O que o mandante transfere ao mandatário?

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Fonte: Resumão Jurídico (Folha de São Paulo).

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O que o mandante transfere ao mandatário?

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AVISO LEGAL

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Ac�rd�o do Tribunal da Rela��o do Porto

Processo:

N� Convencional: JTRP000

Relator: FERNANDA ALMEIDA

Descritores: MANDATO SEM REPRESENTA��O

N� do Documento: RP20200127238/19.7T8PVZ.P1

Data do Acord�o: 01/27/2020

Vota��o: UNANIMIDADE

Texto Integral: S

Privacidade: 1

Meio Processual: APELA��O

Decis�o: REVOGADA

Indica��es Eventuais: 5� SEC��O

�rea Tem�tica: .

Sum�rio: I - No mandato sem representa��o, a representa��o � impr�pria ou mediata, por oposi��o a representa��o pr�pria, por na primeira estar ausente atua��o em nome de outrem, uma vez que o mandat�rio age em nome pr�prio, adquirindo os direitos e obriga��es decorrentes dos atos que celebra, mas sendo obrigado a transferir para o mandante os direitos adquiridos e sendo este obrigado a assumir as obriga��es contra�das pelo mandat�rio.
II - Face ao ordenamento vigente, o mandat�rio torna-se titular do direito que adquiriu em direito pr�prio e deve transmiti-lo ao mandante por um novo ato. Este novo ato n�o reveste j� a forma de venda porque a sua causa � o mandato. A transfer�ncia da propriedade da coisa adquirida pelo mandat�rio ao mandante d�-se causa solvendi obligationis mandati.
III - Em caso de incumprimento pelo mandat�rio, ao mandante n�o assiste direito real dotado de sequela, mas simples direito a a��o pessoal ou credit�cia
IV - A dissolu��o do v�nculo conjugal por div�rcio faz cessar as rela��es patrimoniais entre os c�njuges e conduz � partilha do patrim�nio conjugal. Uma vez dissolvida a comunh�o e antes de se proceder � respetiva liquida��o e partilha, cada um dos c�njuges passa a ter na sua esfera jur�dica um direito indiviso, correspondente � respetiva mea��o nos bens que a integravam.
V - Tamb�m os contratos firmados pelo casal antes de dissolvido o casamento mant�m a sua vig�ncia, se n�o sobreviver qualquer facto extintivo dos respetivo v�nculos, n�o sendo a dissolu��o da comunh�o motivo de extin��o dos cr�ditos e dos d�bitos dos ex-c�njuges.
VI - Assim sucede com o mandato sem representa��o estabelecido entre os c�njuges e terceiros durante a pend�ncia do casamento e do qual emerge um direito de cr�dito que corresponde a um ativo que j� existia no patrim�nio dos ex-c�njuge e que pode por estes ser exercitado ap�s terminarem as rela��es patrimoniais entre os c�njuges.
VII - Desse direito de cr�dito pode mesmo originar-se um direito de propriedade sobre coisa im�vel que, assim, vem a integrar o ativo do extinto casal e, por essa via, carecer� de partilha.

Reclama��es:

Decis�o Texto Integral: Processo n.� 238/19.7T8PVZ.P1

Sum�rio do ac�rd�o elaborado pela sua relatora nos termos do disposto no artigo 663.�, n.� 7, do C�digo de Processo Civil:
……………………………
……………………………
……………………………Acordam os ju�zes abaixo-assinados da quinta sec��o, c�vel, do Tribunal da Rela��o do Porto:
RELAT�RIO
AUTOR: B…, divorciado, residente no …, .., Ponte de Lima.
R�S: Heran�a aberta por �bito de C…, da qual � cabe�a de casal a segunda R�, D…, vi�va, residente na Rua …, …, …, Gondomar, e herdeira a terceira R�, E…, divorciada, residente na Rua …, …, …, Maia.

Por via da presente a��o declarativa, pretende o A. obter das R�s a pr�tica dos atos de instru��o e efectiva��o da aliena��o do pr�dio descrito no art. 26.� da pi para o autor e para a terceira R� de modo a ser inclu�do no invent�rio e partilhado.
Para tanto alegou que foi casado com a terceira R� de quem se acha atualmente divorciado estando em curso processo de partilhas dos bens comuns.
Mais alegou que, ainda na pend�ncia do casamento, o autor da heran�a e a segunda R� receberam poderes do A. e da terceira R� para adquiriram um im�vel com dinheiro do casal, o que fizeram com a obriga��o de posteriormente transmitirem a propriedade do mesmo para o patrim�nio do extinto casal, logo que isso lhes fosse solicitado, o que n�o fizeram.
Em contesta��o, as R�s invocam a incompet�ncia do tribunal e impugnam a mat�ria descrita na peti��o inicial.

