Quais os efeitos do exercício físico no longo prazo em relação ao sistema imune?

EFEITOS DO CONDICIONAMENTO FÍSICO SOBRE A IMUNOSSENESCÊNCIA

Resumo

 Introdução: O processo de envelhecimento é um fenômeno que faz com que o organismo sofra inúmeras alterações morfológicas e funcionais do sistema imunológico: Imunossenescência. Esse quadro contribui na maior suscetibilidade a infecções, tumores, doenças auto-imunes e redução da resposta vacinal¹. Assim, intervenções incluindo exercícios físicos foram propostas para a restauração da função imunológica em idosos. O objetivo proposto é entender a atividade física como influenciadora da longevidade humana, realizando um levantamento sobre os principais efeitos sobre a expressão de células do sistema imune. Metodologia: Trata-se de uma revisão da literatura cientifica, baseada em dados do PubMed, SciELO e da Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia. Foram selecionados apenas os artigos e resumos que atendiam ao objetivo proposto sobre o tema, abordando os anos de 2004 a 2013. Foram excluídos revisões de literatura e os estudos com foco especificamente sobre doenças na imunossenescência. Os resultados da busca forneceram uma análise de seis artigos distribuídos em estudos publicados em inglês e português. Resultados e Discussão: A imunossenescência apresenta alterações celulares e moleculares as quais levam a um estado de debilitação do sistema imunológico, sendo os linfócitos T as células efetoras da resposta celular que mais sofrem os efeitos do envelhecimento2. Observa- se que, além da diminuída resposta imune inata e adaptativa, há um aumento da expressão de moléculas inflamatórias  circulantes  e  do  número  de  células  natural  Killer  (NK),  o  chamado inflammaging, fato ocasionado pelo envelhecimento 3. A partir disso, com o levantamento das pesquisas, foi apontado que a atividade física moderada em longo prazo entre os idosos mostram ter benefícios em relação à atividade imunológica das células, incluindo a redução do risco de doenças infecciosas e o aumento da velocidade da eficácia da vacina. Segundo relatos, o exercício físico habitual pode verificar certos aspectos do declínio relacionado à idade na função das células T4. As melhorias também funcionam regulando as respostas imunes, reforçando a atividade das células NK e equilibrando o balanço das citocinas proinflamatórias e anti- inflamatórias, coordenando uma melhor resposta aos antígenos e minimizando os efeitos nocivos do envelhecimento nos aspectos imunológicos5. Conclusão: Embora ainda não exista um consenso quanto ao tipo de exercício mais eficaz, é enfatizado a prática  de  exercícios  resistidos. Esta revisão resume as principais conclusões dos estudos e propõe orientações para futuras explorações, pois muitas questões ainda persistem, como: o tipo do exercício, os mecanismos envolvidos e o potencial do impacto clínico, principalmente nos mais debilitados. Considerando os estudos já presentes, nos permite inferir que o aumento de programas de atividade física e uma melhora do condicionamento físico podem resultar em benefícios na saúde das populações geriátricas6. É relevante salientar que a prescrição de exercício para idosos requer criteriosa avaliação médica, evitando o possível surgimento de lesões.


Referências


Agondi RC, Rizzo LV, Kalil J, Barros MT. Rev. bras. alerg. imunopatol. 2012; 35(5):169-

Disponível em . Acesso em: 10 de julho de 2020.

Tonet AC, Nóbrega OT. Imunossenescência: a relação entre leucócitos, citocinas e doenças crônicas. Rev. Bras. Geriatr. Gerontol. 2008; 11(2):259-273. Disponível em

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. Torres KCL, Pereira PA, Lima GSF, Souza BR, Miranda DM, Bauer ME, et al. Imunosenescência. Geriatr Gerontol Aging. 2011; 5 (3): 163-169. Disponível em

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. Kohut ML, Senchina DS. Reversing age-associated immunosenescence via exercise. Exerc Immunol Rev. 2004;10:6-41 . Disponível em . Acesso em 11 de julho de 2020.

. Anjos MCG, Passos LFS, Malheiro A. Os efeitos do condicionamento físico na imunosenescência. Geriatr Gerontol Aging.2013; 7 (1): 60-67. Disponível em . Acesso em 11 de julho de 2020.

Senchina DS, Kohut ML. Immunological outcomes of exercise in older adults. Clin Interv Aging. 2007; 2(1):3-16. doi:10.2147/ciia.2007.2.1.3. Disponível em . acesso em 11 de julho de 2020.


Quais os efeitos do exercício físico no longo prazo em relação ao sistema imune?

