O assassinato de George Floyd em uma ação policial em Minneapolis detonou uma vigorosa onda de protestos nas ruas dos Estados Unidos e colocou uma pergunta fundamental sobre a mesa de ativistas e cientistas sociais brasileiros: por que aqui, onde a brutalidade sofrida pelo povo preto é muito maior, as mobilizações contra o racismo não têm a mesma intensidade
? Pesquisadores e ativistas da UFRJ explicam que a resposta tem raízes na história da escravidão de cada um dos países, atravessa a formação cultural e ideológica de americanos e brasileiros e perpassa a estrutura do movimento negro de lá e daqui. “Nos EUA, houve um projeto de emancipação através do capitalismo, fortalecido pelas comunidades protestantes negras”, explica Fernanda Barros Santos, historiadora e professora de Ciência Política do Nepp-DH. A docente lembra que os dois países experimentaram a escravidão, mas lá a articulação da comunidade negra com um projeto de ascensão social começou antes. “A formação dessas comunidades permitiu que os negros tivessem acesso à educação, sobretudo nos estados do norte, e até construíssem universidades, como Howard”. Já no Brasil, a abolição foi seguida de um projeto de abertura para a chegada de imigrantes europeus, que eram tratados como mão de obra mais qualificada que os trabalhadores de origem africana – embora não fossem. A segregação também teve seu papel na construção da consciência negra dos norte-americanos. “No século XIX, o racismo científico era muito forte nos EUA, e foi a base de uma classificação hierárquica das raças”, conta a professora. Lá valia a regra de “uma gota de sangue” – qualquer pessoa com ascendência negra seria considerada negra, modelo que embasou as leis segregacionistas que perduraram até 1965. Já no Brasil vigorou o mito de que a miscigenação diminuiria os conflitos raciais. Essa lógica funda uma falsa ideia de democracia racial, “como se a mistura biológica e ideológica acabasse com a ideia de raça, mas na verdade o que houve foi um massacre cultural”, interpreta Fernanda Barros Santos. “O antagonismo é muito bem desenhado nos EUA, não permite um racismo velado, mas um conflito aberto”. MOVIMENTO NEGRO ONDA CHEGA AO BRASIL PRETOS E BRANCOS |