A fls. 64 e ss. foi julgada improcedente a exce��o de incompet�ncia e conhecido o m�rito da a��o que foi julgada improcedente e tendo-se a� dado como provados os seguintes factos:
1) Em 1 de Janeiro de 2005, faleceu C…, no estado civil de casado com a R� D…;
2) A R� E… � filha dos identificados C… e D…;
3) O Autor casou com D… em 20 de Junho de 1991, sob o regime da comunh�o de adquiridos;
4) O autor e a R� D… divorciaram-se e por decis�o judicial de 2 de Outubro de 2015;
5) Corre termos, sob o n.� de processo 1974/2016 no Cart�rio Notarial da Dra. F…, sito na Rua …, … – 1�, S/., …. – … Maia, invent�rio para partilha de bens comuns do dissolvido casal, no qual o aqui Autor exerce as fun��es de cabe�a de casal;
6) A aquisi��o da frac��o aut�noma designada pela letra “H”, correspondente ao pr�dio em propriedade horizontal sita no 3� andar, de tipo T3, da Av. …, …, … n� ../.., da Urbaniza��o E… …. – … Maia, inscrito na matriz urbana da freguesia de …, do concelho da Maia, no art. 7745 e descrito na Conservat�ria do Registo Predial respectiva sob o n� 03428/98, est� registada a favor dos referidos C… e da R� D…, pela ap 11 de 27.04.2004;
7) Por documento datado de 1 de Janeiro de 2005, e subscrito por C… e da R� D… – cuja c�pia est� junta a fls. 8, com o teor que aqui se d� por integralmente reproduzido - estes declararam ter recebido da sua filha, aqui terceira R� e do seu ent�o genro, o aqui Autor, a quantia de € 150.000,00 (cento e cinquenta mil euros).
E confessaram-se devedores deste valor aos mutuantes, obrigando-se a restituir- lhes o mesmo logo que lhes fosse solicitado.

