Por quê tanto jogo de beisebol hoje 27 de maio

[tw-divider]Por Thales Barcellos[/tw-divider]

Outro dia estava circulando nas mídias sociais um vídeo da Discovery sobre o processo de confecção em larga escala das bolas de beisebol utilizadas na MLB, desde a formação do núcleo até a costura e o carimbo do comissário, misturando partes bastante artesanais com outras totalmente automatizadas.

Para aqueles que não conhecem ou não viram o processo, procure por “how baseballs are made” no YouTube que você achará o vídeo que ilustra a criação das pelotas. Resumindo, é criado um núcleo de borracha e cortiça, que é envolvido em uma cola especial, depois recebendo várias camadas de linha de diferentes materiais. Este processo ajuda a bolinha a recuperar o formato após a deformação da rebatida. Essa bola é novamente banhada com a cola e, em seguida, duas tiras de couro em um formato que lembra o número 8 envolvem a bola e são costuradas manualmente. Depois a bola passa por um “apertamento” dos nós e achatamento da costura e, ao final do processo, recebem o carimbo da marca. Voilá, temos uma bolinha!

Mesmo com essa técnica bastante aprimorada, ao tentarmos comprar bolas, iremos nos deparar com uma infinidade de códigos, marcas e tipos de bolas que deixará qualquer um coçando a cabeça. Como podem haver tantos tipos de bolas? Será que o processo de criação é diferente? Como que os jogadores se adaptam a tantos tipos de bola?

Couro x Borracha

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Diferente daquela infinidade de camadas de uma bola de couro, a de borracha é bem “simples”. Foto: Yutop[/caption]

Apesar do processo de criação das bolas ser similar entre as diversas fábricas no mundo, pelo caráter artesanal e até mesmo pela cultura e economia do local onde elas são feitas o resultado pode ser muito diferente. Uma diferença crucial é o uso de bolas de borracha — diversas ligas infantis, especialmente as orientais, usam bolas totalmente feitas de borracha. Há quem diga que ela causa menos lesões e seja mais barata, com maior durabilidade.

Aqui no Brasil, a bola de borracha é adotada nas categorias oficiais Pré-Infantil e Intantil, ou seja, de 8 a 12 anos. Quando o jogador chega na categoria Pré-Júnior (a partir dos 13 anos), ele troca para a bola de couro oficial, precisando adaptar a forma de arremessar. Por esta razão, no Brasil e em algumas ligas internacionais há um princípio de discussão sobre esta questão.

A questão é mais complexa que a apenas a adaptação: ela passa pela saúde dos jovens atletas. Ainda não há consenso sobre como esta mudança afeta a longevidade ou o índice de lesões dos jogadores, mas há indícios que apontam que esta troca faz com que os jogadores tentem compensar a dificuldade de adaptação usando a força, afetando sua mecânica e, consequentemente, gerando lesões. Por isso as federações que usam bolas de borracha têm adotado a cautela antes de tomar qualquer decisão sobre a troca de bolas.

A falta de dados é o motivo principal por não haver uma decisão final sobre o assunto. Por ser um assunto recente, há poucos dados relevantes disponíveis para embasar uma decisão. Vale lembrar que nos Estados Unidos, país com maior número de praticantes de beisebol, a bola de couro é adotada desde cedo, o que elimina uma boa amostra para a questão.

Sintético, costura, peso e outras diferenças para dificultar ainda mais a sua vida

Há outras diferenças sensíveis nas diversas bolas disponíveis no mercado. Por exemplo, o couro. Até 1974, as bolas oficiais na Major League Baseball eram feitas com couro de cavalo. Por razões econômicas, o couro de vaca foi oficializado. Ainda assim, há vacas e vacas, bolas e bolas.

A origem e o tratamento que se dá ao couro influenciam muito na qualidade (preço) e durabilidade que as bolinhas terão, afetando basicamente a vida útil. Há também bolas feitas de couro sintético, mais baratas, mas que não são usadas em ligas profissionais (até onde o caro autor aqui saiba).

As bolas sintéticas geralmente tem uma pegada mais difícil e não absorvem tanta umidade, deixando-as mais lisas. Tem muito arremessador amador que evita ao máximo o uso destas bolas pela dificuldade em controla-las. Entretanto, elas têm seu valor, pois são mais fáceis de limpar (o lado bom de não absorver tanta umidade) e tem o custo de produção mais vantajoso. Ainda, se um dia o beisebol pensar em sustentabilidade, talvez vejamos um aumento da tecnologia do couro sintético para se aproximar das bolas de couro natural ainda maior.

A costura também apresenta particularidades. As bolas geralmente apresentam a costura “achatada”, seguindo os padrões das ligas profissionais. Entretanto, é possível comprar costuras altas, “levantadas”. Estas bolas são úteis para ensinar e treinar — A costura é o principal motivo pelo qual a bola de beisebol faz efeito por oferecerem resistência ao ar. Quanto mais alta a costura, mais efeito ela terá.

O peso das bolas varia bastante e o tamanho da circunferência também é ligeiramente diferente de acordo com a faixa etária a que se destinam. Por isso, vemos bolas que são designadas a categorias infantis e colegiais. Elas são menores e mais leves do que as profissionais, embora sua composição seja similar.

Em razão desta grande variedade de tipos de bolas, as ligas profissionais estipulam padrões próprios para as bolas que serão usadas ao longo dos campeonatos. E quanto mais poderosa é a liga, mais específicas serão estes padrões para as bolas.

