Qual a relação entre liberdade e responsabilidade para a filosofia?

«Do que se trata é de levarmos a sério a liberdade, ou seja, de sermos responsáveis. O que há de sério na liberdade é que ela tem efeitos indubitáveis, que não se podem apagar quando isso nos convém, uma vez que tenham sido produzidos. Sou livre de comer ou não comer o pastel que tenho à minha frente; mas, depois de o ter comido, já não sou livre de o ter à minha frente ou não. Dou-te outro exemplo, desta vez de Aristóteles (já sabes, esse velho grego que falava do barco e da tempestade): se tiver uma pedra na mão, sou livre de ficar com ela ou de a deitar fora, mas se a atirar para longe já não poderei ordenar-lhe que volte para que eu continue com ela na mão. O que há de sério na liberdade é que cada acto livre que faço limita as minhas possibilidades quando escolho realizar uma delas. E não vale fazer batota e esperar para ver se o resultado é bom ou mau, antes de assumir se sou ou não responsável por ele. Desse modo, talvez seja possível enganar um observador exterior, como pretende a criança que diz “não fui eu!”, mas a nós próprios nunca nos podemos enganar por completo.

De maneira que aquilo a que chamamos “remorso” não é mais do que o descontentamento que sentimos connosco quando empregámos mal a nossa liberdade, quer dizer, quando a utilizámos em contradição com o que deveras queremos como seres livres, para o bem e para o mal: assumirmos as consequências do que fizemos, emendar o mal que possamos emendar e aproveitarmos o bem ao máximo. Ao contrário da criança malcriada e cobarde, o indivíduo responsável está sempre pronto a responder pelos seus actos: “Sim, fui eu”. O mundo que nos rodeia, se reparares, está cheio de ocasiões que podem servir ao sujeito para se desfazer da sua responsabilidade. A culpa do mal que sucede parece ser das circunstâncias, da sociedade em que vivemos, do sistema capitalista, do carácter que tenho (sou assim!), de não ter sido bem educado (ou me terem mimado em excesso), dos anúncios da televisão, das tentações que se oferecem nos escaparates, dos exemplos irresistíveis e perniciosos... Acabo de empregar a palavra-chave destas justificações: irresistível. Todos os que querem demitir-se das suas responsabilidades acreditam no irresistível, naquilo que subjuga sem remédio, seja a propaganda, a droga, o apetite, o suborno, a ameaça, a maneira de ser... qualquer coisa serve.» 

Savater, Fernando, Ética para um Jovem, Lisboa, Editorial Presença, 1997, p. 75.


«A noção de responsabilidade parece-me ser uma noção ética para retomar e voltar a desenvolver, insistindo [...] num aspecto [...]: o da dívida cultural que cada indivíduo contrai ao vir ao mundo e ao viver. Ninguém existe, como indivíduo e como pessoa, sem ter uma imensa dívida para com a sua família, o seu ambiente, o seu meio, a sua sociedade, os seus avós, o seu património, os seus antepassados, em suma para com todos aqueles que o precederam. Esta ideia de dívida, esta ideia de que somos devedores, [...] é uma ideia que deve ser, cada vez mais, desenvolvida para contrariar a onda de individualismo. Falamos frequentemente do indivíduo, da pessoa como se ela estivesse absolutamente só, como se ela não fosse um ser sociológico. O discurso ético deve considerar a pessoa na sua totalidade humana e moral, como indivíduo e como ser social, como responsável pela sua vida e como devedora de uma herança imemorial.» 

Rocher, G., “Le Défi Éthique dans un Context Social et Culturel en Mutation, in Philosopher n.º 16, 1994, pp. 14-15.

Relação entre Liberdade e Responsabilidade

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Relação entre Liberdade e Responsabilidade

Para se compreender a relação entre a liberdade e a responsabilidade é necessário, primeiro que tudo, conhecer o que significam estas liberdades e a sua integração no contexto filosófico.
A palavra liberdade tem uma origem latina (libertas) e significa independência. Etimologicamente, a palavra responsabilidade também vem do latim (respondere) e significa ser capaz de comprometer-se.
No senso comum, liberdade é uma palavra que pode ser definida em variados sentidos (liberdade física, liberdade civil, liberdade de expressão…). Filosoficamente, a liberdade, e mais concretamente a liberdade moral, diz respeito a uma capacidade humana para escolher ou decidir racionalmente quais os actos a praticar e praticá-los sem coacções extremas. É de carácter racional, pois os homens devem pensar nas causas e consequências dos seus actos e na sua forma e conteúdo. Esta liberdade não é absoluta, é condicionada e situada. Condicionada porque intervêm no seu exercício múltiplas condicionantes (físicas, psicológicas…). Situada porque se realiza dentro da circunstância, mundo, sociedade em que vivemos. Todas as nossas acções são fruto das circunstâncias e das nossas próprias características. É também uma liberdade solidária, porque cada um de nós só é livre com os outros, visto que não vivemos sozinhos no mundo. A liberdade humana (pode chamar-se assim porque é de carácter racional e, logo, exclusiva dos homens) reside em se poder dizer sim ou não, quero ou não quero. Nada nos obriga a ter apenas uma alternativa. O exercício da liberdade exige reflexão e, logo, tempo. Por isso, a reacção é diferente da acção, visto que a primeira é imediata face a um estímulo.
A responsabilidade moral é, por sua vez, uma capacidade, e ao mesmo tempo uma obrigação moral, de assumirmos os nossos actos. É reconhecermo-nos nos nossos actos, compreender que são eles que nos constroem e moldam como pessoas. A responsabilidade implica que sejamos responsáveis

O que é liberdade com responsabilidade na filosofia?

A liberdade e a responsabilidade estão fortemente ligadas, na medida em que só somos realmente livres se formos responsáveis e só podemos ser responsáveis se formos livres. A responsabilidade implica constantemente escolha e decisão racional, o que vai de encontro à própria definição de liberdade.

Qual a relação da liberdade e responsabilidade?

A relação que existe entre liberdade e responsabilidade moral é uma relação de complementaridade, em que estão ligados entre si. Sendo assim, pode-se questionar sobre os atos humanos, acerca de sua moralidade e sobre a responsabilidade do homem por seus atos.

Qual é a relação entre ética liberdade e responsabilidade?

Quando falamos de virtude ética, falamos de uma qualidade essencial: a prática constante do bem. O bem, nesse sentido, pode ser entendido como ter responsabilidade pelas ações livres. Quando a liberdade é usada pelo homem sem essa responsabilidade moral, falamos em vício.

Qual é a relação entre liberdade responsabilidade e coragem?

A liberdade é o poder de escolher, ter autonomia e espontaneidade, enquanto a responsabilidade é a atitude do indivíduo para responder por essas ações que escolhe livremente e nisso você cria coragem diante dos aspectos e das dificuldades.