila com seus oper�rios, reproduzia a for�a de trabalho dentro do ambiente fabril. Os filhos dos oper�rios aprendiam o of�cio com os pr�prios pais e, al�m da reprodu��o do pr�prio of�cio, reproduzia-se � consci�ncia coletiva existente na vila. Este estudo foi dividido em duas partes: a primeira trata de um breve hist�rico da vila oper�ria de Gal�polis e a segunda das pol�ticas sociais adotadas pela ind�stria t�xtil na manuten��o dessa vila e os mecanismos utilizados para atrair for�a de trabalho.

Palavras chave: vila oper�ria, condi��es de moradia, pol�ticas sociais, reten��o da for�a de trabalho.


The construction of workers village in the south of Brazil: Gal�polis case (Abstract)

The purpose of building worker�s villages is to immobilize labor force for the factory process, thus guaranteeing its reproduction through its being available. At the end of the 19th century and in the first decade of the 20th century hiring specialized labor force for the industry was no easy task. So the existence of a worker�s village solved to a greater extent the systematization of labor force, since employers, by keeping a village with its workers, reproduced the labor force inside a factory environment. Worker�s children learned their parent�s craft, and so they reproduced not only their own craft but the village�s collective consciousness too. This study is divided in two parts: the first one is a brief history of Gal�polis worker�s village, and the second deals with social policies adopted by the textile industry in the maintenance of this village, and the mechanisms used to attract labor force.

Key words: worker�s village; housing conditions; social policies; labor force retention.


Os prim�rdios da vila oper�ria de Gal�polis

Os primeiros colonos italianos que se instalaram nos lotes coloniais que constitu�am o povoado de Gal�polis faziam parte do programa oficial de imigra��o financiado pelo governo brasileiro, para ocupar e colonizar aquelas terras. Esses colonos eram propriet�rios de pequenos lotes e se dedicaram a culturas de subsist�ncia, visto que o local era cercado de morros e n�o era prop�cio � agricultura extensiva e � cria��o de gado.

O in�cio do povoado de Gal�polis data dos primeiros anos da imigra��o italiana. H� registros de fam�lias que se instalaram na localidade em 1876, na �poca chamada de "Desvio do Morro". Os limites da vila se situavam na extremidade sul da Quinta L�gua de Caxias e ao Nordeste da Terceira L�gua. Os lotes que formavam o povoado estavam localizados na Quarta L�gua, nos Travess�es de Barata G�es e V�neto. Alguns desses colonos, anos mais tarde, resolveram construir um barrac�o para abrigar uma Cooperativa T�xtil, que se chamaria Societ� Tevere e Novit�. Foram eles que fundaram a futura vila oper�ria, alguns eram de origem camponesa e outros de forma��o artes�, provenientes das comunidades de Schio e Valle dos Signori[2]. As fam�lias oper�rias que faziam parte dessa cooperativa provinham da zona t�xtil de Schio em Vicenza e haviam emigrado devido a conflitos salariais no final do s�culo XIX.

A localiza��o geogr�fica dos lotes coloniais, negociados com esses emigrantes, n�o propiciava atividades no setor prim�rio e estimulava a organiza��o de atividades secund�rias, semelhantes �quelas deixadas na antiga p�tria. A forma��o de uma cooperativa t�xtil lhes garantia, pela uni�o de seus recursos econ�micos, a compra de alguns teares. Essa iniciativa acolheu, al�m dos oper�rios italianos, alguns colonos imigrantes que j� habitavam no povoado e incorporaram o sonho de fazer a Am�rica.

A posse da pequena propriedade, o trabalho na pr�pria ind�stria, o emprego aos filhos e o investimento em seus trabalhos agr�colas foram fatores determinantes na constru��o de Gal�polis. Esses fatores permitiram a mudan�a da condi��o econ�mica e do estrato social dos primeiros emigrantes em confronto com a antiga situa��o social vivida da terra de partida. Com muito trabalho, esfor�o e dedica��o come�aram a construir, na nova localidade, uma paisagem com caracter�sticas europ�ias, a partir das condi��es encontradas no local.

A forma��o do povoado inicia-se com a chegada dos colonos imigrantes italianos. Por�m, a vila oper�ria come�a a ser constru�da a partir de 1912, quando a antiga cooperativa se funde com a Casa Comercial Chaves & Almeida. Essa Casa era uma empresa comercial que atuava desde 1864 e era reconhecida no mercado regional e nacional. Alguns anos antes, a cooperativa t�xtil dos antigos oper�rios italianos havia sido vendida para um empres�rio italiano que a havia transformado numa Companhia de Tecidos de L�. A fus�o deu origem � primeira grande ind�stria t�xtil da regi�o e foi chamada Sociedade Chaves Irm�os.

As primeiras casas da vila oper�ria foram constru�das para abrigar a for�a de trabalho estrangeira contratada pela f�brica, a fim de mover os novos teares mec�nicos comprados na Europa. Com a forma��o da Sociedade Chaves Irm�os, os novos propriet�rios decidiram implantar um plano habitacional que garantisse a fixa��o da for�a de trabalho em torno da f�brica. Era um momento em que as empresas industriais se preocupavam com a manuten��o da for�a de trabalho, principalmente porque n�o era f�cil encontrar bons tecel�es e tintureiros, ou seja, for�a de trabalho especializada. Por isso, a cria��o de uma vila oper�ria solucionava esse problema � medida que garantia a fixa��o e imobiliza��o da m�o-de-obra especializada.

