Soberania alimentar é “[…] o direito dos povos definirem suas próprias políticas e estratégias sustentáveis de produção, distribuição e consumo de alimentos que garantam o direito à alimentação para toda a população, com base na pequena e média produção, respeitando suas próprias culturas e a diversidade dos modos camponeses, pesqueiros e indígenas de produção agropecuária, de comercialização e gestão dos espaços rurais, nos quais a mulher desempenha um papel fundamental […]. A soberania alimentar é a via para se erradicar a fome e a desnutrição e garantir a segurança alimentar duradoura e sustentável para todos os povos.” (Fórum Mundial sobre Soberania Alimentar, Havana, 2001). Show
A segurança alimentar e nutricional consiste na realização do direito de todos ao acesso regular e permanente a alimentos de qualidade, em quantidade suficiente, sem comprometer o acesso a outras necessidades essenciais, tendo como base práticas alimentares promotoras de saúde, que respeitem a diversidade cultural e que sejam ambiental, cultural, econômica e socialmente sustentáveis. (II Conferência Nacional de SAN, 2004; LOSAN, 2006)
O artigo tem como objetivo refletir sobre a fome, em especial considerando a sua persistência enquanto fenômeno estrutural, procurando compreendê-lo à luz das dinâmicas do desenvolvimento desigual, num mundo muito desigual e com enormes assimetrias no bem-estar humano. Tal suscita uma questão à qual se procurará responder ao longo do artigo: qual o papel da soberania e da segurança alimentar na luta contra a fome no Brasil? Explorando os resultados já obtidos por uma investigação para doutoramento em curso no Nordeste brasileiro, o artigo começa pela análise do estado da fome no mundo, dando particular atenção ao Brasil. Em seguida discute os principais conceitos em torno da segurança e da soberania alimentar, buscando demostrar que um e outro são inseparáveis para melhorar a capacidade dos Estados no combate à fome. Por fim, o artigo focará a sua atenção no Brasil, escrutinando as causas da fome e as possibilidades de erradicação a médio prazo. 1. A fome como expressão de escolhas políticas e de desigualdades sociaisA fome é um problema antigo, e conhecido nos meios acadêmicos e políticos. Durante muito tempo foi considerada um tabu, revestida de um silêncio que a negava e a tornava “invisível” como questão social, porém aceita como um “produto da natureza”. Foi considerada um flagelo impossível de superar, igual à peste na Idade Média. O brasileiro Josué de Castro denunciou a fome como uma questão política e social, decorrente da ação humana, agregada à miséria e às desigualdades sociais, atingindo principalmente as pessoas mais vulneráveis. Pensamento contrário ao de Thomas Malthus, que justificou a necessidade da fome para limitar o número de pessoas no mundo, pois a superlotação poderia trazer graves consequências econômicas de abastecimento, sobretudo de alimentos (Ziegler, 2012; Freitas, 2003; Castro, 1966). A subalimentação, a má nutrição e a fome são resultantes de políticas vigentes, no entanto, possíveis de serem extintas, uma vez que refletem negativamente na sociedade, tanto para famintos como para saciados. Assim, para analisar a fome como uma questão social são imprescindíveis questionamentos sobre o modelo de desenvolvimento e seus efeitos para os países periféricos, dependentes, bem como sobre sua relação com a ampliação da pobreza no mundo. Mesmo após a independência do Brasil em 1822, o processo de colonização continuou, com a dependência política e econômica das grandes metrópoles europeias. No século XX esta dependência focou-se, sobretudo, no imperialismo americano. Colonialismo esse que favoreceu a concentração de propriedade fundiária, a expropriação de terras dos povos nativos, a destruição da cultura indígena, trazendo como resultado miséria, pobreza e fome no país (Castro, 1984). Vale a pena salientar que essas questões ainda estão presentes nos dias atuais, com uma estrutura econômica e social que favorece sua reprodução, principalmente nas regiões mais pobres, como é o caso do Nordeste