Desta senten�a recorre o A., visando a sua revoga��o com base nos seguintes fundamentos que assim sintetiza:
……………………………
……………………………
……………………………
N�o foram apresentadas contra-alega��es.
Colhidos os vistos, cumpre decidir.
� pelas conclus�es do recurso que se delimita o objeto deste, ressalvadas as quest�es de conhecimento oficioso (arts. 635.� e 639.� CPC).
I - Da viola��o do disposto nos arts. 590.�, n.�1, 607.�, n.� 4, e da nulidade prevista no art. 615.�, n.� 1 d) CPC:
Nos termos do art. 595.�, n.�1 al. b), CPC, o despacho saneador tem por finalidades, entre outras, o conhecimento imediato do m�rito da causa sempre que o estado dos autos o permitir, sem necessidade de mais provas.
Diz-se que o estado dos autos permite o conhecimento do m�rito da causa quando os factos invocados como causa de pedir ou como exce��o n�o foram objeto de impugna��o, achando-se j� demonstrados. Quando assim n�o suceda, imp�e-se de igual modo o conhecimento do m�rito sempre que se verifique que a vers�o das partes integradora do objeto do processo, mesmo a admitir-se como verdadeira, n�o conduziria nunca � proced�ncia do pedido ou da exce��o.
Foi isso que sucedeu in casu.
Entendeu o tribunal que, a ser verdade que entre A. e ent�o mulher, aqui R�, e os pais desta �ltima ocorreu o neg�cio invocado – mandato sem representa��o – ent�o os termos atuais da situa��o patrimonial dos mandantes – em patilha subsequente a div�rcio – n�o permitem o exerc�cio do cr�dito invocado porque “independentemente da obriga��o que eventualmente recaia sobre a R� D…, por si e em representa��o da heran�a indivisa de C…, de transmitir a titularidade do dito im�vel, nunca o im�vel em causa poder�, por via de tal transmiss�o (cujos efeitos, naturalmente, nunca poder�o retroagir � data em que os sogros do Autor o adquiriram), passar a integrar o acervo de bens comuns do dissolvido casamento e, nessa qualidade, integrar o invent�rio para separa��o de mea��es em curso.”
Quer isto dizer que a decis�o se n�o baseou numa simples aprecia��o formal ou processual da peti��o inicial, como se de indeferimento liminar se tratasse. Houve, de facto, a aprecia��o dos factos invocados sob a perspetiva do direito substantivo aplic�vel.
N�o pode, por isso, dizer-se que o tribunal violou o dever de gest�o processual decorrente do disposto no art. 590.� CPC.
Pela mesma raz�o, � incorrecto afirmar-se ter ocorrido excesso ou defici�ncia de pron�ncia nos termos previstos no art. 615.�, n.� 1 d) CPC, posto que, como referido, n�o � indeferimento liminar, mas conhecimento do fundo da a��o conforme disp�e o art. 595.�, n.� 1 b); para o efeito, os factos que interessam os invocados pelo A., que estejam provados quer n�o, uma vez que o entendimento do tribunal para decidir pela improced�ncia partiu do princ�pio – ou da hip�tese – como podia e devia, da sua verifica��o, para depois lhe aplicar o direito.
Assim, do ponto de vista da sua validade e regularidade intr�nsecas n�o padece a decis�o que qualquer nulidade ou irregularidade.
II – Do mandato sem representa��o e da partilha subsequente ao div�rcio:
O objeto central da presente a��o versa sobre o tema da representa��o nos neg�cios jur�dicos e sobre a natureza, extens�o e efeitos do chamado mandato sem representa��o.
De acordo com a defini��o resultante do art. 258.� C�digo Civil, a representa��o consiste na pr�tica de um ato jur�dico em nome doutrem, para na esfera desse outrem se produzirem os respetivos efeitos, sendo necess�rio, apenas, que o representante atue no limites dos poderes que lhe competem ou que o representado ratifique o ato posteriormente.
Mandato “� o contrato pelo qual uma das partes se obriga a praticar um ou mais atos jur�dicos por conta da outra” (art. 1157.� C�digo Civil), sendo a primeira o mandat�rio e a segunda o mandante.
Mandato e representa��o n�o se confundem nem t�m que coexistir. Pode haver representa��o sem mandato, como sucede no caso de representa��o legal ou volunt�ria (simples procura��o – art� 262� C�digo Civil). E, pode, por outra parte, haver mandato sem representa��o, isto �, quando o mandat�rio n�o recebeu poderes para agir em nome do mandante, agindo por conta dele, mas em nome pr�prio. Exemplos desta �ltima categoria s�o o contrato de comiss�o, regulado no art. 266.� e ss. C�d. Comercial e o mandato sem representa��o, regulado no art. 1180.� C�digo Civil que disp�e que “o mandat�rio, se agir em nome pr�prio, adquire os direitos e assume as obriga��es decorrentes dos actos que celebra, embora o mandato seja conhecido dos terceiros que participem nos actos ou sejam destinat�rios destes”.