O modelo de ind�stria com vila oper�ria n�o era um projeto novo em termos de ind�stria t�xtil no Rio Grande do Sul, visto que a Companhia Uni�o Fabril de Rio Grande, fundada em 1873, sob o nome de Rheingantz e Vater, tinha sido a primeira ind�stria brasileira a fabricar tecidos de l�[3] e havia desenvolvido uma experi�ncia de vila oper�ria, com habita��es para oper�rios, escola, armaz�m, cooperativa, aux�lio m�tuo e associa��o beneficente.

Entretanto, para o terceiro distrito de Caxias era uma proposta inovadora e atingia o objetivo de manuten��o da for�a de trabalho familiar e, ao mesmo tempo, a sua reprodu��o. A vila foi sendo constru�da � medida que a pr�pria f�brica se expandia.

As primeiras casas eram de madeira, e as dimens�es variavam. Constru�ram casas de dois c�modos e de tr�s c�modos, usando sempre o mesmo projeto residencial. As casas possu�am jardim e uma horta. Ercole Gallo, o empreendedor dessa iniciativa, preocupava-se com a instala��o dos oper�rios, visto que conhecia as dificuldades dos imigrantes por ter sido tamb�m um imigrante.

Segundo livro de correspond�ncia da f�brica, Ercole Gallo providenciava junto � Empresa Comercial o necess�rio para a ocupa��o das casas pelos mestres estrangeiros. Esses oper�rios possu�am uma situa��o privilegiada por disporem de certos recursos naturais que lhes garantiam a reprodu��o social diferente daquela dos trabalhadores urbanos t�picos. Isso n�o significa que tenham tido melhores condi��es de trabalho dentro da f�brica, mas certamente influenciou as condi��es da qualidade de vida.

Enquanto a Companhia de Tecidos de L� era de propriedade dos oper�rios imigrantes, cada qual tinha a sua casa. A partir da expans�o do lanif�cio, com a entrada da empresa que representava o capital comercial, o grupo Chaves & Almeida, as casas para os oper�rios eram de propriedade da f�brica e haviam sido constru�das pela mesma, com o intuito de abrigar o n�mero suficiente de oper�rios de que necessitava.

Em 1928, essa empresa se torna uma sociedade an�nima e nessa data a f�brica possu�a uma �rea de 484.243 m2, tendo sob seu controle 43 casas utilizadas para a moradia de oper�rios[4]. Alguns anos ap�s a forma��o dessa sociedade, a f�brica criou uma turma de oper�rios para melhorar a qualidade das casas feitas, ainda na �poca de Ercole Gallo. Logo, pode-se afirmar que a manuten��o e a conserva��o das casas era feita pela f�brica que dispunha de pessoal espec�fico para esse fim.

Quem estabelecia o direito dos oper�rios sobre as casas era a diretoria da f�brica ou os seus representantes. Existia uma lista para a ocupa��o das casas, e as indica��es eram feitas tamb�m pelos mestres, segundo as inscri��es feitas na ger�ncia pelos oper�rios. Esses se inscreviam e em geral eram aceitos devido � necessidade de for�a de trabalho.

Segundo o estudo feito para a Revista Paulista de Ind�stria em 1955, a f�brica possu�a 80 casas e atingiu o n�mero m�ximo de 116. Os moradores pagavam um aluguel simb�lico, vari�vel, conforme a �rea constru�da da casa e o cargo na f�brica. As despesas de �gua e luz eram controladas pela f�brica�.[5]

As casas eram preferentemente alugadas, e, somente em 1974, � que houve a possibilidade de compra e venda de algumas dessas casas. Por muito tempo, n�o se falou em comprar as casas da f�brica. A pr�pria casa do gerente era de propriedade da f�brica. A casa era oferecida pela empresa dependendo da situa��o ocupacional do oper�rio no processo fabril. Representava um elemento de interioriza��o do oper�rio frente ao patr�o, da domina��o que se submetia. A uniformiza��o das casas, o controle direto da f�brica, sobre o conjunto das condi��es materiais de sua vida social extra-f�brica, como �gua, luz, aux�lio material, rem�dios, m�dicos, etc., eram elementos componentes dessa interioriza��o.

As casas oper�rias foram constru�das uma ao lado da outra; eram casas iguais, geminadas, ocupando o quarteir�o inteiro e aproveitando os terrenos da f�brica. Pr�dios de mais de dois andares n�o existiam na vila. O estilo arquitet�nico era semelhante ao das constru��es de origem italiana, apesar da substitui��o do elemento pedra pela madeira, comum no in�cio da imigra��o. A semelhan�a com as vilas europ�ias n�o � pura coincid�ncia. A experi�ncia, o estilo e a cultura comum foram tra�os transportados por esses imigrantes e mantidos por diversas gera��es.

Segundo S�rgio Lopes,[6] a variedade de estilos de vilas oper�rias n�o altera o objetivo principal de sua exist�ncia que � o da imobiliza��o da for�a de trabalho. N�o obstante todas elas apresentarem vantagens para os propriet�rios, a forma escolhida pela maioria � a do arruado, devido � vantagem da visibilidade imediata sobre o agrupamento de oper�rios pelo observador hier�rquico, que � aquele que representa a administra��o da f�brica. O controle, a vigil�ncia e a observa��o, mesmo indiretas, s�o constantes nesse tipo de vila. Isso representa para o gerente a assiduidade dos oper�rios, sua pontualidade. Ter o oper�rio pr�ximo garante a manuten��o e continuidade do processo fabril.