brasileiro. Noutras palavras, processos que estão relacionados ao desenvolvimento capitalista, não são “produto do acaso, mas sim de dinâmicas políticas, econômicas e sociais com espessura histórica” (Ribeiro, 2017: 51). Tomando como referência Wallerstein, Fernando Bessa Ribeiro afirma que, a compreensão de suas múltiplas dimensões deve considerar o sistema mundial moderno e sua economia-mundo capitalista. ... quadro teórico de alcance global permite situar o desenvolvimento no contexto histórico em que nasceu e se expandiu, fornecendo explicações teóricas alternativas que rompem com as baseadas nas teorias da modernização (Wallerstein, 2000, apud Ribeiro, 2017: 51). Destarte, a fome é uma mazela, produto de relações sociais da exploração capitalista e de dominação econômica e política, de classe, gênero, racial/étnica, segundo os países, com fatores de diferenciação e hierarquização do poder geopolítico entre nações, mediante as relações de dominação internacionais de comércio, de intercâmbio e distribuição. De acordo com o relatório da Organização das Nações Unidas (ONU) (2019a), sobre o estado da segurança alimentar e da nutrição no mundo, houve uma alteração nos números sobre a fome. Até 2013 mostram uma queda, estabilidade até 2015, e crescimento sucessivo nos últimos anos. Em 2018 identificam-se 821 milhões de pessoas (1 em cada 9 pessoas) que sofreram privações de alimentos, sendo que 5 milhões residiam no Brasil. O relatório afirma que a situação econômica dos países bem como os conflitos armados e os fenômenos climáticos explicam esse fato. Destaca também que as mudanças no clima afetam as plantações, a produção de alimentos e a disponibilidade de água, o que reverbera nos sistemas alimentares, e consequentemente no acesso ao alimento. As condições ambientais desfavoráveis e do clima, com relação a plantação e produção, repercutem-se na vida rural, econômica-produtiva, social e familiar. É comum em regiões onde a chuva é escassa e a seca é persistente (realidade do semiárido do Nordeste do Brasil), ocorrer êxodo rural, o que diminui a presença de agricultores/as no campo. Só no início do século XX é que o flagelo da fome passou a ser considerado um problema mundial, principalmente após economias terem sido devastadas, especificamente no continente europeu. Assim, governantes de diferentes nações passaram a preocupar-se e enfrentar conjuntamente essa realidade, a fim de garantir a segurança alimentar dos seus povos (Castro, 2003). Para tal, foram firmados tratados internacionais no campo dos direitos humanos que reconhecem o direito da população de estar protegida da fome e de ter acesso a uma alimentação adequada (FAO, 2014). No entanto, o direito à alimentação é o mais violado em diversos lugares do mundo. Quase 1 bilhão de pessoas no mundo sofre de fome crônica. Dados da ONU (2019b) revelam que entre as principais causas da fome estão a pobreza, a falta de maiores investimentos na agricultura (infraestrutura, armazenamento, distribuição), as mudanças climáticas, desastres naturais, guerras, instabilidades no mercado, migrações e desperdícios de alimentos. Essas causas provocam distintas formas de fome, denominadas de fome estrutural e fome conjuntural, sendo a fome estrutural resultado das relações sociais de produção capitalista assentadas na propriedade privada dos meios de produção. Trata-se de relações estruturadoras da produção-consumo-distribuição-circulação ou troca, como explica Karl Marx (2011). A fome estrutural, sendo permanente, é pouco percebida e reproduzida de forma ideológica. Esse tipo de fome causa destruição psíquica e física, igualmente aniquila a dignidade humana. Já a fome conjuntural, fruto de catástrofes naturais (seca ou inundações) ou guerras é mais visível e espetacular, dificulta a produção de alimentos, arrasa a economia, desintegra a sociedade, além de fragilizar instituições (Ziegler, 2012). A expansão do capitalismo e seus processos de globalização, incide nos processos de crescimento econômico bem como nas crises dos países dependentes ou periféricos, sendo a fome uma de suas