Para caraterizar esta figura alude a doutrina a representa��o impr�pria ou mediata, por oposi��o a representa��o pr�pria, por na primeira estar ausente a chamada contemplatio dominii ou atua��o em nome de outrem, pois que o mandat�rio age em nome pr�prio, adquirindo os direitos e obriga��es decorrentes dos atos que celebra, mas sendo obrigado a transferir para o mandante os direitos adquiridos e sendo este obrigado a assumir as obriga��es contra�das pelo mandat�rio. Trata-se, pois, de uma situa��o t�pica de interposi��o real (por oposi��o a fict�cia, pr�pria da simula��o) de pessoas para pr�tica de um ato jur�dico, em regra, um neg�cio jur�dico, sendo este ato alheio porque versa sobre interesses que n�o pertencem � pessoa interposta ou mandat�rio, embora este seja o sujeito da efic�cia do neg�cio e atue em nome pr�prio, mas por conta de outrem, uma vez que aqueles efeitos jur�dicos se destinam ao verdadeiro interessado para quem a interposta pessoa os deve transmitir, na sua exata configura��o jur�dica ou, pelo menos, econ�mica.
O contrato de mandato n�o est� sujeito a forma especial, vigorando, quanto � sua constitui��o, o princ�pio da consensualidade. �, pois, um contrato meramente consensual, podendo ser conferido por mera declara��o verbal.
O ponto crucial que se debate quando se alude a mandato sem representa��o respeita � proje��o dos efeitos do ato objeto do mandato na esfera jur�dica do mandante.
A doutrina dominante entende que essa concilia��o (entre a atua��o em nome pr�prio e a atua��o por conta de outrem) s� � poss�vel atrav�s de uma dupla transfer�ncia dos efeitos do ato praticado pela interposta pessoa: transfer�ncia para esta e desta para o dominus. A atua��o em nome pr�prio teria como resultado fazer recair todos os efeitos do ato sobre o mandat�rio, e a atua��o por conta de outrem constitu�a-o na obriga��o de posteriormente transmitir, por novo ato, esses efeitos ao mandante.
A tese da dupla transfer�ncia � tribut�ria do princ�pio napole�nico nemo alteri stipulari potest e do princ�pio da relatividade ou efeito relativo das conven��es e, embora n�o corresponda ao interesse real das partes, uma vez que est� fora do intento destas que o mandat�rio se torne propriet�rio da coisa que adquiriu em execu��o do mandato, a verdade � que a mesma, a despeito das reservas que se lhe op�em, veio a ser acolhida no art. 1181.� C�digo Civil, segundo o qual o mandat�rio � obrigado a transferir para o mandante os direitos adquiridos em execu��o do mandato (n.�1). Assim vistas as coisas, o mandat�rio pode disp�r da coisa que adquiriu em execu��o do mandato, n�o assistindo ao mandante o poder de reivindic�-la, mas t�o-s�, um direito de cr�dito, direito pessoal sobre o mandat�rio, � transmiss�o da propriedade. Assente est�, pois, face ao ordenamento vigente, que o mandat�rio se torna titular do direito que adquiriu em direito pr�prio e que deve transmiti-lo ao mandante por um novo ato.
Este novo ato n�o reveste j� a forma de venda porque a sua causa � o mandato. A transfer�ncia da propriedade da coisa adquirida pelo mandat�rio ao mandante d�-se causa solvendi obligationis mandati e revestir� forma documental se se tratar de im�vel.
Pessoa Jorge[1] defende, contudo, a tese da proje��o imediata segundo a qual os efeitos se repercutem diretamente na esfera do mandante, sem terem que passar pelo patrim�nio do mandat�rio.
Terceira tese, interm�dia, � a defendida por Menezes Leit�o[2] que sustenta a dupla transfer�ncia no mandato para adquirir e a proje��o imediata no mandato para alienar.
Problemas surgem quando o mandante n�o cumpre a obriga��o de transferir a coisa adquirida ao mandante n�o assiste direito real dotado de sequela, mas simples direito a a��o pessoal ou credit�cia em execu��o do mandato, sendo certo que.
A resposta imediata remeter-nos-ia para a solu��o mais evidente: ao mandante restaria a indemniza��o por perdas e danos. � essa a solu��o proposta por P. de Lima e A. Varela[3], para os quais a a��o � pessoal e n�o real, como sucede no C�digo Civil italiano.
Diz-se, contudo, que no sistema jur�dico vigente, numa interpreta��o racional e sistem�tica, encontramos instrumentos adequados e capazes de dar efic�cia � tese da dupla transfer�ncia.
Referimo-nos, por exemplo, ao instituto da execu��o espec�fica.
A exequibilidade espec�fica da obriga��o de contratar n�o foi estabelecida como princ�pio geral pelo legislador que apenas a acolheu concretamente para o contrato de promessa no art. 830.� C�digo Civil. Todavia, nem por isso poder� deixar de se considerar aplic�vel tal regime � obriga��o de contratar que decorre do art. 1181.�, n.�1 C�digo Civil.