Entenda por que essa relação é tão complexa e o papel do Profissional de Educação Física nesse contexto

Em meio à pandemia de coronavírus, muito se fala em fortalecer o sistema imunológico, mas esse cuidado não deve encerrar junto com a quarentena. A boa notícia é que isso é possível e uma das formas é praticando a boa e velha atividade física. Mas a atividade pela atividade não basta. É preciso bem mais que isso: uma minuciosa avaliação e uma prescrição individualizada devem estar associadas a cuidados em toda a esfera da saúde humana: alimentação natural, saudável e balanceada, noites bem dormidas e saúde mental em dia - que impacta diretamente no bem-estar físico.

Pois é, não adianta cuidar de uma área da vida e negligenciar outras. Assim como é perigoso exagerar nas doses de exercício físico - aliás, esse hábito pode ser tão prejudicial à saúde quanto o sedentarismo. É o que aponta a pesquisa de doutorado do Thiago Guimarães [CREF 018202-G/RJ], cujo tema foi o excesso de exercício na modulação do sistema imunológico. Com o trabalho, Thiago conquistou o primeiro lugar no 31º Congresso da Sociedade Brasileira de Medicina do Exercício e do Esporte (SBMEE), em 2019.

Imerso na missão de medir a dose ideal de atividade física a ser prescrita, Thiago criou o Grupo de Pesquisa sobre Excesso de Exercícios (GPEEx) em 2015. Na época, desencorajado por muitos profissionais de diferentes áreas, chegou a ser acusado de desestimular a atividade física. Contrariando as críticas, o caminho foi o oposto.

“A proposta é integrar a teoria e a prática. Afinal, ‘não há nada mais prático do que uma boa teoria’. Somos um grupo de pesquisa, ensino, extensão e empreendedorismo sobre assuntos relacionados ao excesso de exercício e estresse”. Pesquisando a prática para formar teoria e levando teoria para aperfeiçoar a prática, Thiago tem uma certeza, quando se trata de Educação Física: “Estudar é o melhor investimento da vida!”. E é ele que vai te explicar tudo sobre a relação COVID-19, imunidade e atividade física na entrevista a seguir:

Revista Educação Física - Um estudo da Universidade Bath, na Inglaterra, relacionou a prática de atividade física a um aumento de “células T naive”. O que são essas células, como elas funcionam e qual sua relação com a atividade física?

Thiago Guimarães - No corpo humano temos diversas células constituintes do sistema imune. Os linfócitos T são uma dessas populações e, resumidamente, para que tenhamos uma resposta reparadora contra algum dano, nossas células T virgens (naives) precisam sofrer um processo de diferenciação para que se transformem em efetoras (células específicas para o problema). Isso quer dizer que a atividade física, dependendo do contexto (intensidade, duração, status energético, nível de estresse mental e qualidade do sono, por exemplo), pode tanto aumentar, como diminuir as células T virgens, e, sobretudo, direcionar o seu amadurecimento para um perfil de resposta celular (protetora contra vírus, por exemplo) ou extracelular (não protetora contra vírus, bactérias intracelulares e protozoários).

Ocorre que, para o pleno funcionamento do sistema imune, não podemos pensar “quanto mais linfócitos, melhor”. Na verdade, a relação é outra: quanto mais equilibradas nossas respostas celulares e extracelulares, melhor. O exercício físico é estímulo estressor, perturbador do equilíbrio. No geral, quando ausente ou em excesso, desvia a nossa resposta imune para um perfil extracelular.

Revista Educação Física - Além das já citadas, que outra consequência a atividade física traz, que estejam relacionadas ao equilíbrio imunológico?

Thiago Guimarães - O sistema imunológico, no senso comum, serve para a defesa do organismo. Porém, esse conceito limita a nossa compreensão sobre o assunto e a contextualização com as atividades físicas. O sistema imune é responsável pelo reconhecimento do que é próprio e não próprio do organismo. Sua função geral é reparar danos e preservar a homeostase (estado de equilíbrio).

Sendo assim, quando uma determinada atividade física é praticada com prazer, quando o corpo apresenta boa reserva energética, quando há equilíbrio fisiológico prévio à sua prática, muito provavelmente o estresse induzido pelo movimento será assimilado e os nossos sistemas nervoso, endócrino, cardiovascular, renal, digestório e respiratório serão estimulados ao ajuste da sintonia. O sistema imunológico parece funcionar como um verdadeiro maestro na regulação dessa sintonia e controle dos danos.

Revista Educação Física - Como a atividade física deve ser planejada para que o estresse gerado por ela seja bem assimilado, permitindo ao sistema imunológico promover essa sintonia no organismo?

Thiago Guimarães - Na minha pesquisa de doutorado, descobri que em casos de excesso de atividade física, a capacidade microbicida de células responsáveis pela fagocitose (proteção contra infecções) reduziu e a resposta imune foi desequilibrada. Houve imunossupressão celular, ou seja, as células estudadas ficaram mais vulneráveis (justamente o que menos desejamos no momento), paralelamente à redução da aptidão cardiorrespiratória.