expressões. Assim, a segurança alimentar é entendida como alternativa no combate à fome. 2. Segurança alimentar: a construção do conceito1Duas grandes guerras levaram diferentes governos a procurar garantir que a população de seus países não passasse por privação de alimentos. Após a I Guerra Mundial (1914-1918), a Europa passa a usar a denominação segurança alimentar. A origem do conceito está relacionada com a segurança nacional e a autossuficiência alimentar do país, da nação. Isto é, autonomia e garantia de estratégias dos Estados em produzir sua alimentação, a fim de evitar a vulnerabilidade a interdições ou boicotes por questões militares e políticas (Silva, 2014; Leão, 2013; Marques, 2010). A partir da II Guerra Mundial (1939-1945), esse conceito começa a ganhar maior expressão na Europa em decorrência da incapacidade dos países em guerra produzirem seu próprio alimento, o que gerou fortes privações e mortes, resultante da fome e de suas consequências na saúde da população dos países em conflito bélico. O interesse era o enfrentamento dos problemas de abastecimento, em nível global, nos países em guerra (Ziegler, 2012; Maluf, 2007). 2O alimento e a garantia de sua disponibilidade e acesso tinham como cerne manter as estruturas de controle social e os interesses que o Estado representava. Nesse sentido, assegurar a oferta de alimentos exigia articulação de natureza produtivista, ou seja, prioritariamente produção para o mercado, bem como poder na condição de guerra e pós-guerra. O aumento da produção resolveria a escassez de alimentos, pois além de garantir disponibilidade para os países ricos, o excedente podia ser distribuído e comercializado com os países pobres (Silva, 2014; Gomes Júnior, 2015). Assim, cooperações internacionais foram estabelecidas para combater a fome e a pobreza no mundo. Entre as estratégias para viabilizar essa ação foram criadas várias organizações e firmados acordos internacionais, onde eram discutidos temas “como comércio internacional, desenvolvimento da agricultura, ajuda humanitária, entre outros” (Silva, 2014: 9). O debate sobre o problema da fome foi ampliado, complexificado e entendido como possuindo causas múltiplas. Em 1943, ocorreu nos Estados Unidos a Conferência das Nações Unidas sobre Alimentação e Agricultura, que resultou numa declaração que afirmava ser a pobreza a primeira causa da fome e da desnutrição, o que necessitava de uma política de desenvolvimento que proporcionasse à população poder de compra, a fim de atender às necessidades diárias de nutrientes. Com o escopo de estabelecer uma nova ordem econômica no mundo, em 1944 foi realizada a Conferência de Bretton Woods que deu origem ao Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Mundial. Esses dois organismos entendiam, diria que ainda entendem, que a garantia da segurança alimentar passa por mecanismos de mercado (Leão, 2013). 3O tema da segurança alimentar se solidifica em 1945, após a criação da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO), cuja prioridade é o combate à fome e à insegurança alimentar dos povos (Alem et. al, 2015). Porém, entre os organismos criados, a compreensão diferenciada do combate à fome resultou em tensões políticas devido a disputa de poder hegemônico entre os países mais ricos, com interesse em manter e impor a superioridade frente aos outros países. A fim de aumentar a produção de alimentos, investimentos de capital financeiro, maquinário e tecnologias foram realizados com a chamada Revolução Verde, que se impôs mundialmente com novas práticas produtivas no campo, com uso de fertilizantes sintéticos, uso intensivo de agrotóxicos, irrigação, mecanização e ampliação da fronteira agrícola, monocultura para exportar, bem como a invenção e produção de novas sementes (híbridas), com novas variedades genéticas e dependentes de insumos químicos de alto rendimento, entre outros. Essa forma de produção trouxe como consequência, danos ambientais, econômicos e sociais, além da desvalorização das culturas dos/as agricultores/as tradicionais (Leão, 2013; Maluf e Menezes, 2000; Alem et. al, 2015). 