Vaz Serra[4] come�ou por defender que tal instituto – o previsto no art� 830� C�digo Civil – � aplic�vel aos casos em que algu�m se encontra investido na obriga��o de contratar, o que se justifica por uma interpreta��o extensiva, nos quadros do art. 11.� C�digo Civil, uma vez que a posi��o de quem tendo conclu�do um contrato de promessa e pode obter a senten�a prevista naquele artigo � semelhante � do contraente que, tendo conclu�do um contrato em que o outro contraente se vinculou a uma declara��o unilateral de vontade, se encontra perante o n�o cumprimento desse outro contraente.
Neste sentido tamb�m Janu�rio Gomes[5].
A favor do alargamento da execu��o espec�fica a outros deveres de contratar, nomeadamente no caso de incumprimento do dever de transmiss�o do mandat�rio nomine pr�prio, pode ainda ver-se Menezes Cordeiro[6].
Contra tal argumenta��o se posicionaram P. de Lima de A. Varela[7]. Sendo certo, como afirmam, que n�o assiste ao mandante o direito de reivindicar a coisa do mandat�rio ou de terceiro para quem este a haja, entretanto, transferido, uma vez que, n�o se tratando o mandato de contrato com efic�cia real (como sucede, v.g. no direito italiano), n�o � dotado de sequela, mas tamb�m n�o lhe reconhecem o direito � execu��o espec�fica. Os que assim entendem baseiam-se tal solu��o no argumento literal. “A letra da lei � un�voca � restri��o da aplica��o da execu��o espec�fica ao contrato-promessa”, escreve-se no Ac. STJ, de 11.5.2000[8].
Com efeito o art. 830.�, n.� 1 C�digo Civil estipula expressamente que: Se algu�m estiver obrigado a celebrar certo contrato e n�o cumprir a promessa, pode a outra parte, na falta de conven��o em contr�rio, obter senten�a que produza os efeitos da declara��o negocial do faltoso, sempre que a isso n�o se oponha a natureza da obriga��o assumida. Ora, sendo verdade que, em tal normativo, “o legislador disse tudo o que pretendia dizer e n�o era f�cil diz�-lo por outras palavras”, tamb�m n�o � menos certo que a matriz gramatical n�o impede peremptoriamente que a execu��o espec�fica seja extens�vel a situa��es semelhantes ao contrato de promessa. A isso n�o obsta o argumento hist�rico, do qual resulta que o actual art. 830.� C�digo Civil n�o reproduz o texto do art. 442.� do anteprojecto de Vaz Serra (que acolhia a doutrina do art. 2932.� do C�digo italiano, onde a execu��o espec�fica � admitida em geral). � que, se a interpreta��o deve cingir-se � letra da lei e ao pensamento legislativo, na fixa��o do seu sentido e alcance “o int�rprete presumir� que o legislador consagrou as solu��es mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados” (art. 9.�, n.� 3 C�digo Civil). Se � certo que as normas excepcionais n�o admitem interpreta��o anal�gica (art. 11.� C�digo Civil), a verdade � que n�o pro�bem a interpreta��o extensiva. Ora, “pode ter de proceder-se a uma interpreta��o extensiva ou restritiva ou mesmo a uma interpreta��o correctiva da lei, mas neste �ltimo caso ser� necess�rio que do texto �falhado� se colha pelo menos indirectamente uma alus�o �quele sentido que o int�rprete venha a acolher como resultado da interpreta��o. E mesmo quando se socorre de elementos externos o sentido s� poder� valer se for poss�vel estabelecer alguma rela��o entre ele e o texto que se pretende interpretar”. Do exposto, resulta que “uma interpreta��o actualista daquele preceito (art. 830.� C�digo Civil), “que compense a in�rcia do legislador face �s exig�ncias de uma justi�a efectiva e eficaz, e o primado do cumprimento efectivo das obriga��es livremente assumidas, impunham que se visse naquele preceito a precipita��o de um princ�pio geral para as obriga��es de presta��o de facto n�o fung�vel”.
Na jurisprud�ncia, a solu��o n�o tem sido un�nime.
Para al�m do ac. STJ j� mencionado, podem ver-se o ac. RE, de 3.6.04[9] em cujo sum�rio se l�, entre o mais: No caso do mandat�rio “nomine pr�prio”n�o cumprir a obriga��o de transferir os direitos adquiridos na execu��o do mandato, n�o pode o mandante recorrer ao instituto da execu��o espec�fica (art. 830.� , n.�1 CC) para impor aquele cumprimento. O preceituado no art. 830.� s� � aplic�vel naqueles casos em que a obriga��o de celebrar um contrato resulte de um contrato-promessa. E por se tratar duma norma excepcional est� vedado ao tribunal a possibilidade de emitir senten�a que produza os efeitos da declara��o negocial do mandat�rio faltoso. Ao mandante restava pedir, (….), a condena��o daquele no cumprimento do dever omitido de emitir a declara��o negocial de transfer�ncia para o mandante dos direitos que adquiriu eum execu��o do mandato e bem assim que ao mesmo fosse aplicada uma san��o pecuni�ria compuls�ria adequada, dado estar em causa uma presta��o de facere infung�vel n�o atinente a direitos de personalidade e n�o suscept�vel de execu��o sub-rogat�ria.