A constru��o de vilas oper�rias pressupunha que os trabalhadores se locomovessem juntamente com suas fam�lias devido ao alojamento. As casas eram constru�das para facilitar a vinda de oper�rios ao local do trabalho, principalmente porque, no in�cio da f�brica, a m�o-de-obra era escassa e t�-la � disposi��o representava um investimento seguro pela estabilidade que oferecia � empresa.

A vila de Gal�polis teve 700 oper�rios que viviam exclusivamente das atividades fabris.

�As edifica��es constru�das para a moradia de oper�rios constituem um conjunto� de oitenta resid�ncias dotadas de todos os requisitos de conforto, dispondo de espa�o e condi��es excelentes de ventila��o� e ilumina��o.�[7]

O oferecimento da moradia aos oper�rios tinha o papel da atra��o de for�a de trabalho de que a ind�stria necessitava. A continuidade das fam�lias na vila oper�ria, atrav�s do emprego da parentela, garantia a constitui��o e a perman�ncia de uma for�a de trabalho fabril, permanentemente renovada atrav�s do crescimento da prole. A manuten��o das rela��es pessoais estabelecidas com os gerentes garantia a minimiza��o dos conflitos que poderiam surgir entre oper�rios e a f�brica. Sinal dessas rela��es � a pr�pria inexist�ncia de conflitos organizados no decorrer da evolu��o da mesma.

Entretanto, o caso de f�brica com vila oper�ria pressup�e que o dom�nio do capital �ultrapassa a esfera do trabalho e penetra na esfera dom�stica dos trabalhadores.�[8]

A vila oper�ria de Gal�polis cresceu junto e a partir da f�brica. O isolamento acentuava a depend�ncia entre o dom�nio do trabalho e o dom�nio da moradia. O fato de o patr�o oferecer moradia garantia, portanto, o trabalho. A grande maioria dos oper�rios do lanif�cio era oriunda da pr�pria vila, e se sentia a influ�ncia direta da f�brica na vida dos oper�rios. Houve sempre uma forte interfer�ncia da f�brica na vida de seus oper�rios.

Nos primeiros tempos da f�brica, o operariado era movido por rela��es pessoais caracterizadas pelo paternalismo dos propriet�rios em rela��o aos seus empregados. Pode-se dizer que as rela��es pessoais existentes entre o gerente e os empregados eram rela��es de trabalho, marcadas pelas mais amb�guas e contradit�rias rela��es de subordina��o, obedi�ncia, temor, lealdade, amizade e paternidade[9]. Somente em poucos casos, encontram-se rela��es baseadas em tra�os de identidade profissional.

Segundo uma s�rie de depoimentos dos antigos oper�rios e membros dessas fam�lias, a f�brica havia criado uma s�rie de espa�os sociais em que o oper�rio supria praticamente todas as suas necessidades dentro dos limites da vila. Em conseq��ncia, desencadeava um processo de isolamento que, por si s�, n�o permitia a compara��o com outros estilos de vida, conquistas e lutas sociais. Por outro lado, produzia uma identidade de grupo que por muitas d�cadas foi o elo dos habitantes de Gal�polis. A recorda��o do per�odo de trabalho na f�brica era expressa com uma certa satisfa��o e com o orgulho de ter sido oper�rio do lanif�cio, mesmo aceitando problemas que, em geral, envolviam a classe oper�ria[10].

Dos entrevistados, um apenas expressou com muita m�goa a quest�o da explora��o, sendo que a maioria citava os baixos sal�rios como uma condi��o natural da organiza��o industrial no Brasil, sem referir ou acusar a f�brica de retirar parcela de bons lucros sobre o baixo pagamento da for�a de trabalho. � interessante salientar que nos depoimentos feitos os antigos oper�rios mostravam uma certa nostalgia daqueles tempos. Para os mais antigos, os bons tempos representavam as condi��es favor�veis encontradas na zona colonial italiana de Caxias, sem jamais esquecer a real situa��o da zona de origem abandonada onde faltava o p�o di�rio e n�o existia possibilidade de trabalho.

Pode-se afirmar que a vila de Gal�polis cresceu a partir das condi��es investidas pelo lanif�cio. Quando o lanif�cio se transformou em Sociedade An�nima em 1928, percebia-se o dom�nio econ�mico da unidade produtiva sobre a vila. � medida que o lanif�cio crescia, incorporava praticamente todas as atividades econ�micas presentes na vila. As atividades principais encontradas nesse distrito eram os moinhos, o trabalho com a madeira, os alambiques e casas de secos e molhados que abasteciam a mesma.

Aspectos socioecon�micos da vila oper�ria

Segundo o Censo Demogr�fico Municipal de 1932[11], Gal�polis possu�a uma popula��o de 2.300 habitantes, sendo 1.163 homens e 1.137 mulheres. Destes, 1.710 eram de nacionalidade brasileira, 566 italianos, 19 alem�es e 5 de outras. A porcentagem dessa popula��o de alfabetizados era de 69,21% e de analfabetos 30,79%. A religi�o cat�lica era predominante, ou seja, possu�a 2.206 cat�licos com a presen�a de 94 luteranos.

Esses dados permitem tra�ar um perfil da popula��o da vila, refor�ando o que em v�rios momentos foi ressaltado, ou seja, a influ�ncia da cultura italiana, a forte presen�a do sentimento religioso, a depend�ncia da f�brica como principal atividade do local.

Em 1950, a popula��o da vila de Gal�polis era calculada em 1.705 habitantes na zona urbana e 3.164 na zona rural. Em 1970, Gal�polis era o oitavo distrito de Caxias e contava com uma popula��o na vila de 2.207 habitantes e na zona rural de 4.525 habitantes, perfazendo um total de 6.832 pessoas. Em 1976, a popula��o da vila era de 2.211 habitantes, sendo que 537 trabalhavam na f�brica[12], e a maioria dessa popula��o dependia do lanif�cio.