Por outro lado, uma dose moderada de exercícios serviu como fator de proteção contra infecções. Embora o estudo tenha sido realizado com cobaias animais, podemos pensar em algumas lições. Destaco uma, o paradigma “sem dor, sem ganhos”, utilizado para defender a construção de músculos e performance. Há momentos sim, em que as pessoas podem e devem executar sessões severas de exercícios. Mas viver o tempo todo fora da zona de conforto não favorece o equilíbrio das respostas imunes e de todos os demais sistemas fisiológicos, sobretudo a longo prazo. Em algum momento será desenvolvido o esgotamento físico e mental, com prejuízos na performance e na saúde.

Revista Educação Física - Que aspectos o Profissional de Educação Física levará em conta para definir a medida e a intensidade de atividade para cada indivíduo, especialmente durante esse momento de isolamento?

Thiago Guimarães - É crucial o trabalho do Profissional de Educação Física. Ele irá avaliar, planejar, intervir de forma eficaz, reavaliar e se atualizar. Para a prescrição da atividade física ideal para um indivíduo, o primeiro passo é avaliar: conhecer suas restrições, nível prévio de condicionamento e objetivos. No caso de sedentários, por exemplo, há mais um motivo para não começar a seguir aleatoriamente qualquer programa das redes sociais, blogueiros fitness ou jornais. Deve-se fazer contato com um profissional de Educação Física e desconfiar se ele não realizar uma avaliação prévia. A progressão do nível do treinamento deve ser respeitada criteriosamente, sobretudo quando a pessoa apresentar limitações e fragilidades. Afinal, a mesma sessão leve para alguém assintomático pode ser uma sessão muito intensa para um iniciante.

Revista Educação Física - Entendemos até agora que a atividade física bem prescrita, orientada e desenvolvida é benéfica ao sistema imune. Para o grupo de risco para a COVID-19 (idosos e pessoas com doenças crônicas), esse efeito da atividade física é tão evidente quanto em pessoas jovens e saudáveis?

Thiago Guimarães - O pano de fundo para a maioria das enfermidades agudas são as doenças crônicas. Elas são desenvolvidas, sobretudo, por inatividade física, alimentação irregular, estresse mental crônico, sono ruim, consumo de drogas (tabaco, medicamentos, álcool) e poluição, por exemplo. O exercício físico regular controlado pode retardar o chamado inflammaging (processo natural de inflamação com o envelhecimento), reduzindo o risco de patologias associadas à inflamação crônica. Porém, repare a quantidade de fatores que também precisam ser controlados para o seu sucesso.

Revista Educação Física - Esses efeitos são progressivos? Em que ritmo as respostas no organismo são percebidas?

Thiago Guimarães - O exercício por si só não faz milagres e uma boa execução de movimento não é garantia de sucesso. Para potencializar seus benefícios e reduzir riscos, há algumas medidas que podem ser adotadas: ter uma alimentação balanceada, manter uma rotina de sono regular e cuidar da saúde mental - afinal, ansiedade, medo e preocupações gerais podem desencadear uma resposta de luta ou fuga “permanente”, desequilibrando completamente o sistema imune e tornando-o mais vulnerável.

Se todos esses fatores estiverem minimamente controlados, o exercício pode promover a imunidade agudamente, em poucas horas. Continuidade, adesão e equilíbrio são as chaves para o sucesso. Parece simples, mas, infelizmente, a maioria das pessoas no mundo anda na contramão. Para ilustrar, dois extremos na curva: de um lado, os dados epidemiológicos alarmantes de sedentarismo, obesidade e depressão; do outro lado, os exemplos corriqueiros de pessoas sobrecarregadas com a rotina de vida, cada vez mais consumindo pré-treinos (e outras drogas) para burlar o sinal natural de fadiga do corpo e treinar intensamente – vale lembrar que o Brasil é um dos maiores consumidores de suplementos alimentares no mundo. Equilibrar não é fácil.

Quais são os efeitos do exercício físico sobre o sistema imunológico?

O mecanismo de melhora do sistema imunológico está associado ao efeito que a atividade física regular proporciona ao organismo: aumento dos linfócitos, ou seja, das células de defesa que cumprem a função de combater e destruir agentes patogênicos como as células tumorais ou as infectadas por vírus e bactérias.

Qual a importância do exercício físico para a imunidade?

Em uma abordagem simplificada, todo exercício provoca uma carga controlada de estresse no corpo humano, como uma espécie de inflamação que, por sua vez, demanda uma resposta do metabolismo, do sistema nervoso e do sistema imunológico para lidar com esse evento.

Quais são os efeitos crônicos e agudos do exercício físico sobre o sistema imunológico?

Vários estudos relatam que o exercício físico afeta a competência do sistema imunológico, incluindo o tráfico de células induzido por hormônios e a influência direta dos hormônios do estresse, prostaglandinas, citocinas e outros fatores (CAVAGLIERI et al., 2006; SUZUKI et al., 2000).