Como é elaborado o Plano Diretor

Não é tarefa fácil construir uma definição do que seja um plano diretor, uma vez que estes têm sido alvo de diversas definições e conceituações, e suas características têm variado de município para município. Percebendo isso, Villaça (1999) enfatiza a falta de uma conceituação amplamente aceita para o que seja plano diretor, argumentando que não existe um consenso entre os atores envolvidos na sua elaboração e utilização – engenheiros, urbanistas, empreendedores imobiliários, proprietários fundiários, etc. – quanto ao que seja exatamente esse instrumento.

Algumas tentativas de definição:

[Plano diretor é o] Instrumento básico de um processo de planejamento municipal para a implantação da política de desenvolvimento urbano, norteando a ação dos agentes públicos e privados. (ABNT, 1991)

Seria um plano que, a partir de um diagnóstico científico da realidade física, social, econômica, política e administrativa da cidade, do município e de sua região, apresentaria um conjunto de propostas para o futuro desenvolvimento socioeconômico e futura organização espacial dos usos do solo urbano, das redes de infra-estrutura e de elementos fundamentais da estrutura urbana, para a cidade e para o município, propostas estas definidas para curto, médio e longo prazos, e aprovadas por lei municipal. (VILLAÇA, 1999, p. 238)

É plano, porque estabelece os objetivos a serem atingidos, o prazo em que estes devem ser alcançados […], as atividades a serem executadas e quem deve executá-las. É diretor, porque fixa as diretrizes do desenvolvimento urbano do Município. (SILVA, 1995, p. 124 – grifos no original)

O Plano Diretor pode ser definido como um conjunto de princípios e regras orientadoras da ação dos agentes que constroem e utilizam o espaço urbano. (BRASIL, 2002, p. 40).

Pessoalmente, me agrada mais esta última definição, introduzida após a aprovação do Estatuto da Cidade e obedecendo aos seus princípios. Segundo a definição adotada, o plano diretor deve ser um instrumento que orienta todas as ações concretas de intervenção sobre o território, independentemente do fato dessas ações serem levadas a cabo pelos indivíduos, pelas empresas, pelo setor público ou por qualquer outro tipo de agente.

Portanto,

Plano diretor é um documento que sintetiza e torna explícitos os objetivos consensuados para o Município e estabelece princípios, diretrizes e normas a serem utilizadas como base para que as decisões dos atores envolvidos no processo de desenvolvimento urbano convirjam, tanto quanto possível, na direção desses objetivos. (SABOYA, 2007, p. 39)

Dizer que o plano é um documento significa que ele deve ser explicitado, ou seja, não pode ficar implícito. Ele precisa ser formalizado e, no caso do Brasil, essa formalização inclui a aprovação de uma lei do plano diretor na Câmara.

Em segundo lugar, o plano deve explicitar os objetivos para o desenvolvimento urbano do Município. Quando se deseja planejar algo, um elemento fundamental é poder responder à pergunta: “O que eu quero?” ou: “O que nós queremos?”. Esses objetivos não são “dados”, ou seja, não estão definidos a priori. Eles precisam ser discutidos democraticamente e consensuados de alguma maneira. A diversidade das cidades faz com que seja normal a existência de objetivos conflitantes e, por isso, discutir sobre os objetivos pode ajudar a encontrar soluções que contemplem mais de um ponto de vista.

Como é elaborado o Plano Diretor

Para poder planejar é preciso saber onde se quer ir. O plano diretor deverá definir o caminho a ser seguido.

Através do estabelecimento de princípios, diretrizes e normas, o plano deve fornecer orientações para as ações que, de alguma maneira, influenciam no desenvolvimento urbano. Essas ações podem ser desde a abertura de uma nova avenida, até a construção de uma nova residência, ou a implantação de uma estação de tratamento de esgoto, ou a reurbanização de uma favela. Essas ações, no seu conjunto, definem o desenvolvimento da cidade, portanto é necessário que elas sejam orientadas segundo uma estratégia mais ampla, para que todas possam trabalhar (na medida do possível) em conjunto na direção dos objetivos consensuados.

O zoneamento é um instrumento importante nesse sentido, já que impões limites às iniciativas privadas ou individuais, mas não deve ser o único. É importante também que estratégias de atuação sejam definidas para as ações do Poder Público, já que essas ações são fundamentais para qualquer cidade. A escolha do local de abertura de uma via, por exemplo, pode modificar toda a acessibilidade de uma área e, por consequência, seu valor imobiliário.

Outros exemplos de diretrizes podem ser vistos no artigo Planos diretores como instrumento de orientação das ações de desenvolvimento urbano. O importante é que o plano defina o caminho, que seja capaz de direcionar as iniciativas isoladas para que, no conjunto, o todo seja maior que a soma das partes.

Referências bibliográficas

ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NB 1350 – Normas para elaboração de plano diretor. Rio de Janeiro, 1991.

BRASIL. Estatuto da Cidade: guia para implementação pelos municípios e cidadãos. 2 ed. Brasília: Câmara dos Deputados, Coordenação de Publicações, 2002.

SABOYA, Renato. Concepção de um sistema de suporte à elaboração de planos diretores participativos. 2007. Tese de Doutorado apresentada ao Curso de Pós-Graduação em Engenharia Civil – Universidade Federal de Santa Catarina.

SILVA, José Afonso. Direito urbanístico brasileiro. São Paulo: Malheiros, 1995.

VILLAÇA, Flávio. Dilemas do Plano Diretor. In: CEPAM. O município no século XXI: cenários e perspectivas. São Paulo: Fundação Prefeito Faria Lima – Cepam, 1999. p. 237 – 247.

