Por que as pessoas sao preconceituosas

A visão de uma cientista jurídica sobre seleção natural, como ela se aplica à sociedade e o que uma barata tem a ver com isso?

Por que as pessoas sao preconceituosas
“blue and black insect” porrawpixel no Unsplash

O ser humano é preconceituoso por uma gama de motivos x, y e z.

Esses motivos podem ser sociais, psicológicos, biológicos… mas quase todos os casos são acompanhados de uma parcela de ignorância ou falta de empatia.

Um dos motivos de haver preconceito contra LGBTs e contra outras minorias pode ser instintivo, e a falta de racionalidade ou empatia faz com que alguns seres humanos sejam egoístas a ponto de não serem capazes de se livrar de um instinto básico animal.

Para explorar melhor a ideia, deve-se retornar ao período pré-histórico:

Vamos supor que lá na pré-história, antes sequer do ser-humano existir, havia duas espécies de coelhos: o “coelhinho bonitinho” e o “coelhinho fofinho”.

Os coelhinhos “bonitinho” e “fofinho” andavam juntos, se alimentavam juntos e dormiam juntos. Entretanto, esses grupos se separavam quando algo fora do comum acontecia. Se o grupo escutasse um barulho fora do comum ou se vissem uma folhagem se mexer, ele se desbandava, pois os coelhinhos “bonitinhos” fugiam correndo, já os coelhinhos “fofinhos” não, eles nem ligavam.

É claro que por causa dessa característica, os coelhinhos “bonitinhos” corriam à toa muitas vezes, e às vezes perdiam bons locais cheios de alimento por bobeira, mas em compensação, a cada dez vezes que os coelhinhos “bonitinhos” corriam, uma era com motivo, e nessa uma, os coelhinhos “fofinhos” viravam janta de um animal maior.

Depois de anos, os coelhinhos “fofinhos” pararam de existir; foram extintos, e só os coelhinhos “bonitinhos” passaram seus genes pra frente.

Esse fenômeno, chamado “seleção natural”, aconteceu com todas as espécies, e as espécies que existem hoje em dia são apenas aquelas que nasceram com as melhores características. A característica que fez com que os coelhinhos “bonitinhos” sobrevivessem, também existe nos seres-humanos e na grande maioria dos mamíferos: o medo do desconhecido.

E como saber com qual força esse instinto natural existe no ser-humano consciente, racional e cheio de tecnologia e avanços que existe hoje em dia? É só observar o fenômeno social da barata.

A barata é um inseto com seis patas, logo, sua movimentação não é algo que o ser-humano consegue entender completamente. A barata não tem olhos observáveis (ela tem, mas não conseguimos observar onde ficam). A barata tem asas mas nem sempre voa. A barata morde? Ela tem dentes? Por onde esse bicho andou?A barata é um inseto que fica um tempão parado no mesmo lugar e de repente sai correndo muito rápido até outro ponto e depois para de novo. E esse ponto pode ser a perna do ser-humano que a observa.

A barata, por ser um animal tão dotado de desconhecido; por ter um comportamento tão pouco famíliar ao ser-humano, acabou se tornando um dos grandes medos da sociedade humana (um medo muito maior do que a ameaça que realmente carrega).

Por que as pessoas sao preconceituosas
“cockroaches on rock” por Jesper Aggergaard no Unsplash

Visto tudo isso, dá pra pensar sempre no homem como um animal que tem medo do desconhecido.

Os membros da comunidade LGBT podem ser considerados o “desconhecido” pra muitas pessoas preconceituosas, e analisando por esse ponto, as palavras homofobia e transfobia fazem muito sentido. A maioria das pessoas preconceituosas passou a infância inteira sem ter nenhuma interação com uma pessoa LGBT, talvez nunca tenha visto nenhuma na vida inteira, ou ainda, talvez tenha sempre aprendido que LGBT é errado. Sem doses de empatia e reflexão, é difícil a pessoa se livrar do instinto biológico do medo do desconhecido.

Basta olhar para a Tailándia; país com a maior taxa de pessoas transgênero no mundo. Lá, ser trans é local comum, e, consequentemente, as pessoas não têm preconceito contra essa população.

Resta aos LGBTs entender todos os motivos que fazem com que o preconceito exista, e o combater de forma consciente e melhor possível. Resta aos LGBTs se tornarem algo comum; algo (bem) visto na sociedade. A partir do momento em que for cada vez mais comum se ver por aí atores e atrizes trans, advogados e juizes trans, esportistas, médicos, veterinários, jornalistas, caixas, garçons, desenvolvedores, cozinheiros trans, ou simplesmentes a partir do momento em que as pessoas trans passarem a existir em todos os locais: padaria, mercado, faculdade, shopping, etc., essa população vai se tornar algo comum, e o ser-humano médio vai se sentir mais e mais confortável até o momento em que vai deixar seu medo para trás.

Por que as pessoas sao preconceituosas
“selective focus photography of brown rabbit” por Gary Bendig no Unsplash

Para compreender o que é o preconceito, convém entender primeiro o conceito de atitude baseado nos estudos da Psicologia Social. ATITUDE é um sistema relativamente estável de organização de experiências e comportamentos relacionados com um objeto ou evento particular. Para cada atitude há um conceito racional e cognitivo – crenças e ideias, valores afetivos associados de sentimentos e emoções que, por sua vez, levam a uma série de tendências comportamentais: predisposições.