Esse dado demonstra que n�o houve crescimento nas taxas da popula��o da vila no per�odo de 1930 a 1970. Isso n�o significa que a ind�stria n�o tenha crescido. Ao contr�rio, a Companhia Lanif�cio S�o Pedro S.A. cresceu qualitativamente, atrav�s do incremento do seu capital, dos seus investimentos e principalmente atrav�s da inova��o tecnol�gica que permitia aumentar a produ��o com um n�mero menor na for�a de trabalho.

As atividades desenvolvidas em torno da f�brica haviam sido instaladas para atender a popula��o do local. Segundo o Censo Econ�mico Municipal de 1932, as atividades comerciais de Gal�polis eram de pequeno porte, apenas para suprir o consumo dos habitantes da vila. A vila possu�a: a�ougues, armaz�ns de secos e molhados, barbearia, botequim, neg�cios de cal�ados, artefatos e malas, ferragens e lou�as, farm�cia, hotel e pens�o[13].

Confrontando com os dados do munic�pio de Caxias do Sul, que apresentavam 450 estabelecimentos comerciais com 486 empregados e um capital de Rs.13.117:325$000, os dados de Gal�polis s�o praticamente inexpressivos, visto que possu�a no total apenas 15 estabelecimentos com 5 empregados[14]. Estes dados mostram que nesse per�odo a atividade econ�mica preponderante de Gal�polis era o lanif�cio, visto que as demais atividades eram insignificantes em confronto ao crescimento do munic�pio. Nenhuma das atividades comerciais citadas desempenhava papel fundamental para a cidade de Caxias, ou para os outros distritos. Eram atividades necess�rias para a manuten��o da vila oper�ria. Outro dado que se pode constatar � que n�o existiam atividades comerciais de vulto, visto que o poder aquisitivo dos oper�rios era baixo. Logo, novos investimentos eram feitos na sede do munic�pio e n�o em Gal�polis. Em 1936, a cria��o da Cooperativa S�o Pedro S.A. afetou o com�rcio local, uma vez que a maioria dos oper�rios utilizava esse com�rcio pelo fato de poder dispor do cr�dito da f�brica e descontar do sal�rio seus gastos mensais.

N�o se pode deixar de observar que a constru��o da Rodovia Federal Get�lio Vargas deveria ter influenciado o crescimento da vila oper�ria, na d�cada de 40. Essa rodovia, que liga o Rio Grande do Sul ao centro do pa�s, prometia no seu tra�ado trazer o progresso por onde passasse. Esperava-se, portanto, com a constru��o dessa estrada federal, uma certa transforma��o na vila oper�ria. Por�m, esse fato n�o chegou a alterar a sua fun��o econ�mica, visto sua proximidade com a cidade de Caxias. Gal�polis era um lugar de passagem, e a sua principal atividade era o lanif�cio. Quem passava pela nova rodovia percebia a estrutura industrial do local.

A pol�tica da vila oper�ria e o paternalismo industrial

A pol�tica social adotada pela Companhia, em todo o seu percurso, demonstrou os mecanismos de controle da for�a de trabalho utilizados pelos propriet�rios da f�brica.

No per�odo considerado de expans�o da vila[15], houve uma maior agrega��o dos habitantes em torno de algumas causas comuns, como a constru��o de uma igreja, a cria��o de um C�rculo de Leitura com biblioteca e sede social; a funda��o de uma cooperativa de consumo, vinculada � f�brica; a escola, a forma��o do sindicato, etc.

As constru��es refletiam a prosperidade econ�mica que o lanif�cio trouxe � vila naquele per�odo. Al�m da quest�o da moradia, a f�brica tinha o controle sob as demais institui��es de que participavam os oper�rios no seu cotidiano.

A pol�tica social foi sendo implantada gradativamente, tendo, na gest�o do gerente Jo�o Laner Spinato, atingido um clima de maior participa��o da f�brica na vida dos oper�rios. Protagonista de uma s�rie de inova��es em Gal�polis desempenhou um papel fundamental na pol�tica administrativa, tanto no que se referia � estrutura da produ��o quanto no controle da for�a de trabalho da Companhia Lanif�cio S�o Pedro S.A., nos 30 anos de ger�ncia da mesma. Com forma��o acad�mica e com profunda convic��o religiosa, influenciou diretamente a pol�tica interna da f�brica e a vida na vila. Como gerente tinha a fun��o central de orientar e controlar os problemas da for�a de trabalho, tendo a dire��o da Companhia lhe delegado todos os poderes para atingir esse fim. Como o lanif�cio situava-se no munic�pio de Caxias do Sul, e a sede da Companhia era na Capital do Estado, era necess�rio um homem de confian�a, de autoridade e de capacidade para a dire��o interna. Observa-se que em nenhum per�odo os propriet�rios habitaram na vila, o que comprova a confian�a depositada pela administra��o nesse gerente.

Entretanto, n�o se pode negar que existam tra�os de domina��o em rela��o a oper�rios que vivem em uma vila oper�ria. No caso em estudo, a domina��o n�o aparecia atrav�s de um controle repressivo, violento e direto. Existia todo um processo de domina��o informal que impunha a aceita��o de uma s�rie de regras e comportamentos, atrav�s das institui��es de que mais freq�entemente os oper�rios participavam, englobando a escola, a cooperativa, a igreja, o sindicato e as mais diversas formas de recrea��o. A f�brica praticamente financiava todas essas atividades, e como conseq��ncia tinha ascend�ncia sobre elas, podendo agenciar as estrat�gias empregadas para o seu dom�nio.