Por sua vez, no ac. RG, de 30.3.2017[10] sumariou-se o seguinte: se o mandat�rio se recusar a transmitir a propriedade para o mandante, este n�o tem possibilidade de o for�ar a tal, assistindo-lhe apenas o direito a uma indemniza��o de perdas e danos, pois que, o preceituado no art. 830.� do CC, s� � aplic�vel naqueles casos em que a obriga��o de celebrar um contrato resulta dum contrato-promessa. Assim, como o mandato sem representa��o tem um fim imediato, que se traduz nos actos a praticar pelo mandat�rio ou por terceiros, e um objectivo mediato, que obriga o mandat�rio a transferir para o mandante o efeito daqueles actos, e sendo vedada a execu��o espec�fica, para o cumprimento do fim mediato nos termos do art. 830.� do CC, resta ao mandante demandar o mandat�rio pedindo indemniza��o pelos danos que lhe causou o incumprimento (n.�1 do art. 1181.� do CC) ou pedir a condena��o deste a cumprir o mandato.
A favor da execu��o espec�fica, o ac. RL, de 2.11.99[11], assim sumariado: O mandat�rio em nome pr�prio a quem foi vendido um pr�dio e assim o adquiriu, tornando-se dono dele, tem subsequentemente, de o alienar ao mandante, atrav�s de um novo neg�cio jur�dico. Este novo neg�cio jur�dico n�o � uma venda; mas �, em todo o caso, um acto de aliena��o – uma modalidade alienat�ria espec�fica, cuja causa justificativa est� no cumprimento de uma obriga��o advinda do mandato para o mandat�rio, nas suas rela��es internas com o mandante. Seria injustific�vel que a execu��o espec�fica prevista no art. 830.� CC se limitasse �s obriga��es fundadas em contrato-promessa, j� que, a sua raz�o de ser abrange as obriga��es fundadas noutra fonte: em que n�o havendo uma pr�via declara��o negocial, h� j� uma obriga��o de contratar ou emitir uma declara��o de vontade que pode ser t�o carecida de execu��o como a resultante de contrato-promessa.
Na situa��o dos autos, o A. parece ter interpretado a solu��o jur�dica do problema cuja tutela peticiona de forma semelhante ao ac�rd�o acima citado e proferido em 2004.
Em todo o caso, o tribunal a quo n�o se debru�ou sobre essa situa��o, nem sobre uma outra que seria a de saber se, inexistindo documento escrito, e tratando-se de im�veis, o mandato seria ou n�o nulo. Recorde-se que, por exemplo, Menezes Leit�o rejeita a aplica��o da execu��o espec�fica a estes casos, mas em se tratando de im�veis e existindo documento escrito, admite a extens�o anal�gica do art. 830.� CC[12].
Sobre esta dimens�o do pedido afigura-se-nos tamb�m n�o ser esta a sede pr�pria. N�o s� porque se trataria de conhecer mat�ria nova, n�o tratada em primeira inst�ncia e sobre a qual as partes se n�o pronunciaram, como tamb�m � verdade que sendo a quest�o controvertida e v�rias as solu��o poss�veis de direito, os autos haveriam de prosseguir os seus termos.
Por�m, � distinta a considera��o contida na senten�a de primeira inst�ncia que paralisa os direitos do autor, n�o porque este n�o exista, mas porque n�o � exequ�vel face ao estado de dissolu��o das rela��es patrimoniais entre os c�njuges.
Afigura-se-nos, contudo, que o entendimento assim preconizado, n�o pode subsistir.
A dissolu��o do v�nculo conjugal por div�rcio faz cessar as rela��es patrimoniais entre os c�njuges e conduz � partilha do patrim�nio conjugal. Por�m, n�o � com a senten�a que decreta o div�rcio ou com a decis�o que determina a separa��o de bens que terminam, de facto, as rela��es patrimoniais entre os c�njuges. Isso s� sucede com a partilha.
At� l�, como se processa com o ativo e passivo n�o partilhados?
A comunh�o conjugal constitui um patrim�nio de m�o comum ou propriedade coletiva. � uma situa��o jur�dica distinta da compropriedade. Essa distin��o assenta, al�m do mais, no facto de o direito dos contitulares n�o incidir sobre cada um dos elementos que constituem o patrim�nio, mas sobre todo ele, como um todo unit�rio.
Na partilha dos bens destinada a por fim � comunh�o, os respetivos titulares apenas t�m direito a uma fra��o ideal do conjunto, n�o podendo exigir que essa fra��o seja integrada por determinados bens ou por uma quota em cada bem concreto objeto da partilha.
Uma vez dissolvida a comunh�o e antes de se proceder � respetiva liquida��o e partilha, cada um dos c�njuges passa a ter na sua esfera jur�dica um direito indiviso, correspondente � respetiva mea��o nos bens que a integravam. Os c�njuges podem, a qualquer momento, sair da indivis�o procedendo - judicial ou extrajudicialmente - � partilha dos bens comuns.