Portanto, toda atitude é composta por três componentes: um cognitivo, um afetivo e um comportamental:

a cognição – o termo atitude é sempre empregado com referência à um objeto. Toma-se uma atitude em relação a que? Este objeto pode ser uma abstração, uma pessoa, um grupo ou uma instituição social.


o afeto – é um valor que pode gerar sentimentos positivos, que, por sua vez, gera uma atitude positiva; ou gerar sentimentos negativos que pode gerar atitudes negativas.
o comportamento – a predisposição : sentimentos positivos levam à aproximação; e negativos, ao esquivamento ou escape. Dessa forma, entende-se o PRECONCEITO como uma atitude negativa que um indivíduo está predisposto a sentir, pensar, e conduzir-se em relação a determinado grupo de uma forma negativa previsível.

CARACTERÍSTICAS DO PRECONCEITO:

É um fenômeno histórico e difuso; A sua intensidade leva a uma justificativa e legitimização de seus atos; Há grande sentimento de impotência ao se tentar mudar alguém com forte preconceito. Vemos nos outros e raramente em nós mesmos. EU SOU EXCÊNTRICO, VOCÊ É LOUCO! Eu sou brilhante; você é tagarela; ele é bêbado. Eu sou bonito; você tem boas feições; ela não tem boa aparência. Eu sou exigente; você é nervoso; ele é uma velha. Eu reconsiderei; você mudou de opinião; ele voltou atrás na palavra dada.

Eu tenho em volta de mim algo de sutil, misterioso, de fragrância do oriente; você exagerou no perfume e ele cheira mal.

CAUSAS DO PRECONCEITO: Assim como as atitudes em geral, o preconceito tem três componentes: crenças; sentimentos e tendências comportamentais. Crenças preconceituosas são sempre estereótipos negativos. Segundo Allport (1954) o preconceito é o resultado das frustrações das pessoas, que, em determinadas circunstâncias, podem se transformar em raiva e hostilidade. As pessoas que se sentem exploradas e oprimidas freqentemente não podem manifestar sua raiva contra um alvo identificável ou adequado; assim, deslocam sua hostilidade para aqueles que estão ainda mais “baixo”na escala social. O resultado é o preconceito e a discriminação. Já para Adorno (1950), a fonte do preconceito é uma personalidade autoritária ou intolerante. Pessoas autoritárias tendem a ser rigidamente convencionais. Partidárias do seguimento às normas e do respeito à tradição, elas são hostis com aqueles que desafiam as regras sociais. Respeitam a autoridade e submetem-se a ela, bem como se preocupam com o poder da resistência. Ao olhar para o mundo através de uma lente de categorias rígidas, elas não acreditam na natureza humana, temendo e rejeitando todos os grupos sociais aos quais não pertencem, assim, como suspeitam deles. O preconceito é uma manifestação de sua desconfiança e suspeita. Há também fontes cognitivas de preconceito. Os seres humanos são “avarentos cognitivos” que tentam simplificar e organizar seu pensamento social o máximo possível. A simplificação exagerada leva a pensamentos equivocados, estereotipados, preconceito e discriminação. Além disso, o preconceito e a discriminação podem ter suas origens nas tentativas que as pessoas fazem para se conformar(conformidade social). Se nos relacionamos com pessoas que expressam preconceitos, é mais provável que as aceitemos do que resistamos a elas. As pressões para a conformidade social ajudam a explicar porque as crianças absorvem de maneira rápida os preconceitos e seus pais e colegas muito antes de formar suas próprias crenças e opiniões com base na experiência. A pressão dos colegas muitas vezes torna “legal” ou aceitável a expressão de determinadas visões tendenciosas – em vez de mostrar tolerância aos membros de outros grupos sociais.

REDUÇÃO DO PRECONCEITO:

A convivência, através de uma atitude comunitária é, talvez, a forma mais adequada de se reduzir o preconceito.

COMO FUNCIONA O ESTEREÓTIPO:

É um conjunto de características presumidamente partilhadas por todos os membros de uma categoria social. É um esquema simplista mas mantido de maneira muito intensa e que não se baseia necessariamente em muita experiência direta. Pode envolver praticamente qualquer aspecto distintivo de uma pessoa – idade, raça, sexo, profissão, local de residência ou grupo ao qual é associada. Quando nossa primeira impressão sobre uma pessoa é orientada por um estereótipo, tendemos a deduzir coisas sobre a pessoa de maneira seletiva ou imprecisa, perpetuando, assim, nosso estereótipo inicial.

RACISMO:

É a crença na inferioridade nata dos membros de determinados grupos étnicos e raciais. Os racistas acreditam que a inteligência, a engenhosidade, a moralidade e outros traços valorizados são determinados biologicamente e, portanto, não podem ser mudados. O racismo leva ao pensamento ou/ou:ou você é um de nós ou é um deles.

Por Regina Célia de Souza
 

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA: McDavid, John e Harari, Herbert. Psicologia e comportamento social. Ed. Interciência. RJ. 1974. Morris, Charles G. e Maisto, Albert A. . Introdução à Psicologia. Ed. Pearson e Prentice Hall. SP. 2004.

ATENÇÃO: LEIA AS REPORTAGENS A SEGUIR E FAÇA UMA REFLEXÃO CONSIDERANDO OS CONCEITOS DE ESTEREÓTIPO E PRECONCEITO.