4Na Conferência Mundial de Alimentação organizada pela FAO em 1974, foi estabelecido que a segurança alimentar só seria alcançada com a garantia de suprimento alimentar adequado em nível mundial. Era necessário então, aumentar a produção e definir uma política de armazenamento e oferta de alimentos. O produto ainda era a abordagem central no conceito. Com o investimento na produção em larga escala, os estoques também tiveram aumento, o que diminuiu os preços dos alimentos, e o excedente foi industrializado antes de ir para o mercado. No entanto, a população não tinha meios de adquirir os produtos, pois a pobreza ainda persistia. Entre os motivos estavam: conflitos internos, a falta de terra para trabalhar e colher, não ter recursos financeiros, e/ou a renda ser insuficiente para permitir o acesso aos alimentos que atendesse às necessidades mínimas. Na década de 1980 foi incorporado ao conceito “necessidade de garantir” o acesso físico e econômico a todas as pessoas, com quantidade suficiente de alimentos e de forma permanente (Maluf, 2007; Leão, 2013; Alem et. al, 2015). Apesar dos vários avanços, a construção do conceito de segurança alimentar recai no entendimento da garantia da produtividade e disponibilidade, em atendimento aos interesses do mercado global e do capital industrial e agropecuário. Por ser um conceito complexo, que abarca diferentes interesses em conflitos, vive em permanente disputa, o que exige mudanças constantes para acompanhar os avanços que o tema exige. O mesmo é controverso e questionável nos meios acadêmicos, no campo político, no mundo dos negócios, assim como nos movimentos sociais (Alem et. al, 2015). Deste modo, os movimentos sociais do campo propuseram a concretização da soberania alimentar de todos os povos, como forma de garantir a produção e o acesso a alimentos em todas as nações. 3. Soberania alimentar: imprescindível à segurança alimentar
Os camponeses/as e seus movimentos sociais reagiram ao conceito de segurança alimentar definido pela FAO, bem como as ações/políticas realizadas pelo referido órgão, rebatendo e sugerindo outro conceito que proporcionasse formas de combater a fome e atendesse aos interesses dos povos. Assim, durante a realização da Cúpula Mundial da Alimentação, em 1996, na cidade de Roma, através da Via Campesina1, camponeses/as inseriram no debate o conceito de soberania alimentar, por compreender que cada povo deve ser livre e soberano. A soberania é concretizada quando os povos têm a liberdade de definir o que, como e para quem produzir, uma vez que a soberania passa, essencialmente, pela capacidade de cada nação de produzir seu alimento (McMichael, 2016; Coca, 2016; Gomes Júnior e Aly Junior, 2015; Marques, 2010; Bello, 2010). Atualmente esse debate é defendido tanto pelos povos do campo como das cidades, em diferentes países, denominados ricos ou pobres. No conceito de soberania alimentar apontado pela Via Campesina, são demarcadas as necessidades de autonomia, de melhores condições de vida e de trabalhos para os/as camponeses/as, além de inserir um conteúdo político, ecológico e cultural (McMichael, 2016; Bello, 2010; Bravo, 2007). Posicionamento contrário ao conceito de segurança alimentar proposto pela FAO. Portanto, a soberania alimentar é entendida como, o direito dos povos definirem suas próprias políticas e estratégias sustentáveis de produção, distribuição e consumo de alimentos que garantam o direito à alimentação para toda a população, com base na pequena e média produção, respeitando suas próprias culturas e a diversidade dos modos camponeses, pesqueiros e indígenas de produção agropecuária, de comercialização e gestão dos espaços rurais, nos quais a mulher desempenha um papel fundamental [...]