Esse fato gerava um esp�rito de reciprocidade onde a submiss�o, a obedi�ncia, o respeito e o medo eram trocados pela estabilidade no emprego e lugar fixo na vila. O oper�rio ao pagar a taxa irris�ria de seu aluguel, recebia a garantia de mais um m�s de manuten��o do seu grupo familiar. Assim, a d�vida com o patr�o aumentava, e ele valorizava tudo aquilo que lhe era concedido, n�o como um direito decorrente do processo de trabalho, mas como uma troca desigual, na qual ele mesmo se via como um ser inferior sem condi��es de se valorizar.

A assist�ncia religiosa foi um dos elementos de integra��o entre os oper�rios, uma vez que a f�brica providenciou a instala��o de um padre para atendimento espiritual dos oper�rios. A partir do ano de 1924, a vila contava com um padre, com resid�ncia fixa em Gal�polis. Esse p�roco era sustentado por uma mensalidade da f�brica[16], at� ser criada a par�quia. Dessa forma, os oper�rios n�o necessitavam sair da vila para ter atendimento espiritual. A atua��o dos religiosos na vila foi uma constante, devido ao forte sentimento religioso presente em seus habitantes.

Em novembro de 1929, foi fundado o C�rculo de Leitura que, mais tarde, transformou-se no C�rculo Oper�rio Ismael Chaves Barcellos, em homenagem ao Diretor Presidente da Companhia. O C�rculo de Leitura foi criado por um grupo de 13 oper�rios que acreditavam que essa institui��o poderia oferecer � classe oper�ria melhores condi��es de vida, dentro e fora da f�brica. Os fundadores foram Jo�o Laner Spinato, Jos� Canale, Hygino Lunardi, Kurt Glaser, Amp�lio Dal Pozzolo, Theodoro Boese, Ant�nio Filippi, Gi�como Menegoto, Jos� Stragliotto, Batista Canuto, Jo�o Vial, Ant�nio Comerlato e Erich Kahle.

Os princ�pios que regiam a atividade do C�rculo Oper�rio eram baseados na Doutrina e na Moral Crist�, sustentados pelo �c�digo divino e inigual�vel de justi�a, respeito m�tuo, amor e harmonia entre os homens�[17]. O C�rculo Oper�rio de Gal�polis baseava-se nas Enc�clicas Rerum Novarum de Le�o XIII e Quadragesimo Anno de Pio XI e tinha como lema a f�rmula de Toniolo: �O trabalho cada vez mais dominante, a natureza cada vez mais dominada e o capital cada vez mais proporcionado[18].� O C�rculo Oper�rio existia como forma de amenizar os conflitos entre capital e trabalho. Em Gal�polis, a transforma��o do C�rculo de Leitura em C�rculo Oper�rio era proveniente da preocupa��o do p�roco local com a expans�o do movimento sindicalista no Brasil e com a divulga��o de id�ias comunistas[19].

O C�rculo Oper�rio proporcionou aos seus associados, al�m da assist�ncia m�dica, farmac�utica e jur�dica, uma assist�ncia profissional que resultou na organiza��o da Associa��o Profissional de Trabalhadores na Ind�stria de Fia��o e Tecelagem, e mais tarde na cria��o de seu sindicato. Tamb�m estimulou a organiza��o de uma cooperativa e de uma caixa de socorros m�tuos para auxiliar doentes, fam�lia de s�cios falecidos, e ainda tratar de problemas referentes � habita��o.

Essa institui��o social tinha uma proposta de lazer que abrangia uma s�rie de jogos com a finalidade de entreter e divertir seus associados. Entre eles o jogo de bochas, pingue-pongue, jogos de mesa e o futebol. O C�rculo Oper�rio ainda contava com uma biblioteca, um restaurante, um sal�o de festas onde ocorriam os casamentos e as festas da vila. A grande vantagem dos s�cios em rela��o a esses servi�os era que a f�brica os subvencionava, facilitando o acesso de todos. Esse c�rculo, lembrado pela maioria dos entrevistados, pelas oportunidades recreativas que propiciou � popula��o da vila, foi por muitos anos ponto de reuni�o e de discuss�o de uma s�rie de quest�es concernentes ao funcionamento da localidade. Sua dinamicidade come�a a se enfraquecer � medida que � organizada na vila a "Sociedade Recreativa Amigos de Gal�polis" em 1962. Essa sociedade atuou sem o compromisso e o financiamento da f�brica, pois tinha o objetivo espec�fico de agregar os habitantes do local, e reagir contra o monop�lio criado pelo lanif�cio em torno das principais atividades sociais.

O C�rculo propiciou tamb�m a cria��o da "Caixa de Socorros M�tuos", que se consolidou como mais uma obra de assist�ncia social gerenciada pela f�brica. Essa Caixa obedecia a um regulamento simples, pr�tico e eficiente, que consistia na forma��o de um pec�lio ou fundo de Caixa, onde os oper�rios contribu�am com pequenas mensalidades calculadas proporcionalmente aos seus sal�rios e mais a contribui��o de 1$000 r�is mensais para cada pessoa da fam�lia a quem desejavam proporcionar os benef�cios da mesma. Al�m dessas mensalidades, contava com os donativos peri�dicos da administra��o da f�brica, que subvencionava o atendimento m�dico. Atrav�s dessa Caixa, a f�brica tinha condi��es de cobrir os gastos de cerca de mil pessoas, proporcionando-lhes assist�ncia m�dica, hospitalar, interven��es cir�rgicas, exames cl�nicos e consultas especializadas[20].