No que respeita � natureza desta situa��o, de indivis�o p�s-comunh�o, Pereira Coelho e Guilherme de Oliveira[13] entendem que deixa de haver um patrim�nio comum como patrim�nio colectivo, passando-se a uma situa��o id�ntica � da heran�a indivisa, j� que cada um dos ex-c�njuges pode agora dispor da sua mea��o e pedir a separa��o das mea��es, o que n�o podia fazer antes do div�rcio. A situa��o �, ainda assim, distinta da compropriedade, j� que o direito dos ex-c�njuges continua a n�o incidir sobre nenhum bem em concreto, mas sobre o patrim�nio comum, no seu conjunto, uma vez que, antes da partilha, n�o se sabe com que bens ir� ser preenchida a mea��o de cada um dos ex-c�njuges.
Tamb�m Esperan�a Mealha[14] entende que “o regime mais pr�ximo desta situa��o � de facto o da comunh�o heredit�ria” porque, a par do que acontece com a heran�a, o patrim�nio comum indiviso tamb�m se comp�e de situa��es jur�dicas ativas e passivas, tendo tamb�m um certo grau de autonomia patrimonial, respondendo primeiramente por determinadas d�vidas. Por outro lado, o direito dos ex-c�njuges sofre uma mudan�a estrutural, passando cada um a ter um direito individualizado e quantificado, o direito � sua mea��o, que incide sobre um todo e n�o sobre bens concretos, aproximando-se da figura do quinh�o heredit�rio
Para Eva Dias Costa[15], o apelo �s regras das demais situa��es de indivis�o previstas no C�digo Civil e a compara��o com a heran�a indivisa n�o � a �nica via poss�vel. Poder-se-� tamb�m encontrar para esta situa��o de comunh�o em liquida��o um paralelo nas sociedades dissolvidas. O C�digo das Sociedades Comerciais consagra, no artigos 146� e ss., que a sociedade dissolvida entre logo em liquida��o, devendo os liquidat�rios proceder em primeiro lugar ao pagamento do passivo atrav�s do activo social, partilhando-se em seguida o activo restante, por escritura p�blica ou judicialmente, na falta de acordo ou se o contrato de sociedade assim estipular. Durante a liquida��o e at� � partilha e relat�rio final, os liquidat�rios administram os bens sociais, podendo, designadamente, contrair empr�stimos necess�rios � liquida��o ou alienar em globo o patrim�nio social, devendo, ainda, ultimar os neg�cios pendentes, cumprir as obriga��es e cobrar os cr�ditos da sociedade.
Como refere esta autora, apesar de o ativo e do passivo ficarem como que cristalizados no momento da dissolu��o da comunh�o, momento no qual se obt�m o elenco final do ativo e passivo, eles podem sofrer ainda modifica��es nomeadamente decorrentes do aumento do ativo.
O ativo do patrim�nio do ex-casal pode aumentar em fun��o dos frutos ou rendimento dos bens comuns, de sub-roga��es ou, ainda, alterar-se em fun��o de aumentos do passivo decorrentes da pr�pria manuten��o do patrim�nio comum.
Tamb�m os contratos firmados pelo casal antes de dissolvido o casamento mant�m a sua vig�ncia, se n�o sobreviver qualquer facto extintivo dos respetivo v�nculos, n�o sendo a dissolu��o da comunh�o motivo de extin��o dos cr�ditos e dos d�bitos dos ex-c�njuges.
Assim, se estes firmaram, por exemplo, um contrato de promessa na qualidade de promiss�rios, n�o est�o impedidos de recorrer � execu��o espec�fica para lograr obter o seu adimplemento pelo promitente vendedor.
O direito que existia anteriormente – emergente da promessa – � exercitado ap�s a dissolu��o da comunh�o conjugal e n�o se extingue com esta.
Do mesmo modo com o mandato sem representa��o estabelecido entre os c�njuges e terceiros durante a pend�ncia do casamento e do qual emerge um direito de cr�dito que corresponde a um ativo que j� existia no patrim�nio dos ex-c�njuge e que pode por estes ser exercitado ap�s terminarem as rela��es patrimoniais entre os c�njuges.
Desse direito de cr�dito pode mesmo originar-se um direito de propriedade sobre coisa im�vel que, assim, vem a integrar o ativo do extinto casal e, por essa via, carecer� de partilha.
Na situa��o dos autos, o que pretende o autor � a presta��o de facto a cargo da heran�a e da segunda R� (sobre a terceira R� n�o recai o dever que o pedido pretende exercitar) que emerge do direito de cr�dito que nasceu com o contrato que diz ter sido celebrado aquando da vig�ncia do casamento entretanto dissolvido.
Caso as partes entendessem voluntariamente dar execu��o �quele neg�cio, uma vez que o cr�dito j� existia no ativo o ex-casal, � evidente que o im�vel passaria a integrar tal ativo e seria partilhado a seu tempo.
O mesmo suceder� se, na sequ�ncia de a��o judicial, vier a entender-se se de proceder o direito que se exercita em consequ�ncia do dito mandato sem representa��o.
A senten�a, tendo em conta os motivos que lhe subjazem, n�o pode por isso subsistir.