. A soberania alimentar é a via para erradicar a fome e a desnutrição e garantir a segurança alimentar duradoura e sustentável para todos os povos (Fórum Mundial sobre Soberania Alimentar, 2001). Para a Via Campesina, a soberania alimentar é a alternativa viável para acabar com a fome e a insegurança alimentar no mundo, com a valorização da agricultura familiar e camponesa, guiada pelo princípio de produção de base agroecológica, agroflorestal ou de técnicas preservacionistas e comercialização local (prioriza a relação produtor/a e consumidor/a). Além de oferecer alimentos saudáveis e seguros (livre de venenos e transgênicos), a produção de base agroecológica proporciona manejos e práticas que não violam o direito das futuras gerações a um mundo benéfico. Adicionalmente, defendem o respeito à cultura e o modo de vida de cada povo. A soberania alimentar passa pelo desmonte do latifúndio, com suas práticas de monoculturas, especialmente de milho, soja, trigo e arroz (atual base da nossa alimentação), ampliando e fortalecendo o agronegócio e a agroindústria de transformação alimentar. Para reverter esse quadro são necessárias ações que possibilitem o acesso fundiário para os/as agricultores/as (que não têm terra ou têm pouca terra), medidas que garantam água (protegida como bem público, e que deve ser compartilhada de forma sustentável), livre acesso às sementes (sem transgenia), e ao crédito. Outras medidas importantes para garantir a soberania dizem respeito ao Estado apoiar a agricultura camponesa sustentável, e proteger sua produção agrícola, a fim de evitar a entrada de produtos estrangeiros com preço abaixo do produto nacional. Tudo isso pode contribuir para que a nação se torne independente da produção internacional, livre dos grandes mercados (Conti, Bazotti e Finokie, 2015; Conti, 2009; Marques, 2010). Como já mencionado, o Brasil ampliou o conceito de segurança alimentar, incorporando o direito humano à alimentação e à soberania alimentar. O que o torna desafiante, ao ter que dar conta das diferentes dimensões que o tema requer. 4. Segurança alimentar e nutricional: concepções, ampliação do conceito e trajetória legal no BrasilDa invisibilidade, por ser considerado um tema perigoso, ao reconhecimento da fome como um problema de ordem política e social (Castro, 2003), várias ações foram estabelecidas com o objetivo de suplantar esse flagelo mundial, tanto em nível internacional como nos territórios nacionais. Documentos e compromissos firmados entre diferentes nações do mundo contribuíram para a construção do marco legal no Brasil. A partir da década de 1980, com a redemocratização, a Constituição de 1988, e a descentralização no Brasil, a segurança alimentar ganhou maior relevância (Maluf, 2007). No conceito de segurança alimentar proposto durante a 1ª Conferência Nacional de Alimentação e Nutrição em 1986 são consideradas as dimensões alimentar e nutricional. A dimensão alimentar trata das questões relacionadas com a disponibilidade, isto é, a produção, comercialização e o acesso ao alimento. Já a dimensão nutricional, aborda os aspectos alusivos à escolha, preparo, consumo e sua relação com a saúde, bem como a utilização biológica do alimento. Portanto, a Segurança Alimentar e Nutricional (SAN) só poderá ser concretizada com a garantia dessas duas dimensões (Leão, 2013; Maluf e Menezes, 2000; Brasil, 1986).
Na década de noventa, a mobilização da sociedade e a adesão do governo propiciou iniciativas de combate à fome no âmbito federal. Em 1993, foi instituído o Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (CONSEA)2, que junto com o movimento da Ação da Cidadania Contra a Fome, a Miséria e Pela Vida, organizou em 1994 a 1ª Conferência Nacional de Segurança Alimentar, que consolidou o conceito e conferiu a SAN como um projeto integrador das ações setoriais capaz de instituir-se como eixo estratégico de um novo modelo de desenvolvimento. Tendo em vista que a concentração de renda e de terra é fator determinante para a insegurança alimentar, essa situação foi uma das grandes preocupações registrada no relatório final da conferência. No ano de 1995, o presidente da República Fernando Henrique Cardoso, extinguiu o CONSEA3, o mesmo foi recomposto em 2003, no governo de Luís Inácio Lula da Silva (Burlandy, 2009). O novo CONSEA4 foi responsável pela realização da 2ª Conferência Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (CNSAN), ocorrida em 2004, onde o conceito de SAN