Outro dado importante de destaque, como mecanismo institucional para a manuten��o e sobreviv�ncia da for�a de trabalho, foi a cria��o de uma cooperativa organizada inicialmente por sugest�o do Gerente e do Guarda-Livros da f�brica Pery Paternoster. Com um capital inicial de 30 mil contos de r�is e com 279 associados, deu-se in�cio � Cooperativa de Consumo S�o Pedro Ltda[21]. Essa atividade nascia com o intuito de melhorar as condi��es de vida dos oper�rios do terceiro distrito de Caxias do Sul, sem inten��es de lucro, eliminando o papel do intermedi�rio comerciante, devido � localiza��o da vila estar distante da sede urbana de Caxias. Essa empresa comercial barateava os g�neros de primeira necessidade e garantia aos oper�rios, alimenta��o b�sica a pre�o de custo, com a possibilidade de pagamento a cr�dito. Os estatutos foram organizados por Jo�o Laner Spinato e Pery Paternoster, sendo o primeiro o seu primeiro-presidente, o segundo seu secret�rio e tendo como gerente da mesma� Generino Nissola. Este, mais tarde, foi substitu�do por Beno Schneider, Settimo Marchioro, Nilo Forner, Luiz Antonio Felippi. Os sucessores do presidente foram Pery Paternoster, Heinz Loges, Arlindo Vignochi, Francisco Jo�o Kintschener, Aquilino Rossato Filippi e Jo�o Jos� Moschen.

A preocupa��o com a vila, por parte de quem a gerenciava, manifestava-se em todas as esferas: da quest�o educativa, religiosa, sanit�ria, social, � recreativa, justificada sempre com o fim de suprir as necessidades b�sicas da comunidade oper�ria, como se pode observar no tipo de atividades desenvolvidas pela f�brica.

Al�m das atividades ressaltadas neste estudo, duas iniciativas merecem especial considera��o: a funda��o de duas escolas para atendimento aos filhos dos oper�rios[22] e a cria��o do Sindicato distrital.

l) A primeira diz respeito � import�ncia que o lanif�cio atribuiu � escola, como elemento de forma��o da for�a de trabalho. Ap�s a tentativa de cursos noturnos aos oper�rios e a participa��o dos filhos dos mesmos, em escolas estaduais, no final de 1933, o gerente da f�brica assinou um contrato com os padres Josefinos para a instala��o de um col�gio religioso que atendesse aos interesses da popula��o de Gal�polis. Essa escola chamada "Col�gio Chaves Irm�os", funcionou de 1934 a 1937, sob a dire��o da ordem religiosa "Pia Sociedade de S�o Jos�", com atendimento exclusivo de crian�as do sexo masculino. No mesmo ano, a f�brica fundou o Col�gio "Manoela Chaves", coordenado pelas irm�s do "Imaculado Cora��o de Maria", � clientela do sexo feminino, sendo essa escola totalmente destru�da de um inc�ndio em julho de 1937. No in�cio daquele ano, houve um s�rio desentendimento entre um dos padres Josefinos com o gerente da f�brica, resultando no fechamento da escola e na retirada dos padres da vila.

Devido a esse fato, as religiosas do "Imaculado Cora��o de Maria" passaram a atender os alunos de ambas as escolas, devido � solicita��o dos propriet�rios da f�brica[23]. Esta mantinha estreitos la�os com a escola, uma vez que a financiava e tinha interesse em oferecer alguns servi�os aos seus oper�rios. Entre esses servi�os estavam inclu�dos o funcionamento de um jardim-da-inf�ncia que aceitava crian�as dos 3 aos 7 anos, possibilitando � for�a de trabalho feminina ocupar-se em turno completo na f�brica e a cursos de aperfei�oamento de corte e costura, cursos de datilografia, etc. Essa escola permaneceu em Gal�polis por quase 40 anos, sempre a servi�o de sua comunidade e de sua mantenedora. O patrim�nio desse col�gio foi vendido ao governo estadual, sendo instalada nesse pr�dio uma escola estadual de primeiro grau.

2) A segunda iniciativa foi a forma��o de um sindicato que controlasse a for�a de trabalho e agisse dentro dos limites da Justi�a do Trabalho. O Sindicato dos Mestres, Contramestres e Trabalhadores na Ind�stria e Tecelagem de Gal�polis foi criado pelos mesmos oper�rios que haviam se mobilizado para cria��o do C�rculo Oper�rio Ismael Chaves Barcellos e da Associa��o Profissional de Trabalhadores na Ind�stria de Fia��o e Tecelagem de Gal�polis.

Segundo a Carta Constitucional de 1937[24], o sindicato deveria ser reconhecido pelo Estado para poder atuar como representante legal da categoria de produ��o. Na tentativa de mobilizar os sindicatos, Get�lio Vargas havia promovido uma campanha de sindicaliza��o massiva no pa�s. Isso atrav�s da cria��o do imposto sindical que deveria ser pago compulsoriamente por todo empregado, sindicalizado ou n�o, no valor de um dia de trabalho[25]. Essa medida trouxe como efeito um aumento no n�mero de sindicalizados como tamb�m um n�mero crescente de sindicatos. Os oper�rios procuravam formar seus sindicatos para poder usufruir de seus direitos.