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De acordo com dados do IBGE, nos últimos 50 anos, a população brasileira vivendo em áreas urbanas passou de 45% para 84,4%. O crescimento acelerado tanto da população quanto da urbanização ocorreu sem investimentos proporcionais e os resultados são uma diversidade de problemas de infraestrutura, ambientais, saneamento, saúde, educação e grande desigualdade social.

Até os anos 70 as discussões sobre o planejamento urbano eram bem discretas. Nos anos 80, com a democratização do país e fortalecimento dos movimentos sociais, o assunto ganhou destaque e passou a ser visto como um processo político rodeado de diversos conflitos de interesses que necessitam serem mediados.

O Plano Diretor foi então instituído como instrumento básico do desenvolvimento e expansão urbana, partindo do princípio firmado na constituição de 88 da participação social como premissa para a elaboração da política pública. Foi estabelecido através da Lei 10.257/01, conhecida como Estatuto da Cidade, e todos os municípios com mais de 20 mil habitantes devem elaborar um Plano Diretor.

Para que se uma cidade cumpra seu papel social e ofereça melhorias na qualidade de vida da sociedade, o seu crescimento deve acontecer de modo equilibrado. Neste contexto, o objetivo do Plano Diretor é estabelecer diretrizes para que o poder público estabeleça a ordenação dos espaços públicos, garantindo condições de moradia, saneamento, trabalho, transporte e lazer; e também minimizar os impactos do desenvolvimento urbano no meio ambiente. Além disso, ao ser instituído na forma de lei, o Plano Diretor confere transparência para a gestão do planejamento urbano.

O Plano Diretor deve ser elaborado com a participação efetiva de todos os cidadão e geralmente é realizado da seguinte forma: planejamento e levantamento de informações, leituras técnicas e comunitárias, formulação de propostas e definição dos instrumentos

Planejamento e levantamento de informações

A Prefeitura estabelece uma equipe técnica formada por agentes da administração, e se for necessário contrata consultores para compor a equipe que se reunirá para estabelecer a metodologia de trabalho que será utilizada. Em seguida, realiza-se o levantamento de dados técnicos e informações do município com a finalidade de realizar um diagnóstico da situação do município, considerando aspectos físicos, econômicos, sociais e ambientais. 

Leituras técnicas e comunitárias

Deve-se realizar uma “leitura” da cidade, compreender seus problemas e suas potencialidades.  A equipe técnica realiza reuniões onde apresentarão à população as informações e interpretação dos dados. Essa parte do trabalho também poderá ser realizada em conjunto com Universidades ou Intuições de ensino e pesquisa. A população também será ouvida quanto a suas demandas, que serão inseridas em um relatório e posteriormente apresentado em audiências públicas que discutem o texto do Plano Diretor. 

Formulação de propostas

Estabelecem-se os aspectos prioritários da cidade para a reorganização territorial do município e também estratégias para atingir o que se almeja com o Plano Diretor.  Elabora-se o texto do Plano Diretor, conciliando as informações técnicas e as demandas da população, e que será discutido posteriormente através da realização de audiências públicas convocadas pela administração municipal.

Definição dos instrumentos 

Os instrumentos são ferramentas que viabilizam as propostas inseridas no Plano Diretor e possibilitam que o município tenha um maior controle sobre o seu território. Devem ser bem escolhidos para atingir os objetivos e obter sucesso nas estratégias definidas no Plano Diretor.  Se bem aplicados, os instrumentos podem controlar o uso do solo, influenciar o mercado de terras, arrecadar e redistribuir oportunidades e recursos.

A Prefeitura deve divulgar e facilitar o acesso aos documentos e informações produzidos durante todo o processo de elaboração do Plano Diretor. Essas ações são indispensáveis para que parcela significativa da população participe efetivamente, até a aprovação final do Plano Diretor, que será convertido em projeto de lei para que seja aprovada pela Câmara de Vereadores e em seguida sua implantação e gestão. 

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Texto: Layla Cristiane de Sousa Silva (graduanda em Engenharia Ambiental pela UNIFAL e estagiária do Instituto Fernando Bonillo de Pesquisa e Conservação Ambiental)

Revisão: Bianca Oliveira Costa (Bióloga e membro voluntário do Instituto Fernando Bonillo de Pesquisa e Conservação Ambiental).

 Referências Bibliográficas

IBGE, Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Disponível em: <https://censo2010.ibge.gov.br/sinopse/index.php?dados=8> Acesso em: 30 jul. 2021.

BLUME, B.A. O que é plano diretor? Politize!. Disponível em: <https://www.politize.com.br/plano-diretor-o-que-e/ >. Acesso em: 30 jul. 2021.

BRASIL. Lei nº 10.257, de 10 de julho de 2001, Estatuto da Cidade. Disponível em:< http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/leis_2001/l10257.htm >. Acesso em: 30 jul. 2021.

BRASIL, Ministério das Cidades. Plano diretor participativo: guia para a elaboração pelos municípios e cidadãos. 2ª ed. Brasília: Confea, 2005. Disponível em: <https://www.unochapeco.edu.br/arquitetura/downloads/plano-diretor-participativo-guia-para-a-elaboracao-pelos-municipios-e-cidadaos>. Acesso em: 30 jul. 2021.

IBGE, Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Disponível em: <https://censo2010.ibge.gov.br/sinopse/index.php?dados=8> Acesso em: 30 jul. 2021.

PRIETO, I., MENEZES, M., COLEGARI, D. Planejamento urbano no Brasil: um breve histórico. Politize!.  Disponível em: https://www.politize.com.br/planejamento-urbano-brasil/ .  Acesso em: 30 jul. 2021.