passa por reformulação, configurando-se como marco na compreensão ampla do conceito. Os debates e propostas resultantes da conferência, serviram de base para elaboração da Política Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (PNSAN) (Leão, 2013). Assim, na 2ª CNSAN foi definida a necessidade da criação do Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (SISAN), com políticas públicas na área, legislação específica e orçamento próprio. Destarte, em 2006, o SISAN foi instituído através da Lei 11.346/2006, que trata da Lei Orgânica de Segurança Alimentar e Nutricional (LOSAN), onde define a SAN como: A realização do direito de todos ao acesso regular e permanente a alimentos de qualidade em quantidade suficiente, sem comprometer o acesso a outras necessidades essenciais, tendo como base práticas alimentares promotoras da saúde que respeitem a diversidade cultural e que sejam ambiental, cultural, econômica e socialmente sustentáveis (Brasil, 2006: 4). A LOSAN institui definições, princípios, diretrizes, objetivos e a composição do SISAN, com escopo de assegurar o direito humano à alimentação adequada. A inserção da alimentação no artigo 6º da Constituição Federal em 2010, torna-a, juntamente com a soberania alimentar, princípio para as políticas públicas de SAN (Brasil, 2006, 2010). Conforme o Art. 5º da LOSAN, A consecução do direito humano à alimentação adequada e da segurança alimentar e nacional requer o respeito à soberania, que confere aos países a primazia de suas decisões sobre a produção e o consumo de alimentos (Brasil, 2006: 5). A autonomia alimentar é considerada essencial para a soberania de um povo, o que evita a dependência de importações e flutuações de preços sujeitos ao mercado internacional, quer dizer, a soberania alimentar vai além do abastecimento, sendo preciso que as pessoas que produzem alimentos tenham o direito de acesso aos mercados. O conceito de SAN no Brasil, fruto de discussões com a academia, movimentos sociais e governos, confere ao mesmo a necessidade do diálogo constante com os conceitos de Direito Humano à Alimentação Adequada (DHAA) e à Soberania Alimentar a fim de concretizar a intersetorialidade das políticas, programas e ações governamentais e/ou não governamentais (Nascimento e Andrade, 2010; Conti et. al, 2015). A evolução do conceito no país exprime uma complexidade nos seus vários conteúdos, bem como na sua natureza intersetorial. O conceito preconizado e utilizado na LOSAN (Brasil, 2006), amplia o mesmo para além da produtividade, disponibilidade e acesso ao alimento e passa pela garantia dos direitos sociais, econômicos e culturais, o que, além de abranger questões de qualidade e quantidade, assegura a continuidade de condições para que a humanidade e os recursos naturais não desapareçam. Logo, é importante levar em consideração quatro conteúdos inseridos no conceito SAN no Brasil: “oferta e produção de alimentos regulares e suficientes; acesso permanente à alimentação; alimentos seguros e domínio sobre a real base genética do sistema agroalimentar no país” (Gomes Júnior, 2015: 117).
Os princípios da intersetorialidade, do DHAA e da soberania alimentar, vinculados ao conceito de SAN, diferem do entendimento e uso frequente do termo segurança alimentar, tanto por organismos internacionais, como por governos e grandes corporações ligadas ao agronegócio (Maluf, 2007). Tomando como referência os avanços no conceito e o entendimento da necessidade de regular ações que favorecessem a produção, a comercialização, o abastecimento e o consumo de alimentos saudáveis no território brasileiro, vários debates, propostas e ações foram desenvolvidas nas plenárias do CONSEA Nacional, pautados, principalmente pelos movimentos e representações da sociedade civil5. As reflexões e debates contribuíram na formulação de políticas públicas, a exemplo do Programa Nacional de Fortalecimento de Agricultura Familiar (PROANF)6, o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA)7 e o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE)8. Esses programas têm como objetivo incentivar a produção proveniente da agricultura familiar e camponesa para abastecer o comércio local, instituições de ensino público e órgãos governamentais.