Em fevereiro de 1942, os oper�rios de Gal�polis recebem a carta de reconhecimento do seu sindicato, sendo esse o sindicato distrital mais antigo do pa�s[26]. A partir dessa data, inicia-se um movimento dentro da vila para sindicalizar os oper�rios. Infelizmente, essa institui��o assumiu um car�ter assistencialista, como grande parte de sindicatos no pa�s. A pol�tica de Get�lio Vargas havia atingido um de seus objetivos que era regular e conhecer o mercado de trabalho, sendo o sindicato um dos instrumentos jur�dicos para tal fim.

Dessa maneira, essa entidade come�a uma fase de trabalho junto aos seus associados, partindo do princ�pio da necessidade de aplica��o da lei. A esse respeito, explica detalhadamente aos seus participantes a organiza��o das leis de trabalho[27], os direitos e os deveres de cada trabalhador. Em 1945, houve pela primeira vez a discuss�o do sindicato com a f�brica, referente �s leis de f�rias e � demiss�o de empregados, com base nos estatutos da entidade, a qual solicitava prazo para a defesa dos oper�rios demitidos. A partir dessa data, o sindicato assume um papel representativo dos interesses da categoria nas quest�es salariais e nas quest�es concernentes �s condi��es de trabalho[28], institu�das pelas leis trabalhistas. As negocia��es dos sal�rios, at� ent�o estabelecidas pela f�brica e mais tarde pelo governo, passam a ser discutidas tamb�m pelos oper�rios, desencadeando a participa��o ativa dos oper�rios aquele sindicato. No ano de 1948, ocorreu o primeiro diss�dio coletivo e, nesse momento, a f�brica concedeu um aumento de 35% sobre os sal�rios vigentes sob uma s�rie de condi��es registradas na Justi�a do Trabalho. A causa desse descontentamento permanece, visto que no final da d�cada de 40 o pa�s sofria as conseq��ncias do liberalismo pol�tico do Presidente Dutra, e os trabalhadores reclamavam de forma generalizada, em todo o pa�s, dos �ndices congelados de sal�rios de toda a sua gest�o governamental.

Como existia uma acentuada dist�ncia entre os sal�rios dos trabalhadores e o alto custo de vida, surge uma proposta de greve que n�o � levada a frente, uma vez que o �ndice do sal�rio � novamente negociado. Esses dados[29] permitem acompanhar os movimentos dos oper�rios, suas reivindica��es e suas aspira��es, constatando que as exig�ncias dos oper�rios giravam sempre em torno das quest�es salariais.

Dessa maneira, a an�lise do papel do sindicato dos oper�rios do lanif�cio permite identificar a influ�ncia da f�brica nas rela��es de produ��o e as repercuss�es dessas na vila oper�ria. A cria��o do sindicato reflete de maneira parcial a desagrega��o da forma de domina��o pr�pria � industrializa��o feita atrav�s da vila oper�ria, onde a imobiliza��o da for�a de trabalho pela moradia foi um forte elemento de manuten��o do status quo de seus indiv�duos. Parcial porque, mesmo atrav�s da entidade que os representava, n�o conseguiam liberar-se da bagagem que traziam em si mesmos, para lutar pelos interesses de classe. N�o se percebe uma solidariedade de classe e sim apenas uma solidariedade comunal, produzida pela vida em comum e pelas circunst�ncias econ�micas id�nticas.

A an�lise da vila oper�ria demonstra alguns mecanismos utilizados para o recrutamento e a reten��o da for�a de trabalho, como os meios de disciplinar as tarefas exercidas por parte daqueles que detinham o poder econ�mico[30]. As rela��es de domina��o e subordina��o no interno da f�brica refletiam o car�ter de autoritarismo existente e a forma de como a solidariedade entre os oper�rios se mantinha pelo processo de domina��o. Entretanto, os oper�rios se sentiam parte da f�brica, como se fossem tamb�m propriedade da mesma. Esse sentimento presente na fam�lia oper�ria impedia uma maior politiza��o por parte da classe, como se reivindicar direitos referentes � condi��o oper�ria significasse um ato de deslealdade ao patr�o. Esse sentimento impedia, ao menos em tese, a elabora��o de uma consci�ncia de classe. A ambig�idade nas rela��es de trabalho tanto na f�brica como na vila fortalecia esse sentimento, impedindo que ocorresse a separa��o da esfera fabril da dom�stica. Por outro lado, as institui��es criadas na vila e mantidas pela f�brica, fortaleceram a absor��o dos valores burgueses como modelo exemplar de comportamento, postura e estilo de vida.

Portanto, controlar a vila e ao mesmo tempo, satisfazer o conjunto dos trabalhadores n�o era uma tarefa f�cil. A Companhia sempre contou com gerentes que aceitavam essa tarefa, transformando-a num projeto de melhorias sociais. Para Gal�polis, essas medidas sociais implantadas permitiam ao oper�rio sentir-se parte ativa da vila. Construir a igreja, colaborar com o c�rculo oper�rio, participar do sindicato, ter assist�ncia m�dica e farmac�utica, poder mandar os filhos diariamente � escola, representavam uma vida de conquistas atingidas plenamente, organizadas por eles e financiadas tamb�m pelo trabalho de cada um. Por�m, esses fatos levaram a reproduzir uma popula��o oper�ria, presa a essas conquistas passadas. Gal�polis n�o cresceu economicamente como poderia ter crescido, pois os investimentos foram feitos fora da vila, servindo apenas de local para a reprodu��o da sua for�a de trabalho.

A participa��o do sindicato de Gal�polis mostra fases de avan�os e recuos, muito mais determinados pelas lutas sociais do movimento oper�rio brasileiro, do que pela atua��o direta e da organiza��o da classe oper�ria do lanif�cio.