A bola da vez: MLB

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Alguns dos tipos de bolas usados ao longo das décadas na história das Grandes Ligas[/caption]

Ouso aqui dizer que as base-bolas são definidoras da qualidade do jogo — use uma bolinha ruim, muito irregular ou muito seca e você terá uma partida em que os arremessares lutarão para arremessar QUALQUER COISA na zona de strike. Use uma bolinha “das boas” e o jogo ficará muito mais interessante e disputado.

É por isso que na MLB vemos tanta troca de bolas. Por jogo, cerca de 80 bolas são preparadas para o jogo. É comum vermos o arremessador ou o receptor pedirem para trocar a bola de jogo, especialmente após uma rebatida — a menor deformidade já afeta o jogo do arremessador.

O estado da bola é muito importante e fiscalizado de perto. Há uma busca constante por sua padronização. Um bom exemplo foi a instalação de um umedecedor em 2002 no estádio do Colorado Rockies na tentativa de suavizar os efeitos do ar rarefeito da região.

Antes dos jogos começarem, os árbitros são responsáveis por fiscalizar cada bola que será usada. Inclusive (está na regra!) eles passam uma espécie de lama nas bolas, que ajudam a ter uma pegada mais firme. Que lama é essa? Ninguém sabe direito, é um segredo de estado (ou seria de liga?) e a empresa que coleta esta lama guarda sua localização a sete chaves desde que começou a ser usada, em 1938. Na década de 50, todos os times já estavam usando a gosma, que é tida como a melhor lama para o beisebol, comparada a um “pudim espesso de chocolate” — eca.

Antes dessa lama, os arremessadores tinham que ser criativos para melhorar a aderência da bola: protetor solar, graxa, cuspe, vaselina, lama… Nem sempre elas tinham a função de melhorar a aderência e, consequentemente o controle — criando imperfeições na superfície da bola (lembra daquele papo das costuras), o efeito que ela faz aumenta, e a bola fica mais difícil de ser atingida.

Quem assiste o beisebol hoje conhece a provavelmente Knuckleball, um arremesso que tira a rotação da bola e, por isso, tem um movimento imprevisível. Imagine agora este movimento irregular sendo arremessado como uma bola rápida. Receita para o perigo, concordam?

A MLB acabou banindo a spitball em 1920. Ou seja, proibiu que arremessadores (ou qualquer outra pessoa) modifiquem a bola, seja acrescentando algo à sua superfície ou tirando (mordendo, raspando). Desde então, virou um jogo de gato e rato. Volta e meia um arremessador é visto com substancias estranhas no braço, um brilho estranho na luva, um cabelo notavelmente gosmento… raramente ocorre alguma coisa, mas nos últimos anos vimos alguns arremessadores sendo suspensos por conta disto (Will Smith e Brian Matusz este ano, Michael Pineda em 2014).

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A única coisa permitida na MLB: lama de New Jersey, essencial na vida da bola. (Foto: BBC)[/caption]

Tanakão da massa x Tanaka-san

Essa diferença de bolas também afeta jogadores que trocam de país para jogar, especialmente falando de arremessadores. Quando temos uma seleção formada para disputar campeonatos internacionais, uma das primeiras providências é ver qual será a bola oficial da competição para começar a usá-las durante o treino, dando tempo para acostumar com elas.

Agora, pense em um monstro como o Masahiro Tanaka. Após seu primeiro ano na MLB, esse sujeito fecha o ano com 2.77 de ERA (média de corridas merecidas por 9 entradas) em 20 jogos disputados, 136.1 entradas, com 141 strikeouts contra 21 walks. Parece que ele não está nem aí para a bolinha, certo?

E se eu te disser que no NPB (Liga Profissional do Japão), este mito teve ERA de 1.27 em 2011 e 2013 (2012 foi lixão, só 1.87 de ERA), acima de 200 entradas nestes 2 anos? “Ah mas mas mas a NPB tem menos corrida, os caras são mais fracos mimimi” — MEU CARO, estamos falando a 2ª maior liga profissional de beisebol do mundo. Pode não ter o mesmo nível que a MLB, mas os estatísticos do esporte mostram que a diferença é pouca — A NPB estaria entre a MLB e a AAA em termos técnicos.

O Tanakão da massa tem um repertório de arremessos muito poderosos. Sua splitter — bola que tem uma queda abrupta logo antes de chegar na home plate — é devastadora na MLB. Mas se compararmos com vídeos de suas performances no Japão, veremos o mesmo arremesso com um efeito ainda maior.

A explicação disso é a bola. As japonesas, que foram padronizadas apenas recentemente, são ligeiramente menores e mais leves, tem uma pegada mais fácil. Com isso, o arremessador tem mais controle e consegue imprimir mais efeito na bola se compararmos com as usadas na MLB, pois é possível aumentar o número de rotações da bola.

A mesma coisa acontece com sua 2-seam (bola rápida com pegada em duas costuras, que corta para o lado do arremessador), sendo possível notar um efeito menor em seus arremessos na MLB que quando comparado à NPB.

Vemos aí um efeito prático da diferença de bolas em duas ligas profissionais e como isto pode afetar o estilo de jogo de um jogador ou mesmo da liga. Os arremessadores japoneses são conhecidos por disporem de um arsenal de bolas de efeito devastadoras, enquanto os americanos e caribenhos, acostumados com bolas mais pesadas, são famosos pelas bolas rápidas e potentes.

No jogo das bases e da bola, é inegável a influência da pelota no jogo. Mais do que apenas um objeto qualquer a ser arremessado e rebatido, a bolinha define as características da partida. Suas particularidades afetam tanto os defensores quanto os atacantes.

É por isso que a escolha da bola de jogo é uma parte importante para qualquer liga e jogador. Sua padronização garante que a performance de todos seja mais estável e a comparação entre os jogadores seja mais justa.