5Necessário destacar a importância da participação da sociedade civil organizada, de diferentes movimentos sociais na construção dessas políticas, principalmente do Fórum Brasileiro de Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (FBSSAN)9, que desde a sua criação tem possibilitado encontros e seminários temáticos acerca da soberania alimentar e da SAN, alimentando os debates e reflexões no CONSEA Nacional, bem como com representações internacionais, especialmente de países da língua portuguesa. Outro aspecto importante nessa concertação para construção de políticas públicas, é a criação da Câmara Intersetorial de SAN (CAISAN), composta por representantes do governo dos ministérios afeitos ao tema da soberania e SAN (CONSEA, 2017). Essa participação foi fundamental para que o Brasil avançasse nas políticas concretas de enfrentamento da fome, o que contribuiu decididamente para sair do Mapa da Fome (FAO, 2014)10. Em 2015, foi realizada a 5ª CNSAN, com o lema “Comida de verdade no campo e na cidade: por direitos e soberania alimentar”. O conceito de comida de verdade foi construído coletivamente nas plenárias do CONSEA Nacional e após ser discutido amplamente na 5ª CNSAN, culminou com uma extensa definição. Assim, em defesa da soberania alimentar e da necessidade de efetivar o direito humano à alimentação adequada e saudável para todos os povos do mundo, foi estipulado que: Comida de verdade é a salvaguarda da vida. É saudável tanto para o ser humano quanto para o planeta, contribuindo para a redução dos efeitos das mudanças climáticas. Garante os direitos humanos, o direito à terra e ao território, a alimentação de qualidade e em quantidade adequada em todo curso da vida. Respeita o direito das mulheres, a diversidade dos povos indígenas, comunidades quilombolas, povos tradicionais de matriz africana/povos de terreiro, povos ciganos, povos das florestas e das águas, demais povos e comunidades tradicionais e camponeses/as, desde a produção ao consumo... É produzida pela agricultura familiar, com base agroecológica e com o uso de sementes crioulas e nativas... É livre de agrotóxicos, de transgênicos, de fertilizantes e de todos os tipos de contaminantes... garante a soberania alimentar; protege o patrimônio cultural e genético... É aquela que considera a água alimento. É produzida em condições dignas de trabalho. É socialmente justa. Comida de verdade não está sujeita aos interesses do mercado... (CONSEA, 2015: 28). 6Se nos conceitos de SAN e soberania alimentar, encontram-se vários desafios, o da comida de verdade não fica atrás. É mais um conceito complexo e desafiante, traz na sua essência a necessidade de observar as várias dimensões da comida, em seus diferentes aspectos. O conceito afirma que a comida de verdade é socialmente justa e não está subordinada aos interesses do mercado. No entanto, no cenário atual, o alimento é considerado cada vez mais uma mercadoria, um produto, fruto da intensificação do trabalho produtivo, industrialização e globalização do sistema agroalimentar, que causa distanciamento e desconhecimento de como o alimento é produzido, além de interferir nos modos de viver, na cultura alimentar, no cozinhar e comer da população. Conhecer o conceito de comida de verdade é fundamental para o exercício do controle social das políticas públicas de SAN, sob a luz da ética alimentar, do valor da diversidade alimentar e cultural do país. A partir de janeiro de 2019, no Brasil, essa necessidade foi intensificada, tendo em vista que uma das primeiras medidas do atual governo federal foi extinguir o CONSEA Nacional. Considerações finaisA fome e a insegurança alimentar são expressões da lógica capitalista, produto de suas desigualdades sociais, onde a concentração dos meios de produção restringe a disponibilidade de alimentos e o acesso das pessoas a eles. Assim, reduzir a segurança alimentar ao aumento da produção de alimentos, centrada principalmente no agronegócio e nas