Segundo alguns autores, a ind�stria brasileira apresentava uma grande dificuldade para monopoliza��o do controle da for�a de trabalho. O que aconteceu em Gal�polis solucionava essa problem�tica, atrav�s da manuten��o dos grupos iniciais, com suas respectivas fam�lias e a sucess�o nas gera��es seguintes, mantendo a vila como sin�nimo de reprodu��o de for�a de trabalho. A aceita��o do processo de domina��o foi reproduzida na consci�ncia coletiva. A for�a de trabalho, oriunda na sua maioria das fam�lias da regi�o colonial, foi a grande mantenedora das rela��es sociais da f�brica.

Refer�ncias bibliogr�ficas

1. TEIXEIRA, Palmira Petratti. A f�brica do sonho: trajet�ria do industrial Jorge Street. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1990, p.70.

2. Livro-Tombo da Par�quia de Gal�polis, 1936, p. 1.

3. FAGUNDES, Ligia Ketzer et al. Mem�ria da ind�stria ga�cha, das origens a 1930. Porto Alegre: Universidade /UFRGS, FEE, 1987. p. 195.

4. Livro de Atas das Assembl�ias de Constitui��o da Companhia Lanif�cio S�o Pedro S.A., L.I., Porto Alegre, p.14. Livro de Atas das Assembl�ias de Constitui��o da Companhia Lanif�cio S�o Pedro S.A., L.I., Porto Alegre, p.14.

5. Lanif�cio S�o Pedro. Economia do Rio Grande do Sul. Revista Paulista de Ind�stria, n.41, ano V, S�o Paulo, dezembro 1955.

6. LOPES, J. S.; SILVA, L. A. Machado da. Estrat�gias de trabalho, formas de domina��o na produ��o e subordina��o dom�stica de trabalhadores urbanos. In: Mudan�a social no nordeste: a reprodu��o da subordina��o. Paz e Terra, Rio de Janeiro: 1979. p. 15.

7. "Revista Paulista de Ind�stria", op.cit., p. 2.

8. LOPES, Jos� Sergio. A tecelagem dos conflitos de classe na �Cidade das Chamin�s�. S�o Paulo: Marco Zero e Editora Universidade de Bras�lia, MCT/CNPq, 1988. p. 164.

9. Depoimento dos entrevistados.

10. Depoimento de um ex-oper�rio, Gal�polis, 1989.

11. Censo Municipal, 1932, op. cit.

12. Relat�rio BRDE. Arquivo da Companhia Lanif�cio S�o Pedro S.A., Gal�polis, 1978.

13. Censo Municipal de Caxias do Sul, Censo Econ�mico, 1932.

14. Ibid.

15. VALVERDE, Orlando. Excurs�o � Regi�o Colonial Antiga do Rio Grande do Sul.In: �lbum Comemorativo do 75. Anivers�rio da Coloniza��o Italiana no Rio Grande do Sul. Porto Alegre, Editora Globo, 1950. p. 274. Op. cit.,p. 274.

16. Livro-Tombo da Par�quia de Gal�polis, 1936, p. 2.

17. Estatutos do C�rculo Oper�rio Ismael Chaves Barcellos, Gal�polis, 1936.

18. Ibid.

19. Livro-Tombo da Par�quia de Gal�polis, 1936, p. 3.

20.Jornal Pioneiro, Caxias do Sul, 1934.

21. Dados fornecidos em entrevista por Valter Marchioro e Luiz Felippi, Gal�polis, 1989.

22. Depoimento de um ex-oper�rio, Gal�polis, 1989.

23. Livro-Tombo de Gal�polis, 1937, p. 7.

24. VIANA, Luiz Werneck. Liberalismo e Sindicato no Brasil. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1976, p. 220-221.

25. Ibid., p. 232.

26. Registros do Sindicato dos Mestres, Contramestres e Trabalhadores da Ind�stria de Fia��o e Tecelagem de Gal�polis, Gal�polis 1942.

27. Livros de Registro do Sindicato, op. cit.,� Gal�polis, 1945.

28. Ibid.

29. Ibid.

30. Livro de Atas do Sindicato de Mestres, Contramestres e Trabalhadores de Fia��o e Tecelagem de Gal�polis, Livro 2, 1950, p. 28.

� Copyright Vania Beatriz Merlotti Her�dia , 2003
� Copyright Scripta Nova, 2003

Qual foi a importância dos imigrantes para a organização do movimento operário no Brasil?

Foram responsáveis por formar associações de trabalhadores que resultariam na formação dos futuros sindicatos. Estas associações foram ganhando força e destaque até que surgiram as primeiras greves no Brasil, dando início ao movimento operário no país.

Como os imigrantes formaram a classe operária brasileira?

A origem do movimento operário no Brasil se deu, sobretudo, por influência dos imigrantes estrangeiros que vieram para o país, no final do século XIX, para trabalhar nas lavouras de café. Esses imigrantes eram prioritariamente italianos, alemães, japoneses, poloneses, entre outros.

Quais eram as principais formas de organização do operariado brasileiro?

Os primeiros sindicatos foram formados e, concomitantemente, os trabalhadores foram desenvolvendo uma conscientização política e de classe, organizando greves e manifestações de caráter principalmente reivindicatório. O socialismo exerceu importante papel na articulação dos operários.

Quais eram as condições dos trabalhadores e trabalhadoras imigrantes no Brasil no início do século XX?

As longas jornadas de trabalho e a precariedade das instalações de trabalho revelavam o completo desamparo ao qual os operários se submetiam. Ao mesmo tempo, podemos assinalar que, mediante a descrição física dos trabalhadores, deduzimos que os mesmos recebiam baixos salários pela função exercida.