Dispositivo
Pelo exposto, decidem os Ju�zes que comp�em este Tribunal julgar o recurso procedente e, em consequ�ncia, revogar a senten�a recorrida e determinar o prosseguimento dos autos.
Sem custas.
ds

Porto, 27-01-2020
Fernanda Almeida
Ant�nio Eleut�rio
Isabel S�o Pedro Soeiro
_________________
[1] O Mandato sem Representa��o, tese de doutor., 1961, p. 291 e 334.
[2] Direito das Obriga��es, vol. III, Contratos em Especial, 7� ed., 2010, Ed. Almedina, p. 462.
[3] C�digo Civil Anotado, Vol.III, p. 827.
[4] RLJ, 100, 194.
[5] Contrato de Mandato, Ed. AAFDL, reimpress�o da edi��o de 1990 (2007), p. 113.
[6] Tratado de Direito Civil, tomo II, 2010.
[7] Ob. Cit, Vol. II, 3.� Ed., p. 108 e ainda Das Obriga��es em Geral, 4.� Ed., p. 82.
[8] Proc. 00B229.
[9] Proc. 621/04-2.
[10] Proc. 1191/16.4T8VCT-A.G1
[11] Proc. 0044841
[12] Ob. Cit., p. 464.
[13] Curso de Direito da Fam�lia. 4.� Edi��o. Vol. Volume I. Coimbra: Coimbra Editora, 2008, p. 70-71.
[14] “Acordos Conjugais para Partilha dos Bens Comuns”, 1� Edi��o, 2009, Almedina, p. 77-78.
[15] Breves considera��es acerca do regime transit�rio aplic�vel �s rela��es patrimoniais dos ex-c�njuges entre a dissolu��o do casamento e a liquida��o do patrim�nio do casal, in RDIB, Ano 2 (2013), n� 13, 14813-14837, p. p. 14832, dispon�vel em http://repositorio.uportu.pt/jspui/bitstream/11328/665/1/Eva_Dias_Costa.1.pdf

Qual a finalidade do contrato de mandato o que o mandante transfere ao mandatário?

A procuração é o instrumento do mandato” (art. 653 do CC/02). No contrato de mandatomandante (quem transfere os poderes) e mandatário (quem recebe os poderes). O mandatário atuará visando satisfazer o interesse do mandante.

Quais são as obrigações do mandante?

675. O mandante é obrigado a satisfazer todas as obrigações contraídas pelo mandatário, na conformidade do mandato conferido, e adiantar a importância das despesas necessárias à execução dele, quando o mandatário lho pedir.

Qual a diferença entre mandante e mandatário?

Mandante é quem concede poderes a outrem para que este o represente e execute atos em seu nome, gerando para aquele, obrigações como se as tivesse assumido pessoalmente. Mandatário é quem recebe os poderes para representar outrem na prática de atos da vida civil ou de administração como se esse os tivesse praticando.

O que que significa mandatário?

Opera-se o mandato, quando alguém recebe de outrem poderes para, em seu nome, praticar atos ou administrar interesses. A pessoa que aceita os poderes diz-se mandatário e é representante daquela.