grandes corporações como forma de garantir sua disponibilidade à população é um grande equívoco. A prioridade pela produção em larga escala, onde o alimento é visto como mercadoria, geradora de lucro, em detrimento à agricultura camponesa é um entrave na resolução do problema da fome. Efetivamente, além da disponibilidade é preciso garantir o acesso aos alimentos de forma permanente, o que requer renda que assegure a realização do direito à alimentação, enquanto comida de verdade, sem comprometer outros direitos, a exemplo da moradia. Para o enfrentamento da fome e da insegurança alimentar faz-se necessário que as ações de segurança alimentar sejam orientadas pelos princípios da soberania alimentar e do direito humano a alimentação e nutrição adequadas, inseridos nos conceitos de SAN, no Brasil. Portanto, uma das estratégias para acabar com a fome é o investimento em ações que favoreçam a ampliação da produção de alimentos saudáveis, livres de agrotóxicos e transgênicos. Para isso, é mister valorizar os interesses dos/as camponeses/as, com investimentos na produção local, com prioridade na produção de base agroecológica (agricultura que respeita a natureza e as pessoas), e a diminuição da distância entre quem produz e quem consome. Isto é, garantir a soberania alimentar de cada povo. Não existe soberania alimentar sem soberania política, que possibilite à nação condições de efetivar políticas que propiciem independência na produção, transformação, distribuição e consumo de alimentos. O que requer o direito dos povos contribuírem nas decisões políticas do país, a fim de historicamente estabelecer seu modo de vida, com respeito pelas tradições, saberes e práticas alimentares, consideradas um dos patrimônios culturais de reconhecimento de cada povo, num determinado espaço social (Conti, Bazotti e Finokie, 2015, Gomes Júnior e Aly Júnior, 2015). Embora esteja longe de atingir a soberania alimentar e política, e ainda persistirem desigualdades socioeconômicas no país, o Brasil registrou alguns avanços no combate à fome, principalmente a partir de 2003, quando foi garantida pelo governo federal a participação da sociedade nos conselhos e nas conferências de segurança alimentar e nutricional. A partir daí, os princípios do direito humano à alimentação e da soberania alimentar serviram de referências na elaboração de políticas públicas inseridas no Plano Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (PLANASAN) e no Plano Nacional de Agroecologia, com o intuito de garantir comida de verdade para a população brasileira, tanto do campo como da cidade. Entretanto, desde de 2016, e mais fortemente nos dias atuais, as políticas públicas voltadas para o combate a fome no Brasil encontram-se ameaçadas, pois, apesar de toda a trajetória de avanço no conceito e no marco legal da SAN no Brasil, bem como o êxito na execução de iniciativas para abolir a fome, com amplo reconhecimento internacional, isso não garantiu, em nível do Estado, a continuidade, nem impediu o desmonte das políticas sociais, com a redução e/ou extinção de programas. Este quadro acentua a fome, especialmente no Nordeste brasileiro, uma das regiões mais pobres do país. A superação da fome e da insegurança alimentar exigem desenvolvimento de políticas públicas de enfrentamento à pobreza e à miséria. Em outras palavras, requerem prioridade por parte dos/as governantes, com compromisso político e social em diferentes níveis, especialmente em nível nacional. Igualmente, demandam permanente mobilização e participação da sociedade com o propósito de garantir o respeito e a efetivação dos direitos alcançados, bem como a conquista de novos direitos, ou seja, fazem desta uma luta contínua. Referências bibliográficas7ALEM, Daniel; Oliveira, Gilca G. de; Oliveira, Jaqueline; Imbirussú, Érica (2015), “Segurança alimentar e soberania alimentar: construção e desenvolvimento de atributos”, XX Encontro Nacional de Economia Política, Foz do Iguaçu. 8BELLO, Walden F (2010), A guerra pelos alimentos, São Paulo, Leopardo Editora, 184p. 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